5- Como surgiu o Romance. O Herói. O apoio da ARTE (o desenho) e da MÚSICA

Já vimos que desde sempre o Ser Humano apreciou as NARRATIVAS.

Já vimos que as narrativas passavam de geração em geração, e que essa passagem de narrador em narrador, havendo diferentes narradores que viajavam de terra em terra, provocava alterações nas narrativas!

Já vimos que muitas vezes, as narrativas eram gravadas em baixos-relevos, ou na base das estátuas, de modo a recordá-las aos seus espectadores.

Tanto havia narrativas de LENDAS, como de FEITOS HERÓICOS, como de MITOS.

Uma inscrição que havia no Museu de Arqueologia, em Lisboa, dizia que o CULTO DOS HERÓIS começou no Calcolítico – ou seja, ainda antes da Idade do Bronze.

A. A ORIGEM da narrativa remonta à epopeia de Gilgamesh, na MESOPOTÂMIA. Uma história que remonta a tempos tão recuados como 2.000 aC. (1)

Como raríssimas pessoas sabiam ler, o rei mandou fazer baixos-relevos nas paredes do seu palácio, contando os feitos heróicos de Gilgamesh – mas protagonizados pela sua pessoa.

É, digamos, a primeira 'banda-desenhada' que conhecemos!

Mas esta narrativa não tem emoção.

B. Quem primeiro deu emoção à narrativa, foram os GREGOS.

Os conhecidos poemas “ODISSEIA” e “ILÍADA”, por exemplo, remontarão à Idade do Bronze, mas só foram registados por escrito, já no século III dC (2).

Há que recordar os seguintes pormenores importantes:

= Essas narrativas eram em verso, eram POEMAS – longos poemas.

= Como essas narrativas referiam feitos heróicos, dizemos que são POEMAS ÉPICOS.

= Em geral, a personagem principal desses textos era o “herói” – que tinha que ser uma “personagem tipo”, ou seja, tinha que ser um ser-modelo, em ser-exemplar. Nos tempos recuadíssimos em que vigorou esta CULTURA ORAL, os heróis eram MODELO para a educação dos jovens!

= Os “heróis” eram favorecidos pelos Deuses! Cada um dos Deuses favorecia o herói da sua simpatia, da sua predilecção! Por seu lado, o herói tinha que merecer o favor dos Deuses protectores! (3)

= Para engrandecer os factos narrados, estes eram valorizados ao máximo, eram contados com grandes doses de exagero. E ao passarem de terra em terra, de narrador em narrador, de geração em geração, os exageros atingiam dimensões fantásticas. É isso que aos nossos olhos actuais faz o encanto e o fascínio desses antiquíssimos textos! Por exemplo:

= O episódio do “cavalo de Tróia”. O poema diz que os assaltantes GREGOS construíram um enorme cavalo de madeira, e que se esconderam lá dentro... MAS muito provavelmente, não terá sido bem assim... Muito provavelmente os assaltantes, num truque manhoso, simularam a retirada e deixaram alguns dos seus vulgares carros de guerra “esquecidos”, mas bem tapados, junto à fortaleza da cidade sitiada de Troia... Aí, poderemos dizer que a curiosidade matou o rato: os Troianos foram ver os carros, e pensando que poderiam guardá-los como despojos, meteram-nos intra muros... Depois, todos sabemos que foram terrivelmente surpreendidos pelos invasores...

C. O NASCIMENTO do ROMANCE na Cultura Europeia

Na Cultura Europeia, depois da queda do império Romano, já nos tempos da formação dos países actuais, os poemas épicos são – como hei-de-dizer? – são mais “modestos”... Então, já não falamos de Poemas Épicos, mas sim de CANÇÕES DE GESTA.

Seja como for, as CANÇÕES DE GESTA também narram factos heróicos de heróis guerreiros.

E também partilham das características acima referidas, nomeadamente o facto de continuarem a ser NARRATIVAS de TRANSMISSÃO ORAL, e o exagero em relação aos factos narrados. É exemplo desse exagero a conhecida “Chanson de Roland”, um poema francês do séc XI dC.

