21 - O CONTO TRADICIONAL

I - O "Conto tradicional" ou "Conto Maravilhoso"

Distinção entre "conto tradicional" e "fábula"

II - Estrutura do Conto Maravilhoso

III - A origem dos Contos Tradicionais

IV - Recolhas mais antigas

- Panchatantra

- As Mil e Uma Noites

V - O Conto Tradicional na França do século XVI

VI - Estudiosos dos Contos Tradicionais

RECOLHAS NOTÁVEIS

VII - Escritores que se inspiraram nos contos tradicionais

VIII - Os contos Orientais na actualidade, e a Psicoterapia

IX - Os contos tradicionais em África

X - Para terminar -

1- Quais as palavras mágicas que nos dão entrada ao reino da Fantasia?

2 - Contos e canções - A Música tradicional - Função social das Tradições

XI - Bibliografia

Já dissemos que o Conto Tradicional é diferente do Conto Literário, ou Conto de Autor.

Sobre o "conto de autor" poderá ver o capítulo 18.

O Conto Tradicional é estudado no âmbito da Antropologia; o Conto-deAutor é estudado no âmbito da Literatura.

I - O CONTO TRADICIONAL

– também designado como CONTO MARAVILHOSO

O Conto Tradicional é transmitido pela TRADIÇÃO ORAL. Isso quer dizer que NÃO SE CONHECE o seu AUTOR.

Trata-se, pois, de uma história antiga, muito antiga mesmo: uma narrativa que tem sido transmitida de geração em geração!

Por esse motivo, essa narrativa vai sofrendo alterações, à medida que vai sendo repetidamente contada:

A versão que chega aos nossos dias é o resultado dessa evolução que a história vai sofrendo... ao longo de... séculos.

*

Porquê: conto... “maravilhoso”?

Em geral, o Conto Tradicional tem por base os elementos morais que sempre têm preocupado a Humanidade: o BEM e o MAL, e a TENSÃO entre ambos.

No Conto Tradicional, ou CONTO MARAVILHOSO, entram elementos de um mundo fantástico, que realizam “maravilhas”: Em geral, trata-se de Fadas, Bruxas, e Feiticeiros. E surgem as maldições herdadas de um Tempo Passado, ou as Profecias quanto a um Tempo Futuro...

*

É fundamental não confundir "conto tradicional" e "fábula":

no "conto tradicional", as PERSONAGENS são humanas, são em geral jovens - rapazes ou raparigas (1). Nas "fábulas", as personagens são animais 'personificados'.

II - ESTRUTURA DO CONTO MARAVILHOSO

A PERSONAGEM PRINCIPAL do Conto Maravilhoso é, em geral, um JOVEM “bem parecido” que terá que ultrapassar, ou vencer, obstáculos para salvar uma DONZELA dos feitiços que a prendem. Ela poderá ficar prisioneira num castelo fantasmagórico... Quando acontece que o PRISIONEIRO seja o mancebo, este poderá encontrar-se sob um disfarce estranho: sob a forma de um animal, por exemplo...

Para o DESENLACE da história, é necessário que o RAPAZ salve a RAPARIGA, ou vive-versa!

Mas surgirá um OPOSITOR:

este OPOSITOR simboliza as contrariedades ou dificuldades da Vida, que o jovem "herói" terá que ultrapassar e vencer, com perseverança.

No entanto, também surgirá um COLABORADOR que o ajudará a alcançar os seus fins!

Tanto o OPOSITOR como o COLABORADOR poderão ser seres fantáticos - ou "maravilhosos": poderão ser as FADAS (boas), como poderão ser as "BRUXAS" (más)... Também poderão surgir SERES "ANIMADOS" (animais ou seres inanimados que, em certo momento, procedem como se tivessem "alma") - o rio que se deixa atravessar, por exemplo... Os pássaros que fazem o vestido de baile à Donzela, o vento que abranda propositadamente, o nevoeiro que vem proteger a Donzela...

*

Por que razão os “heróis” destes contos são em geral belos príncipes, ou belas princesas?

Porque a BELEZA FÍSICA será o espelho, o reflexo, ou o sinal da sua BELEZA MORAL.

