ODE: BREVE HISTÒRICO


          Para entender minimamente a ode, comecemos pelo significado de canção. Vejamos que tipo de composição é e qual sua relação com os poemas.

          Canção- Latim cantione (m Ac.), canto, canção.

          “Várias conotações revestem o vocábulo ‘canção’. De modo genérico, designa toda composição poética destinada ao canto ou que encerra nítida aliança com a música. Nesse sentido, o termo acoberta poemas de vária natureza, infensos a qualquer discriminação esclarecedora.” (MOISÉS, MASSAUD. 1974, p.68).

          Há dois tipos de canção: a popular e a erudita. A popular limita-se com o folclore e a música não segue moldes precisos.

           “A outra modalidade que não recusa as achegas oferecidas pela sabedoria do povo, caracteriza-se pela obediência a esquemas cultos e precisos.” (Moisés, M. p.68).

          A história da canção começa com a lírica trovadoresca. No provençal era canso ou chanson. No vernáculo e no espanhol, canción, canção, cantiga.

          No século XV passou a designar um tipo particular de composição de forma fixa. 

          O tipo particular, fixo, surgira por conta da canzone italiana (de origem provençal). Foi criado pelo trovador Giraud de Borneil, em finais do século XII “Numa altura em que as estruturas poéticas occitânicas entravam a apresentar sinais evidentes de transformação” (Moisés, M. p.69)

          No século XIII difundiu-se pela Europa, inclusive a Itália, onde até mesmo a langue d’oc foi utilizada em composições lírico amorosas, graças aos jograis.

          Essa foi a matriz da canção erudita.Essa mesma passagem (de cansó para canzone) relaciona-se a uma alteração paralela na lírica trovadoresca com gradual separação de poema e música. Com o tempo o poema seria lido ou declamado,

          Dante e Petrarca foram os primeiros a elaborar a canzone de forma estruturada e o fizeram com maestria.

          Retomada durante o Romantismo, às vezes paralela, mas independente do folclore e da criação popular, às vezes misturada a ela, a canção é uma forma de composição utilizada até nossos dias..

          Caracteriza-se por apresentar também verso livre, heterometria, estrofação arbitrária. Foi utilizada por grandes poetas nos nossos tempos.

          Espera-se que a canção seja vibrante, que os sentimentos transpareçam (amor, paixão, ódio, vingança), “onde se sinta que pulsa a alma do poeta”. (Moisés, M. p. 70).

          Os temas das canções são: guerreiros, morais, satíricos, religiosos.“Entretanto seu motivo dileto e mais constante é o amor, de tal modo que a palavra ‘canção’ invoca amor e vice-versa.” (Moisés, M. P. 70).

          A canção também é identificada com o lirismo. Pode-se dizer que canção, tema de amor e lirismo são categorias vizinhas e interinfluentes.


          Ode- Grego oidê, canto. Para Massaud Moisés (1974, p.372)canção e ode são sinônimos.

          Inicialmente cantada ao som de instrumentos de corda barbitos, pectis ou magadis, era no século VI AC. De métrica variada e se disposta em quartetos. Os três primeiros versos tinham medida idêntica: troqueu+troqueu+dáctilo+troqueu+troqueu.
          O quarto verso era formado por: dáctilo+troqueu. O verso era chamado de verso sáfico e a estrofe de estrofe sáfica. Recebeu esse nome por causa da poetisa Safo (grega) que primeiro os utilizou. Esse tipo foi também utilizado por Alceu e Anacreonte.

          O amor, o vinho, os prazeres da mesa são os temas.

          No português, o verso sáfico passou para decassílabo, com cesura na 4ª e na 6ª sílabas e a estância sáfica, a compor-se de três decassílabos e um verso de quatro sílabas.

          No lirismo coral a ode trata de temas relacionados à vida heróica.”O lirismo monódico cede vez a um lirismo de expressão coletiva que glosa, oratórias e dramáticas.”(Moisés, M. p.372). O instrumento usado é a flauta (apropriada para execuções vocais em grupo), o poema tem definição estrutural relativa. Começa e termina por um encômio ( elogio ou louvor a alguém, ap anfitrião, ao herói, ao morto...).

