20 - COMO COMEÇAR A ESCREVER?

Um Amigo propõe-me esta questão:

Como começar a escrever?

Devo confessar, em primeiro lugar, que... não sei responder...

Como de facto, por mais que pense, não sei responder a esta questão,

vou começar pela minha experiência pessoal...

Assim, recordo que, quando eu tinha uns 14 ou 15 anos, uma prima minha, bastante mais velha do que eu, ofereceu-me o “Diário de Anne Frank” como prenda de natal. Oh, como isso já vai longe... foi no natal de 1959...

Eu adorei observar como aquela menina da minha idade tinha sabido descrever a sua vida de refugiada escondida num sótão, durante aqueles anos em que ela e a família ali conseguiram sobreviver... E como ela foi desenvolvendo a sua capacidade de analisar os comportamentos de quem a rodeava... e os seus próprios sentimentos!

Então, comecei a escrever o meu próprio diário!

Mantinha-o fechado à chave, na minha secretária...

Por vezes, voltava a ler páginas que iam ficando antigas... E isso ajudava-me a rever os acontecimentos que ia narrando, e ajudava-me a ampliar algumas das minhas narrativas...

PENSO que foi aí que eu comecei a perceber o mistério da ESCRITA – nem sempre sai tudo bem à primeira redacção...

TORNA-SE NECESSÁRIO voltar atrás, RE-LER o que foi escrito, SENTIR as possíveis LACUNAS que possam impedir a CLAREZA de uma dada narrativa...

I parte:

1º - Todos temos que ter AUTO-CRÍTICA!

Quando acabamos de escrever – seja o que for: um conto, uma crónica, etc: Parece-nos que está tudo bem!

E até está, com certeza!

MAS:

A nossa primeira apreciação é feita de SATISFAÇÃO. Ficamos felizes porque da nossa cabeça saiu qualquer coisa nova, qualquer coisa que nós inventámos!

É uma satisfação muito boa, muito legítima!

2º - MAS:

Para realmente apreciarmos o nosso texto:

É bom deixarmos passar um tempo! Pode ser uma semana, mas também poderá ser mais... talvez um... dois meses! O tempo necessário para ESQUECERMOS o que foi que escrevemos!

Então, acontece que, quando voltamos a ler esse último texto, estamos a lê-lo já SEM aquela EMOÇÃO inicial, sem aquela emoção da surpresa-e-satisfação de termos escrito um texto novo, seja ele uma história nova ou mais uma crónica...

2.1- Aí, a nossa ATENÇÃO desperta! E começamos a ver o nosso texto com DISTANCIAMENTO!

Quer dizer: começamos a perceber que o nosso texto tem algumas LACUNAS, percebemos que FALTAM alguns PORMENORES...

3- O que poderemos fazer?

Vamos aos nossos conhecimentos de Teoria Literária, e perguntamo-nos:

O QUE É QUE ME FALTA AQUI?

E voltamos sempre às tais regras de QUINTILIANO de que já temos falado...

(estão em Teoria Literária, logo a iniciar, no capítulo 1)

3.1:É evidente que:

Não temos que apresentar o nosso texto (conto ou romance) seguindo a mesma ordem daquelas regras!

MAS, as respostas àquelas questões deverão ser dadas ao longo do nosso texto!

3.2 NO ENTANTO, há CONTOS ou ROMANCES que têm o seu atractivo ao deixarem os Leitores num CLIMA de MISTÉRIO:

Então, se nós NÃO QUISERMOS que o Leitor saiba TUDO, nós NÃO daremos as informações todas! MAS nesse caso, temos que saber QUAIS as informações que daremos ao Leitor, em que pontos da narrativa é que as daremos, e quais as que NÃO daremos!

4. CONCLUSÃO:

Um CONTO, ou NOVELA, ou ROMANCE:

Não é bom considerá-lo logo terminado!

É conveniente darmos um tempo!

E depois, calmamente, voltamos a lê-lo, e começamos a DESCOBRIR que faltam algumas informações...

QUEM é esta personagem?

DONDE é que ela surgiu? ONDE é que "eu" a conheci?

O QUE FOI que ela FEZ? e QUANDO? e PORQUÊ?

4.1- Claro que, cada escritor é que saberá como irá dar aos seus Leitores essas informações, ou sugestões! Cada escritor é que saberá COMO ORGANIZAR a sua própria narrativa!

5- É por isso, também, que será bom LER muito!

LER os grandes autores da Literatura - desde os grandes autores RUSSOS, INGLESES, FRANCESES, ALEMÃES, ESPANHÓIS, ITALIANOS! Ou seja, os grandes autores Europeus... E, obviamente, há mais Literaturas notáveis - a Literatura Chinesa, a Japonesa... As literaturas do Norte da Europa As literaturas Indianas...E, actualmente, as Literaturas das antigas colónias europeias francesas, inglesas, espanholas, portuguesas - Bem como os autores das Literaturas emergentes nos EE UU, no BRASIL, etc... Sobretudo, para os principiantes, começar a ler os autores a partir do século XIX... (1)

E claro, ainda quanto ao século XIX, não esquecer os nossos grandes autores de PORTUGAL e do BRASIL!