*

No final destas histórias, regra geral, o BEM vencerá o MAL. Essa vitória do Bem é assinalada por um PRÉMIO ao HERÓI ou HEROÍNA da história: no final do conto da GATA BORRALHEIRA, a Cinderela casa com o Príncipe: esse é o PRÉMIO de ter sido sempre gentil e generosa!

As aventuras ou PERIPÉCIAS pelas quais o HERÓI, ou HEROÍNA – o SALVADOR ou a SALVADORA – terão que passar, SIMBOLIZAM as contrariedades que os jovens sofrem na sua aprendizagem da Vida, até chegarem à idade adulta...

III - Qual a ORIGEM dos CONTOS TRADICIONAIS?

Penso que a origem do Conto Tradicional será muito mais antiga que a origem do Romance:

Pelo que tenho estudado, penso que provavelmente trata-se de reminiscências da Cultura dos antigos povos da Euro-Ásia!

Havia uma profusão de narrativas transmitidas de pais a filhos, desde tempos imemoriais. Nada nos custa a imaginar famílias, ou aldeias, reunidas em volta da fogueira familiar ou comunitária, narrando os acontecimentos do dia... Ou fazendo referência a acontecimentos mais antigos, dignos de memória. Quer por serem divertidos, quer por serem "exemplares" - isto é, por fornecerem algum tipo de reflexão, ou algum modelo de comportamento para circunstâncias específicas...

IV - Recolhas mais antigas - o PANCHATANTRA

- as MIL E UMA NOITES

Desde os tempos antigos que há o interesse de registar as histórias que iam passando de boca em boca:

O PANCHATANTRA

Uma antiquíssima recolha de breves narrativas, indianas, é a que conhecemos sob o título de "PANCHATANTRA", que provavelmente data do século III a.C. :

Para realizar tal colectânea, era necessário um pretexto, um "argumento"... um fio condutor! Assim, há um rei que quer educar os seus filhos. Encomenda essa tarefa a diferentes sábios. Mas não se vêem resultados... Surge então um outro sábio, que vai contando aquelas histórias! E as oferece aos príncipes, para reflexão!

*

Algumas destas histórias foram conhecidas na Península Ibérica, no remoto século X! Foi o príncipe D. Afonso, que mais tarde viria a ser o sábio rei D. Afonso X, quem as mandou traduzir. Por aqui circularam, conhecidas sob o nome de "KALILA e DIMNA"

*

É interessante referir que no AUTO da "MOFINA MENDES", de Gil Vicente (1465-1536), temos uma versão magistral de uma pequena história do Panchatantra!

AS MIL E UMA NOITES:

Trata-se de uma colecção de contos populares originários do Médio Oriente e do sul da Ásia: há fragmentos de alguns originais do século IX. É uma recolha de contos populares Persas, Indianos, Árabes...

Deve-se esta recolha ao imperador da dinastia ABÁSSIDA - na Arábia - Harun Al Rashid , do séc VIII: ele mandou recolher e registar as muitas histórias que corriam de boca em boca! Assim, foi-lhes dado um fio condutor, e a narrativa de tantas histórias foi entregue à personagem fantástica de SHEHERAZADE.

A primeira tradução destes contos para as línguas ocidentais foi feita no início do século XVIII, pelo francês Antoine Galland. Mas a tradução não é nada fidedigna, pois nessa época não se fazia sentir a necessidade da fidelidade ao texto original, coisa que actualmente é um requisito fundamental.

Em 2017, surgiu, em Português, uma rigorosa tradução destes textos árabes da Síria e do Egipto. Tradutor: Hugo Maia. Editorial Letras Errantes.

Vemos, assim, que em ambas estas recolhas, foi procurado um "pretexto", um "argumento", para encadear tantos pequenos contos , uns a seguir aos outros!

BRUNO BETHELHEIM (que li há imensos anos), no seu prefácio a "Psicanálise dos Contos de Fadas", diz que na ANTIGA ÍNDIA, o Velho sábio da aldeia, quando um jovem precisava de ajuda, contava-lhe um conto apropriado ao problema que o atormentava. O jovem ficaria a pensar sobre a história ouvida, e tiraria a conclusão que o encorajasse a ultrapassar as suas dificuldades!

