ESPÍRITO SANTO - JUSTIÇA ABALADA

“Trabalha e Confia”! Para quem não sabe, este é o “slogan” da bandeira do Estado do Espírito Santo. O pequeno notável Estado do Espírito Santo começa ao Sul da Bahia, limita-se em todo o Oeste com Minas Gerais e se finda no Norte fluminense. À Leste, o esplendor do Oceano Atlântico com cerca de 350 km de belíssimas praias; seu povo, uma mistura de europeu com latino que originou em um dos mais agradáveis e amáveis povos do Brasil, mas a justiça do Estado...

O termo “complicado” poderia ser definido como lema recente do Espírito Santo, mas o mais correto seria “envergonhado”. Nos últimos anos o que não faltou para o povo capixaba foram motivos para se sentirem envergonhados; parece que os Três Poderes estaduais resolveram se unir para fornecerem matérias jornalísticas de conotação nacional e envergonharem completamente aquele povo ordeiro e trabalhador.

Primeiro foram os escândalos do Legislativo; a Polícia Federal cumpriu mandados de prisão expedidos pelo TRF que chegou a prender o ex-presidente do Legislativo capixaba; depois vieram os escândalos com juízes e desembargadores do próprio TRF; segundo procuradores federais, havia uma quadrilha de magistrados no Espírito Santo que facilitava a vida de amigos em processos; depois vieram os escândalos envolvendo policiais civis e servidores do alto escalão federal que “davam uma mãozinha” aos bandidos das importações ilegais. Nesta ultima operação, um filho de Governador chegou a ser preso por cumplicidade com a quadrilha.

Neste ponto da história, o Espírito Santo já estaria mergulhado em uma crise interna maior do que a sua própria extensão territorial; chegou a se comentar nos bastidores do Congresso de haver intervenção federal para que o tema não expandisse ainda mais. Outras crises chegaram a abalar as estruturas políticas e sociais daquele Estado, mas um mar de calmaria se estenderia até a semana passada.

No início de dezembro três Desembargadores, inclusive o Presidente do TJ estadual e um juiz, receberam notícia de prisão decretada pelo Superior Tribunal de Justiça; estes magistrados foram acusados, investigados e presos após denuncias de crimes de favorecimento, peculato e prevaricação; dava início a mais recente crise envolvendo os baluartes capixabas, gente acima de tudo e de toda e qualquer suspeita, pelo menos para nós que estamos de fora e não vemos, sabemos ou ouvimos nada que diga a este respeito.

Os supostos crimes eram simples (para os acusados); segundo investigação do Ministério Público e Polícia Federal, os amigos dos desembargadores acionavam empresas e o Governo na justiça, procedendo com os mais absurdos pedidos ilícitos; o Desembargador Frederico Pimentel, Presidente do Tribunal e também pai do juiz preso, Frederico Pimentel Filho, davam ordens a uma funcionária que tratava de “sortear” o destino “certo” de cada processo. Na vara de um amigo ou na turma de seus amigos, todos os processos eram julgados favoráveis aos interessados acusados e ao final, a quadrilha recebia uma “ajudinha de custo” como carros importados, dinheiro e outros mimos.

Os presos especiais foram transferidos para Brasília e confiados a carceragem da Polícia Federal, por se tratar deles possuírem foro privilegiado e lá permaneceram durante quatro dias dos cinco em que suas prisões temporárias lhes permitiam; entrou em cena então a preclara Ministra Laurita Vaz, relatora do processo, que decretou a revogação do xilindró dos juízes. Caberá ainda a Laurita Vaz decidir se os acusados poderão ou não retornar as funções de magistratura, uma vez que o Egrégio Colegiado capixaba em seção plenária decidiu pela consulta a relatora.

Antes mesmo de adentrar na questão das prisões de magistrados do alto escalão da justiça brasileira, vale também lembrar que nesta mesma semana foi condenado a nove anos de prisão o Juiz Federal Salem Jorge Cury da 3º Região (São Paulo – Mato Grosso do Sul); segundo acusações também do Ministério Público, Salem Jorge permitia que um funcionário do TRF assinasse documentos em seu nome e durante o período inquisitório e investigatório, ele coagiu diversas pessoas envolvidas no escândalo; perdeu o cargo e será “preso” para cumprir a pena determinada pelo próprio TRF 3 juntamente com seu “amigo” e servidor Vander Ricardo de Oliveira.

O judiciário, antes respeitado e glorioso, está se tornando o principal alvo da corrupção ativa brasileira; os novos e velhos magistrados, sem generalizar, não estão suportando as pressões políticas e as pressões das vaidades pessoais. Nunca antes os carros, mansões, viagens glamorosas, jóias de valor inestimáveis, fazendas e barcos fizeram parte da vida de parte da elite do judiciário do Brasil, como se viver sem isso perdesse a preeminência fantasiosa de ser poderoso.