5.1 Para mais facilmente ampliar o leque de leituras, haverá que recorrer às bibliotecas públicas!

5.2 – Como ler esses grandes autores?

Tenho deixado várias sugestões de COMO LER, com muitos elementos para APRECIAR os grandes romances dos grandes escritores - nos vários artigos que vou deixando aqui, no Recanto das Letras: em Teoria Literária, e em Análise de Obras:

Além disso, felizmente, há imensa informação na Internet.

Há artigos muito bons, tanto nos 'sites' brasileiros como nos 'sites' portugueses.

Por exemplo:

Escolho um romance de... Ungulani Ba Ka Khosa

Vamos supor que não sei de quem se trata, que não sei quem é este autor:

Vou ao Google e procuro por este nome: Ungulani Ba Ka Khosa:

E, a começar pela Wikipedia, encontro muita INFORMAÇÃO sobre este escritor! Sobre a sua obra!

Assim, quando vou ler uma sua obra, já vou informada sobre os pormenores a que devo dar mais atenção! É evidente que para além da informação recolhida, toda a apreciação das nossas leituras ficará ao nosso critério!

5.3: Na minha opinião:

É bom começar pelos escritores do século XIX e primeira metade do século XX!

PORQUÊ?

Porque têm um ESTILO

e

uma LINGUAGEM

organizados LOGICAMENTE...

E a NARRATIVA, assim, é mais acessível aos Leitores!

A partir, sensivelmente, da segunda metade do século XX, os Escritores começam a fazer as suas NARRATIVAS de forma mais INOVADORA, e cada um escolhe o seu ESTILO e o seu RITMO NARRATIVO conforme mais lhe agrada!

E eu penso que para quem está a começar, essa INOVAÇÃO poderá trazer algumas dificuldades à leitura dos principiantes...

...Claro, poderei estar enganada... Mas é a minha opinião...

II

Quando eu era estudante na Faculdade, na primeira metade da década de ’60, do século XX, surgiu a TEORIA de que não interessava saber NADA sobre os AUTORES nem sobre a sua ÉPOCA.

Nós, enquanto estudantes, não deveríamos demonstrar que tínhamos procurado informação sobre os Autores dos romances que estavam em estudo...

...E um dos argumentos era que nós, leitores, não podemos saber o que um dado autor quis dizer... não podemos saber o que lhe passava pela cabeça...

Só interessava a OBRA, o ESTILO, a LINGUAGEM...

Felizmente, e finalmente, essa “moda” passou.

É útil procurarmos informação sobre a ÉPOCA em que um dado escritor viveu. A ÉPOCA explica, em parte, as razões pelas quais um escritor escolhe os seus TEMAS, ou alguns dos seus temas.

Do mesmo modo, procurar informação sobre a BIOGRAFIA do escritor cuja obra queremos estudar e compreender, também pode fornecer dados importantes sobre a escolha dos TEMAS que lhe interessaram.

Na época conhecida como NEORREALISMO, que sensivelmente corresponde ao início da segunda metade do século XX, muitos autores Portugueses escolheram temas que DENUNCIAVAM as arbitrariedades do Poder, nesse tempo; criavam histórias inspiradas na triste REALIDADE dos CAMPONESES ou dos PESCADORES explorados no seu dia-a-dia de trabalho...

Em Portugal, há grandes escritores desse tempo, a provar que de facto a ÉPOCA pode explicar a escolha e a aceitação – mais ou menos generalizada – de um certo tipo de TEMAS!

Esses autores tiveram a coragem de arriscar a sua liberdade e bem estar – e apesar dos riscos de prisão política, criaram histórias profundamente inspiradas na triste realidade portuguesa dos anos ’40 e ’50, por exemplo!

Do mesmo modo que actualmente, agora que as circunstâncias sociais e políticas mudaram, há uma corrente que desvaloriza os autores desses tempos e as histórias que eles criaram...

Quer dizer, ninguém vive alheado das preocupações do seu próprio tempo!

E é conveniente os Estudantes de Literatura terem presente essa necessidade de conhecer qual foi o CONTEXTO HISTÓRICO em que se enquadrou a vida e a OBRA de cada Escritor.

III

Nunca esquecer, ainda, que as Tradições, e a Literatura Oral têm sido sempre grande fonte de inspiração!

IV

Sobre a etapa final da redacção de um texto, ou seja - sobre a AUTO-CORRECÇÃO, deixo o capítulo seguinte: o capítulo

_______ NOTAS:

(1) É lamentável que surjam poucas traduções...

ENFIM;

Penso que estou a ajudar...

Myriam

4 de Agosto de 2022

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 24/06/2023
Reeditado em 24/06/2023
Código do texto: T7821298
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