Uma possível origem dos Contos Tradicionais estará na conhecida EPOPEIA DE GILGAMESH, uma história aventurosa de um rei desumano que após várias aventuras se humaniza!

A EPOPEIA DE GILGAMESH é uma das mais antigas histórias de que se guarda memória! Data do século VII a.C.! Como nessa época recuada o povo não sabia ler, a história era contada em baixos-relevos!

Há também uma história, do antigo Egipto, que achei tão interessante, que a adaptei para uma turma de 7º ano, pois era uma espécie de Cinderela...!

Uma outra história, muito conhecida, do Antigo Egipto, é a "Aventura de Sinué". Nela se inspirou - apenas como ponto de partida - o escritor finlandês Mika Waltari (1908-1979).

V - O CONTO TRADICIONAL, na FRANÇA do SÉCULO XVII:

CHARLES PERRAULT recriou os contos da tradição oral francesa, que recolhia.

Foi ele o criador do CONTO DE FADAS que chegou até nós! - e que ainda hoje nos delicia.

No entanto, PERRAULT fez versões fantasiosas dos contos que recolhia, às quais dava a sua versão:

Quem já tem alguma informação sobre a vida quotidiana do séc XVII (e épocas imediatamente seguintes), não estranhará um certo tom de sadismo que caracteriza essas versões...

Na mesma época, no séc XVII, LA FONTAINE (1621-1695) elabora uma versão das FÁBULAS muito pessoal!

VI - ESTUDIOSOS dos Contos Tradicionais

Como é possível que os Contos Tradicionais tenham chegado aos nossos dias?

Há RECOLHAS sobre Contos da Antiguidade, do Egipto, de Roma, da Índia...

Basta ir a uma biblioteca pública, e aí se encontrarão importantes publicações com interessantíssimas recolhas, certamente.

RECOLHAS NOTÁVEIS:

Na EUROPA:

O interesse pelos CONTOS TRADICIONAIS despertou, na Europa, no período do Romantismo.

Já no último quartel do século XVIII, os IRMÃOS GRIMM, na Alemanha de então, empreenderam o registo dos contos tradicionais. Mas estes só foram publicados no século XX. Há uma preciosa tradução portuguesa, por Teresa Aica Bairos, Círculo de Leitores, 2013: CONTOS COMPLETOS, IRMÃOS GRIMM.

Em Portugal, fizeram importantes recolhas:

= Almeida Garrett (1799-1854), reuniu as suas recolhas de "romances" (narrativas rimadas) no ROMANCEIRO: tomo 1 - 1843; tomos 2 e 3 - 1851

= Adolfo Coelho (1847-1919)

= O algarvio Francisco Xavier d'Athaide Oliveira (1842-1915) registou por escrito os “Contos Tradicionais do Algarve” e estudou as tradições das Mouras Encantadas.

= José Leite de Vasconcellos (1858-1941) - brilhante investigador português, deixou importantíssima obra. Foi linguista, filólogo, arqueólogo, etnógrafo.

= O algarvio Manuel Viegas Guerreiro (1912- 1997) importante investigador de Etnologia, tanto portuguesa como brasileira e africana. Tive o prazer de ter sido sua aluna na Faculdade. Deixou-nos um "Guia de recolha da literatura popular"

= Gentil Marques (1918-1991) foi um apaixonado pelas “Lendas de Portugal”. Deixou-nos uma recolha de 5 volumes, publicada pelo Círculo de Leitores, 1997

= João David Pinto-Correia (1939-2018) - especialista em Literatura Oral - professor da Faculdade de Letras de Lisboa, com obra publicada sobre esta matéria

E grandes recolhas continuam a ser realizadas. Saliento as seguintes:

= Fernanda Frazão, "Lendas Portuguesas", Amigos do livro Editores, 1982.

= Também especialista em lendas e tradições, é Gabriela Morais. Uma das suas obras mais conhecidas será “A Senhora de Ofiúsa”, Bertrand, 2007.

