Diante da Virgem
Senhora minha, um escritor cansado
Revê a vida e tenta alçar uma prece
Para além do teto, para à luz dos prados
No Céu alcancem vossa mão que tece
Um sudário para os dias meus já mortos
E o desfaz quando meu corpo oferece
Um movimento para os sutis portos
De vosso manto, azul ancoradouro
Esse descanso para quem por tortos
Caminhos e por terras de desdouro
Com mãos e pés desnudos palmilhou
Detendo-se em frontões de falso ouro.
Odisseu sem glória e sem astúcia
Sou eu a Troia que às chamas se entregou.
Buscando a Ti, Sagrada Mãe, ó núncia
Do Mistério maior que me engendrou
Espero detenha-se de uma vez a faina
De esfazer o lenço em que a morte estampou
Os dias meus de muito lodo e paina
E eu possa enfim evaporar os vinhos
Que este tempo de ilusão me inoculou.