Com o passar de alguns séculos, as narrativas simplificaram-se:

= Por um lado, passam a ser em PROSA;

= Por outro lado, passam a ser registadas em LIVROS.

Ainda não em “livros” como hoje temos. Mas sim em rolos de pergaminho, ou já em papel, mas com escrita manuscrita. Conforme já dissemos no capítulo 2, o livro impresso só surge no século XV, com GUTENBERG (1400-1468). A sua famosa BÍBLIA só foi impressa por volta de 1455:

A descoberta da IMPRENSA revelou-se uma das mais democráticas revoluções culturais na História da Humanidade! Progressivamente, o CONHECIMENTO, a ARTE, a FILOSOFIA, foram ficando cada vez mais ao alcance de todas as pessoas! Não admira, pois, que os Poderes dessa época, e épocas posteriores, tivessem tanta raiva e ódio aos “livros”, e às “pessoas letradas”! Pois a disseminação da capacidade de ler, levava a uma crescente capacidade de contestação e consequente diminuição dos seus poderes.

Essa desconfiança ainda hoje, nos nossos dias, permanece. Vemos como os regimes totalitários fazem guerra à Cultura, à Educação...e aos livros. Em Portugal, tivemos um triste e trágico exemplo deste facto, durante um período de cerca de 48 anos, antes da Revolução dos Cravos de 1974. Parece pouco... Mas esse quase meio século foi o bastante para conservar o País na ignorância vivida nos séculos anteriores...

D. O HERÓI e o ANTI-HERÓI

Ainda hoje, ao referirmos a PERSONAGEM PRINCIPAL de um romance, de um filme, ou de uma novela-televisiva, falamos de “HERÓI”.

Mas também há o inverso:

A personagem principal pode ser um mau carácter, e aí falaremos de “ANTI-HERÓI”. Mas esse tema ficará para mais tarde!

E. A MEMÓRIA e a MÚSICA

Para terminar, perguntaremos:

O que faria com que uma história não se perdesse?

Há muitos anos, num canal cultural da TV, vi como Sir Richard Attenborough desvendou esse mistério:

Ainda como jovem investigador, Richard Attenborough fazia reportagens junto de tribos de aborígenes australianos.

Viu as pessoas a pintar, pois esses povos nativos da Austrália são grandes pintores. Têm cavernas pintadas.

À medida que eles pintavam, Sir Attenborough ia-lhes perguntando o significado das imagens pintadas.

Até que os pintores chegaram a um ponto em que o autor da pintura não revelou o seu significado. Por fim, respondeu-lhe ao ouvido: “É segredo…”

Como o jovem Richard Attenborough insistisse em querer saber, o pintor disse-lhe que comparecesse ali, ao amanhecer.

E ao amanhecer, lá estavam os homens da tribo (se havia mulheres, não me recordo) a CANTAREM a história que antes tinham gravado através da pintura.

F. O que de facto fazia PERPETUAR UMA HISTÓRIA, era a MÚSICA!

Tal como no cinema – onde a música é fundamental para sublinhar a ACÇÃO que vemos desenrolar-se no ecrã e reforça a nossa emoção de espectadores!

Também nos seus primórdios, a MÚSICA fez parte da Criatividade humana!

Desde os seus primórdios, o ser humano foi ARTISTA na ARTE, na CRIATIVIDADE NARRATIVA e na MÚSICA!

Informação complementar:

(1) – O que é a Epopeia de Gilgamesh?

https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/historia/o-que-e-epopeia-gilgamesh.htm

(2) - VER jornal Público, de 11 de Julho de 2018 – “Foi encontrado o mais antigo extracto da Odisseia de Homero”

https://www.publico.pt/2018/07/11/culturaipsilon/noticia/extracto-da-odisseia-de-homero-encontrado-na-grecia-1837612

“Placa de argila escavada em Olímpia contém 13 versos do poema. Os arqueólogos acreditam que pode datar do século III d.C..”

(3)- RITOS E CRENÇAS RELIGIOSOS NAS GUERRAS ANTIGAS dos Hebreus

https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/principia/article/viewFile/7681/5545

© Myriam Jubilot de Carvalho

2020

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 28/11/2020
Reeditado em 01/12/2020
Código do texto: T7122795
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