= Fernanda Frazão e Gabriela Morais, "Portugal, mundo dos mortos e das mouras encantadas", Lisboa : Apenas Livros, 2009

= Alex Rodrigues, coligiu e publicou “Contos e Lendas Transmontanas”, Leya, 2020

Por toda a EUROPA, nos diferentes países europeus, há recolhas de contos tradicionais!

Em Itália, ITALO CALVINO, estudou e recolheu “Fábulas e Contos”. Obra traduzida em Português: Editorial Teorema, 2000.

Do mesmo modo, nos países da América do Sul, muitos escritores se têm empenhado em recolher contos tradicionais.

No BRASIL:

ARIANO SUASSUNA (1927-2014), o saudoso autor do “Auto da Compadecida” – exibido em filme que vi no Canal GLOBO:

Criou o Movimento Armorial, com o objectivo de criar uma arte erudita inspirada na Cultura do Nordeste brasileiro.

Em 1973:

Em Portugal, a Editorial Futura publicou vários pequenos volumes de “Contos Populares Chineses”.

OUTROS ESTUDIOSOS:

= JAMES FRAZER (1854-1941) - antropólogo e folclorista, teve grande influência nos modernos estudos de Mitologia, e religiões comparadas

= VLADIMIR PROPP (1895-1970) estudou a estrutura do conto tradicional russo: A MORFOLOGIA DO CONTO:

Os seus estudos foram tão importantes que influenciaram Claude Levy-Strauss e Roland Barthes (informação colhida na Wikipedia)

= BRUNO BETTELHEIM (1903-1990) psicólogo estado-unidense nascido na Áustria, publicou o seu profundo estudo sobre os contos tradicionais, que está traduzido em Português: “PSICANÁLISE DOS CONTOS DE FADAS”.

JOSEPH CAMPBELL (1904-1941) - igualmente especializou os seus estudos em Mitologia Comparada, e Religiões Comparadas.

= MIRCEA ELIADE (1907-1986) grande especialista em Ciência das Religiões, e Mitologia.

= CLAUDE LEVI-STRAUSS (1908-2009) outro grande estudioso sobre os mitos

= PIETRO CITATI (italiano, 1930), dedica alguns capítulos da sua obra ISRAEL E O ISLÃO – AS CENTELHAS DE DEUS, aos contos que se difundiram na Europa com origem na versão HASSÍDICA do Judaísmo.

= TZEVETAN TODOROV (1939-2017) estudou a estrutura do conto tradicional em “Introduction à la littérature fantastique” (1970).

= ANTÓNIO QUADROS (António Gabriel de Castro e Quadros Ferro - 1923-1923): também estudou as “estruturas narrativas do maravilhoso: o conto tradicional: estrutura, mitos e arquétipos”...

= PEARL S. BUCK (1892-1973):

Esta escritora estado-unidense, que ganhou o Prémio Pulitzer em 1932 e o Nobel em 1938, foi criada na China. Daí o seu interesse pela cultura chinesa.

Publicou “Histórias Maravilhosas do Oriente”, uma colectânea que reúne contos tradicionais japoneses, russos, persas, indianos, turcos, e chineses. A tradução portuguesa, da editora Livros do Brasil, data de 1965.

No Prefácio a esta obra, a Autora faz uma breve mas elucidativa exposição sobre a natureza dos contos tradicionais, e dos símbolos que tradicionalmente surgem nestas narrativas. Por outro lado, após cada um destes contos, Pearl Buck expõe alguns comentários pessoais!

= MODJEH BAYAT e MOAMMAD ALI JAMNIA

Em 2002: A editora portuguesa Assírio & Alvim publica a tradução de uma obra preciosa:

"Contos do País dos Sufis", do casal canadiano Modjeh Bayat e Mohammad Ali Jamnia.

Estes autores apresentam um importante estudo, em 'posfácio', sobre o Sufismo, sua origem e conceitos, e sua vigência na actualidade. Têm ainda um capítulo sobre o Sufismo no Al-Andalus (centro e sul da Península Ibérica, durante a presença muçulmana, na Idade Média - do séc VIII ao séc XV).

Como instrumento de trabalho, há Dicionários de Mitologia.

