O GENOCÍDIO ECONÔMICO
Giovani Clark é Doutor em Direito/UFMG, Professor da PUC/MG, Diretor–Presidente da Fundação Brasileira de Direito Econômico e Autor do Livro “Questões Polêmica de Direito Econômico”, Ltr, 2008.
A história relata os genocídios cometidos nas guerras pelos povos, como as dos europeus contra os latino-americanos, quando da invasão daqueles às nossas terras, chamada de “descoberta”. Milhares de vidas foram ceifadas pelas armas de fogo no solo abaixo da linha dos trópicos em nome da “civilização”. Também sobre o mesmo manto, os africanos foram abatidos como animais ferozes por resistirem ao exílio e à escravidão na exótica colônia portuguesa.
Em pleno século XXI, tempos pós-modernos, os genocídios não foram extirpados entre os homens. São executados por intermédio das armas de guerra ou via políticas econômicas que eliminam a crédito ou à vista milhões de pessoas.
O genocídio econômico é executado com uma eficácia espantosa, via políticas econômicas públicas e privadas, no Terceiro Mundo, as eternas colônias, pelos senhores dos lucros. Evidentemente, em nome da glória do capital nos reservaram as trevas do inferno, logicamente sem a aquiescência dos deuses.
As radicais políticas econômicas transferem ganhos dos pobres para os ricos, sejam eles Nações ou indivíduos, via políticas de juros ou salarial, executando uma pilhagem “quase invisível”, através de uma guerra econômica, onde o resultado é a fome, o desemprego e a morte fatal dos vencidos.
A globalização ou a renovação do pacto colonial em bases pós-modernas somente impulsiona as asas do pássaro universal da miséria. Os números explicam o caos global, ou seja, apenas 20% da população planetária controla 80% da riqueza produzida. Não é obra da natureza as 800 milhões de bocas famintas pelo mundo, mesmo a Terra produzindo para 11 bilhões de habitantes, enquanto possui 6 bilhões de ocupantes em 2001.
No Brasil, a 5º população mundial, o genocídio é também implantado através das ditas políticas econômicas, norteadas pelos interesses das elites econômicas. Como nos idos do Brasil colônia, temos um modelo exportador atrelado às economias centrais e ao capital transnacional. As políticas exterminadoras ignoraram as necessidades nacionais e a massa de excluídos.
Os resultados das políticas genocídios são alarmantes na Nação do verde e amarelo. Segundo a UNESCO, o Brasil está em 3º lugar entre 60 países pesquisados onde os jovens mais morrem por violência. Acalentamos, ainda, uma “pedagogia escolar da morte”, quando ostentamos o 7º lugar em analfabetismo no mundo e o 69º lugar em qualidade de ensino entre 192 Estados.
A concentração de renda no Brasil é estarrecedora. Os 20% dos mais ricos têm uma renda 24 vezes maior do que os 20% mais pobres. Estamos em penúltimo lugar no ranking de distribuição de renda. O salário mínimo nacional é o 3º pior do mundo, na frente somente de Serra Leoa e Haiti, e 2/3 dos brasileiros vivem com uma renda per capita inferior a dois salários mínimos e meio. Pelo IDH de 2002, divulgado pela ONU, estamos no incômodo 73º lugar em 173 países.
Estamos entre os três países terrestres que mais produzem desempregados, “seres descartáveis”, juntamente com a Rússia e a Índia, apesar de estarmos entre as 12 maiores economias planetárias. E mais de 50 milhões de indivíduos vivem abaixo da linha da pobreza, ou seja, quase 1/3 da população.
Inexplicavelmente, parece que quando Deus concebeu as férteis terras brasileiras criou, concomitantemente, os cartórios de registros de imóveis, reservando a poucos afortunados quase todas as propriedades rurais. Somos vice-campeões mundiais na concentração de propriedades fundiárias. Temos a maior dívida externa da Terra, graças à Ditadura Pós-moderna entre 1994 e 2002.
As políticas econômicas devem ser executadas de forma democrática, transparente e conforme os anseios das Nações, já que elas, sem armas ou lutas corporais, podem aniquilar ou soerguer setores, criar cidades mortas ou prósperas, ampliar ou reduzir diferenças socioeconômicas. Aliás, é em virtude delas que se elimina povos e etnias, ou ainda inviabiliza-se a procriação de seus bravos sobreviventes. Portanto, elas podem levar à condenação, à morte e à não reprodução, sem a publicação devida e direito de ampla defesa.
Assim sendo, os povos terceiro-mundistas têm que pressionar no plano internacional, através de seus reais líderes, para o reconhecimento do pagamento da dívida externa, após auditoria. Reivindicar o fim do anatocismo e a prática do comércio justo entre as Nações. Exigir, ainda, a vedação do cassino global e a implantação da Taxa Tobi, ou seja, aplicação de imposto sobre as transações financeiras cambiais no mundo, bem como a realização de uma cruzada planetária contra a corrupção e a implantação do escambo no comércio externo.
No plano nacional, as nossas políticas econômicas devem ser planejadas, respeitar as diferenças locais e regionais, e destinadas ao desenvolvimento sustentável, sem copiar modelos alienígenas, criando um próprio, buscando a produção de bens e serviços necessários às massas populacionais desprovidas de dignidade humana. Esperamos que em 2003 o nosso futuro governo, efetivamente democrático, assim atue, inclusive liderando as Nações em desenvolvimento para o combate do genocídio econômico e da miséria global.
Obs. Artigo peoduzido em 2002 e já publicado anteriormente.