          Nessa época o encômio do início era feito às celebridades, entremeado pela narração de episódios míticos. As partes se sucediam de acordo com a ordem do pensamento, da emoção e do ritmo e da melodia próprios. Era composta de estrofe, antístrofe e epodo (cantar depois).

          A estrofe*, nesse caso, era a primeira vez em que o coro intervinha nas odes gregas, quando os cantores executavam uma volta ao redor do palco. A ela seguiam-se a antístrofe e o epodo.

          Não havia uma forma fixa. Era composta de estâncias** com variação de segmentos e de metros.

          Nessa modalidade a ode era uma atividade teatral. Píndaro escrevia esse tipo de ode, triunfal, enquanto a ode monódica era chamada de ligeira.

          Na transposição para o português a ode pindárica emprega decassílabo e hexassílabo (ou heróico quebrado) entrelaçados.

          Em Roma, Horácio segue as odes de Safo e Alceu, mas para leitura individual. Os temas são experiência pessoal, biográfica ou íntima. As estâncias são regulares, Formadas por quatro versos (quando rimados, usando aabb)Os dois primeiros pés de cada estância são um ou dois pés mais longos do que os dois últimos e o pé dominante á o jâmbico.

          Nas palavras de Boileau, teórico francês do clacissismo, “Son style impétueux souvent marche au hasard / Chez elle um beau désordre est um effet de l’art”( L’art poétique, 1674, canto II, vv. 71-72, Apud Moisés, M. p 373).

          “Havia também a intenção de reafirmar o primado clássico da Razão sobre a emoção, de lucidez artesanal sobre a aventura sentimental.” (Moisés. M. p373)

          No Romantismo, embora menos, continuou a ser usada. Foram novas formas, novos matizes de cunho subjetivista.

          Chega até nós sofrendo mudanças graduais, com completa liberação formal, verso e estrofação livres (apenas o tema e o tônus elevado podem identifica-la como ode no mais das vezes) sofrendo ainda um abrandamento da eloqüência originária. Note-se “porém que seus limites por assim dizer flutuam, por os poetas saberem o que é, no fundo, uma ode, não reconhecendo ao mesmo tempo autoridades e modelos” ( Wolfgang Kaiser, Análise e Interpretação da Obra Literária, 2ª ed. 1958, vol.I p 254, Apud Moisés, M. p.374).

          No decorrer das transformações por que passou, não perdeu a atmosfera grave, solene, próxima do drama e da poesia épica.

          A ode varia nom tocante a temas, assuntos e esquemas métricos.

          1- Tema, assunto, matéria:

          A) Heróica ou pindárica (epinício: atinge ao épico),
          B) Filosófica e moral ou sáfica,
          C) Amorosa, pastoril, báquica ou anacreôntica, aparentada ao ditirambo é próxima das canções das liras, dos rondós,
          D) Sacra, sobre assuntos sacros ou religiosos (no vernáculo por Corrreia Garção).

          2- Forma

         A) Tripartite ou pindárica com estrofe, antístrofe com organização comum e a epode divergente,
          B) Homostrófica ou horaciana composta de uma série de estâncias iguais,
          C) Irregular ou livre.


          Foi levada para Portugal durante o século XVI. Passou pelas mesmas mutações das demais literaturas européias. Foi utilizada por grandes escritores como Camões, Bocage, Antero, Miguel Torga, José Régio, Fernando Pessoa, (também Pablo Neruda).

          Na Literatura Brasileira, surgiu apenas no século XVIII com Cláudio Manuel da Costa, Sousa Caldas; no séc. XIX Castro Alves, Tobias Barreto; No séc. XX Raul de Leoni, Mário de Andrade, Emílio Moura, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles...



*Estrofe: agrupamento de versos, rimados ou não, com unidade de conteúdo e de ritmo (solidários pelo ritmo, inseparáveis pelo pensamento)

Porém convém atentar para o fato de que um período (pensamento) pode desdobrar-se em várias estrofes; um verso pode encadear-se no seguinte, uma estrofe com a outra.

(Modernamente diz-se que estrofe é igual a estância). 


**Estância: repetição do mesmo dispositivo estrófico, número fixo de versos com igual medida e igual arranjo de rima.

Por essa razão para o soneto sempre se usa estrofe. (Moisés, M. p. 207).


(Fichamento baseado em verbetes)

MASSAUD, Moisés.(1974) Dicionário de Termos Literários. São Paulo. Cultrix