= Barbara G. Walker - The Women's Encyclopedia of Myths and Secrets - Castle Books, Edison, New Jersey 1996;

ISBN: 0-7858-0720-9 - Este é um trabalho completíssimo, com vastíssima informação

= Jean Chevalier e Alain Gheerbrant - Dictionnaire des Symboles - Robert Laffont / Jupier, 1982

ISBN. 2.221.50319.8

= Tom Chetwynd - Dicionário dos Mitos Sagrados - Planeta Editora - ISBN: 972-731-126-1

= Mircea Eliade e Ioan P. Couliano - Dicionário das Religiões - Publicações D. Quixote, Lisboa, 1993;

ISBN:972-20-1117-0

= Jorge Campos Tavares - Deuses, Mitos e Lendas - LELLO & IRMÃO - EDITORES, Porto, 1992; ISBN: 972-48-1619-2.

Esta obra tem um interesse particular para os estudantes de Cultura e Literatura Portuguesas, pois apresenta, no final, um estudo sobre a "Mitologia n'"Os Lusíadas"

= De certo modo relacionado com o nosso tema, temos também uma obra importante, de Bruce Chatwin - Songlines (1987); obra traduzida em Português: "Canto Nómada" - Quetzal Editores, 2019.

*

Por outro lado, no nosso tempo, têm surgido colectâneas de NARRATIVAS E LENDAS do Antigo Egipto, da Grécia Antiga, da Roma Antiga, das narrativas Celtas, das sagas da Escandinávia, da Finlândia, etc...

VII - ESCRITORES QUE SE INSPIRARAM NOS CONTOS TRADICIONAIS

HANS CHRISTIAN ANDERSEN (1805-1875) - as suas maravilhosas histórias para crianças têm algo da magia dos contos tradicionais.

LEWIS CARROLL (1832-1898) - que de mais "maravilhoso" do que a sua obra "Alice no país das maravilhas"?

OSCAR WILDE (1854-1900)

Tal como as histórias de Andersen, os contos cheios de ternura que este escritor irlandês escreveu para os seus filhos, têm muito da estrutura e da magia do conto tradicional.

SELMA LAGERLöF (1858-1940)

Continua a ser lida com prazer, a sua obra "A Maravilhosa Viagem de Nils Holgerssons através da Suécia" (1906)

JOSÉ RÉGIO (1901-1969)

Em 1942, publica o romance "O PRÍNCIPE COM ORELHAS DE BURRO, história para crianças grandes"

JOHN STEINBECK (1902-1968) – publica em 1947, a comovente “novela” A PÉROLA (The Pearl), inspirada nas estruturas do conto tradicional, onde só há "os bons" e "os maus".

MARGUERITE YOURCENAR (1903-1987):

Esta autora publicou “Contos Orientais” - contos que vão beber inspiração nos contos orientais.

NAGUIB MAHFOUZ (1911-2006) – Na sua obra “AS NOITES DAS MIL E UMA NOITES" faz o prolongamento das antigas “Mil e Uma Noites”! No final, através de uma das personagens, o Autor faz alusão ao Sufismo.

JORGE AMADO (1912-2001)

Penso que muito do êxito dos romances de Jorge Amado se deve à oposição aberta que ele faz entre as personagens "boas" e as personagens "más". Um pouco à maneira da estrutura dos contos tradicionais.

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN (1919-2004)

Os contos para crianças desta escritora portuguesa, pelo seu elevado nível artístico, filosófico e moral, alinham com os de Andersen e de Oscar Wilde.

MICHEL TOURNIER (1924-2016) - autor de "Sexta-Feira, ou a vida selvagem", ou "Gaspard, Melchior et Balthazar", entre outros títulos.

VIII - OS CONTOS ORIENTAIS NA ACTUALIDADE e a Psicoterapia

Há ainda a mencionar o interesse que certos Artistas e Psicoterapeutas descobriram nos CONTOS ORIENTAIS, para a sua actividade terapêutica: até poderíamos dizer que os simples e aparentemente ingénuos enredos dos contos tradicionais re-encontram a razão de ser que lhes deu origem!

