O ÓCIO DESTRUIDOR, AINDA ...

Nadir Silveira Dias

O ser humano é essencialmente dinâmico. Não lhe cabe a alegação de que deseja viver inerte, qualquer que seja a razão dessa motivação. Mesmo porque, assim procedendo, estará decretando o seu aniquilamento físico e mental. Aliás, contrário até mesmo ao natural instinto de sobrevivência, típico da condição humana.

Como então admitir que alguém não queira trabalhar para viver? Admitir-se-ia o gozo permanente de uns, necessariamente sustentados pelos outros? Não, absolutamente claro que não. Isto é e há de ser contrário ao virtual caráter humano.

Resulta que, perdendo como perdeu, in bíblico, o Paraíso (?), o ser humano precisa trabalhar para viver. Os mais ilustres homens não prescindiram do trabalho. Ao oposto, dele fizeram alavanca propulsora das grandes realizações de todos os tempos.

O trabalho é requisito do ser humano. Sem ele não pode haver humanidade, pois ela é fervilhar, é aumentar, é crescer, desenvolver, progredir, marchar para melhores dias, melhores seres, é e deve ser aperfeiçoamento constante, permanente.

Assim, como compreender que aos desviados de conduta tenha o homem, já com o status de Estado-Judiciário, atribuído aos homens penas que não contemplam com o trabalho a sua recuperação, o seu refazimento, como indivíduo correto e prestativo à condição que desfruta?

O Estado-Constituição veda as penas de morte e de trabalhos forçados. E se trabalho forçado é aquele imposto a quem não quer trabalhar, pura e simplesmente porque não quer, houve-se mal a Constituição. E isso porque não há como não querer trabalhar sendo-se humano. Até os animais não racionais trabalham sob a orientação e disciplinamento dos homens. Como aceitar, então, que um ser inteligente não queira trabalhar?

O sistema penal, portanto, segue a Constituição e temos presente, como presente, uma indústria deformadora de homens sempre apta a gerar novas e engenhosas perfurações no tecido social, no arcabouço da humanidade.

Pode se admitir um grupo humano que nada gere de produtivo e despenda produção e recursos faltantes a outros que os produzem? O sistema penal cuida da recuperação dos seres humanos desviados ou é válvula estimuladora da criminalidade, do ócio permanente, custeada pelos contribuintes, em sua maioria subnutridos?

É correto para uma dada sociedade permitir e suportar um tal estado de coisas? Não, cristalinamente lógico que não é. Mudanças haverão de vir. Já devem estar próximas. Tamanho descalabro não pode continuar. A ruptura no tecido jurídico-social atinge níveis alarmantes que precisa ser contida.

A pena de morte imposta pelo Estado-homem não pode ser decretada pelo homem. Há de ser mantida a disposição constitucional.

Mudado sim deve ser o sistema de penas do Código Penal. De anos ociosos, deformadores de qualquer bom caráter, eventualmente em deslize, para anos-trabalho, trabalho-requisito da realização humana, único meio capaz de recuperar o ser humano desviado!

De brinde, refriso, o desencargo para a sociedade de pagar, uma segunda vez, o ônus de punir o desarmônico culpado!

Extraído do livro "Rastros do Sentir", pp. 126-128, Nadir Silveira Dias, Porto Alegre, 1997.

Escritor e Advogado – nadirsdias@yahoo.com.br

Nadir Silveira Dias
Enviado por Nadir Silveira Dias em 19/03/2006
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