Eu não saberia mensurar se há culpabilidade desta ou daquela figura; eu não saberia afirmar se a própria sociedade que ajudou a criar estes mitos também não se porta com mea-culpa deste fenômeno, mas certeza mesmo é que para ser deputado, senador, governador, juiz, promotor ou delegado de polícia e não ter um bom carro, uma boa casa e freqüentar os lugares mais caros da sociedade significam “desconfiança” por parte de muitos e se aplica claramente na maioria dos cargos que exerçam “poder”, principalmente os que possuem “poder de polícia”.

Se olharmos para o passado, veremos que os juízes, desembargadores e ministros superiores, desta vez generalizando, eram figuras que já haviam nascido abastadas e oriundas de uma linhagem nobilíssima, primeiro que estudar direito antes de 1980 era praticamente impraticável para os comuns e desafortunados; depois que para poder se dizer “preparado” para uma carreira jurídica na magistratura era tão comum para os ricos da mesma forma que passar fome para os pobres, então, raramente víamos um magistrado de linhagem desafortunada.

Os magistrados de modo geral eram homens e raras mulheres que possuíam belas mansões, os mais caros veículos dotados de motoristas uniformizados; não posso dizer que seus proventos sustentassem estes luxos decadentes, mas com certeza, salário não era a perseguição da maioria deles; fala-se no meio jurídico que milhares de juízes foram indicados por seus padrinhos e que jamais passariam com louvor num concurso público. Este conjunto em extinção era visto como algo surpreendente e os “homens da capa preta” eram verdadeiros deuses do Olimpo, daí a frase célebre: metade pensa que é Deus e a outra metade têm certeza.

Com o passar dos anos e a evolução da comunicação e da própria justiça, estes canais de mitos começaram a cair, da mesma forma que seus próprios poderes semi-absolutistas e a figura do juiz, prefeito, padre e delegado já não mais ostentavam tanto glamour quanto antes. Os proventos desta gente começaram recentemente a ganhar proporções menos volumosos, mas a vaidade, pelo menos para alguns, jamais deixou de existir.

No Século XXI, a popularização dos cargos tornou de certa forma fácil uma pessoa comum, dotada apenas de inteligência conseguisse chegar à carreira da magistratura e com este fenômeno nunca antes visto vieram também à vulnerabilidade dos “intocáveis”. Toda esta gente que possui PODER através de seus ofícios começaram a perceber que eles eram mais parecidos com o povo e que a questão do “efêmero” já havia batido a sua porta. Era preciso fazer compreender que esta concentração de “poder” teria dia e hora certos para se encerrar e que todas estas pessoas voltariam a serem pessoas comuns.

Como já disse Jose Marti, líder da libertação cubana: “o que brilha com luz própria nada pode apagar”; o brilho de muitos magistrados não advém de seus próprios conhecimentos e de suas aplicações nas ciências jurídicas, eles brilham para a sociedade que os bajulam e através de prêmios sem nenhuma importância, brindes e mimos; são pessoas vaidosas que cultivam a parte mais medíocre do passado enganador.

Mas como eu costumo dizer da Polícia Rodoviária Federal que tinha a fama de ser a mais corrupta polícia brasileira e que depois dos últimos concursos, mais sérios e cheios desta gente jovem cheia de boas idéias e ações práticas anticorrupção já dá exemplo de ser uma das mais atuantes e notáveis; da mesma forma é que afirmo com toda autoridade: os jovens juízes, aliados aos bons do passado ainda farão da justiça brasileira um orgulho nacional, é uma questão de tempo.

Se estes magistrados acusados de formação de quadrilha, roubo e favorecimento próprio forem julgados “culpados”, que eles sejam banidos do quadro tão nobre de JUÍZES e que recebam além da pena prevista em Lei, uma chance de utilizarem suas cabeças para promoverem a justiça e não a baderna. O povo do Brasil não pode confundir os que delinqüem com suas instituições, afinal de contas, marginais existem em todas as classes.

Da mesma forma que confundir uma decisão séria e embasada na Lei com a promoção de favorecimento; a Ministra Laurita Vaz do STJ, muito embora tenha permitido a soltura dos acusados do Espírito Santo, agiu em formalidade legal; da mesma forma que, pela primeira vez em muitos anos, um espetáculo pirotécnico não foi deflagrado, com a prisão de gente tão ilustre e respeitado; mostra maior disso foi à operação da PF que sequer foi comentada, apesar de seu nome: NAUFRÁGIO.

O povo brasileiro, em especial do Espírito Santo, não merecia um presente destes de Natal! Agora é trabalhar e confiar que a Justiça capixaba restaure sua dignidade para poder voltar a atuar conforme suas incumbências naturais sem o menor nível de questionamento.

Eu não lembro de ter conhecido magistrados corruptos mas conheço centenas deles que são de caráter probo e de retidão dos princípios e este é meu maior orgulho!


Carlos Henrique Mascarenhas Pires
Meu site: www.irregular.com.br
CHaMP Brasil
Enviado por CHaMP Brasil em 14/12/2008
Código do texto: T1335052
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.