ALEJANDRO JODOROWSKY (1930), um multifacetado artista chileno de origem europeia que se radicou em Paris:

Criou dois métodos de cura (psicológica) muito peculiares:

- a psicogenealogia,

- a psicomagia:

Com este segundo método, ele leva os seus pacientes a encontrarem um caminho de cura através da reflexão sobre os contos tradicionais sufis, taoístas, judeus, budistas e hindus!

Ver a obra: "Sabedoria dos Contos", ed Pergaminho, 2006.

RAMIRO CALLE (1943) - mestre de yoga e escritor espanhol

"Os Melhores Contos Espirituais do Oriente", ed. A Esfera dos Livros, 2006.

Ramiro Calle também aderiu ao interesse terapêutico dos contos orientais. Tem feito inúmeras viagens à Índia e à Ásia. Para, conforme ele diz no prefácio desta obra, ir compilando estes contos.

Dos cerca de 1000 que reuniu, seleccionou os que achou melhores e mais instrutivos. A cada um desses contos, acrescenta um comentário, deixando em aberto que os leitores formulem também os seus.

IX - OS CONTOS TRADICIONAIS EM ÁFRICA

E sobre a ÁFRICA - sobre a Cultura Tradicional do imenso CONTINENTE AFRICANO?

Nada sei...

Porquê?

Não faço a menor ideia... Talvez efeito de alguns estereótipos que adquirimos na infância... Talvez porque nunca vi nada tão específico nas livrarias...

Apenas conheço os dois livrinhos que indico em seguida, e que comprei em circunstância especiais:

O primeiro, quando orientava estágios para professores de Francês, nos anos '70: A embaixada de França, nessa época, colaborava com o Ministério da Educação, e no âmbito dos seminários que promovia, havia pequenas feiras de livros;

O segundo, quando estive a dar aulas de Português e Cultura Portuguesa, em Johannesburg, nos anos '90: Houve uma pequena feira de livros no colégio onde eu trabalhava, e aí o comprei. Mas nessa época, eu não dominava a língua inglesa, e tinha que consultar o dicionário, palavra por palavra... E desanimei...

= CONTES DU ZOUGOULOUGOUBAMBA, coligidos por Giselle de Goustine

Edtion Didier, collection Lire et savoir, 1965

= TALES OF MUGANIRE, by Jane Meiring; Daan Retief Publishers; Pretoria, 1992

No entanto, começam a aparecer algumas apresentações de contos tradicionais africanos no mercado livreiro.

X - PARA TERMINAR

1- Quais as palavras mágicas que nos dão entrada ao reino da Fantasia?

ERA UMA VEZ ...

NO TEMPO EM QUE OS ANIMAIS FALAVAM...

2 - CONTOS e CANÇÕES - A MÚSICA TRADICIONAL

A par dos CONTOS TRADICIONAIS, contados em PROSA, há CANÇÕES tradicionais, cujos poemas são ingénuas narrativas rimadas.

A primeira recolha, em Portugal, foi feita no "ROMANCEIRO", por Almeida Garrett (1799-1854) , Poeta e Dramaturgo do período do ROMANTISMO.

E há, como não podia deixar de ser, as canções de amor tradicionais, com a sua Poesia e sua Música.

Em Portugal, foi muito importante a acção desenvolvida pelo compositor, pianista, musicólogo e maestro, FERNANDO LOPES GRAÇA (1906-1994). Ele e seu colega e amigo, o musicólogo MICHEL GIACOMETTI (1929-1990), fizeram ampla recolha da Música Tradicional portuguesa.

*

No capítulo 21-A - " Realismo Mágico " - Faço menção aos Contos Tradicionais, e à importante função que têm desempenhado em tempos de crise... de crises sociais... Como elementos de coesão! E de encorajamento! Nesse capítulo recordo como as canções tradicionais foram importantes na resistência à Ditadura Salazarista, em Portugal.

E agora, a propósito, embora um pouco fora do âmbito deste capítulo, recordo como os Judeus da Península Ibérica, expulsos do Portugal e da Espanha do século XV, levaram consigo a sua Língua, tradições, e Canções ... que conservaram ao longo dos séculos, não deixando esquecer nem a sua Língua original nem as suas canções, nesses seus novos países de acolhimento! Elas (língua e canções) funcionaram como elemento de coesão, mantendo-os unidos enquanto "povo" deslocado e desenraizado... E há testemunhos de que nos terríveis campos de concentração nazis, eles entoavam as suas canções ancestrais no momento final em que encaravam a morte...

Como elemento de coesão, podemos recordar igualmente, a poesia da poetisa galega - ROSALíA DE CASTRO (1837-1885), que no século XIX, numa época em que a sua Língua – o Galego – estava proibida pelo estado espanhol, escreveu os seus poemas na sua Língua nativa. A força da sua poesia residia na simplicidade da sua composição, muito próxima da poesia tradicional peninsular.

*

A concluir, deixo apenas esta ideia de que os Contos Tradicionais não são "histórias da carochinha". São muito mais, vão muito para além das histórias contadas às crianças à maneira de Perrault.

Mas é bom reconhecermos que as tradições contêm valores que o mundo global e sua filosofia põem em risco... É bom analisarmos com que fim isso é feito...

Por outro lado, recordo uma história que li na infância - "O Coelhinho Verde" (2). Na altura, referi que a autora, Virgínia de Castro e Almeida (1874-1945), usou a estrutura e ingenuidade dos contos tradicionais, para produzir um "conto infantil" de sabor tradicional... mas onde fazia propaganda da "moral" vigente na Ditadura...

As coisas existem, e estão ao alcance de todos. O segredo está no campo que escolhemos.

*

Para realmente terminar esta série de estudos, refiro que tratei apenas da TRADIÇÃO EUROPEIA.

Ficaram de fora as tradições de OUTRAS CULTURAS, de outros CONTINENTES geográficos. Espero que alguém o faça, com a mesma paixão!

XI - Informação bibliográfica:

Consultei a Wikipedia para todas as datas mencionadas ao longo deste artigo, assim como alguma breve menção biográfica sobre alguns dos autores mencionados.

Quanto ao mais, toda a Bibliografia informativa consta, em grande parte, dos preciosos PREFÁCIOS das obras aqui mencionadas.

Finalmente, para terminar "com chave de ouro", agora mesmo, ao visitar uma das tabacarias onde costumo comprar revistas, vejo que acaba de sair uma publicação preciosa, da revista Le Point:

" Le Point - Références - de Perrault à Grimm, d'Anderden à Disney -/- Les secrets des contes -/- Cendrillon, Peter Pan, Blanche-Neige, Pinocchio, Le Petit Chaperon rouge..." __ Juin-Juillet- Août-2023" - como sempre, a revista contém textos comentados.

XII -

Agora, ao concluir este capítulo, apercebo-me de que já publiquei vários textos sobre este mesmo tema - embora sob diferentes perspectivas!

E, finalmente, apercebo-me, também, de que todos estes capítulos dizem respeito à TRADIÇ\AO EUROPEIA.

Os capítulos que menciono em seguida - completam-se entre si, e poderão ter, como título englobante:

Estudos sobre a TRADIÇÃO ORAL europeia

4.1 - Notas sobre a TRADIÇÃO ORAL

4.2 - As FÁBULAS. A ARTE das fábulas - o RIDÍCULO e a PERSONIFICAÇÃO.

A CRÍTICA SOCIAL - A origem das Fábulas - o "Panchatantra"

4.3 - Outras formas da Tradição Oral:

As LENDAS. As LENDAS na História da Cultura

4.4 - Os MITOS

7 - MIGRAÇÕES do Saber - A difusão do Conhecimento e da Fantasia

21 - O Conto Tradicional

21-A - O Realismo Mágico

___________ NOTAS:

(1): Em Português europeu, a palavra "rapariga" significa "jovem de pouca idade", em geral pode ser uma jovem na adolescência ou em idade posterior mas ainda muito nova;

Esta palavra, em Português europeu, não tem o sentido pejorativo que em geral tem, no Brasil.

(2) Secção "Análise de Obras", em 14 - 05 - 2018: "O Coelhinho Verde".

************

Myriam

5 de Julho de 2023

Juntei mais alguns investigadores, e a menção aos dicionários,

em 21 de Julho.

Myriam

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 05/07/2023
Reeditado em 23/07/2023
Código do texto: T7830196
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2023. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.