ENXUGANDO GELO

Prólogo

Entre um devaneio e outro, quando escrevo, às vezes, tento ensinar um pouco do que sei sobre o nosso complexo idioma pátrio. Executo essa tarefa como se fosse um professor, mas na verdade sou tão aluno e tenho tantas dúvidas, ainda, quanto quaisquer outros estudantes e/ou autodidatas, curiosos, concurseiros e afins.

Mas tenho uma certeza: Sem dormir menos e estudar mais não haverá chances de êxitos em quaisquer certames. Aquele que se submete a participar de um concurso sem se preparar, infelizmente, se assemelha ao trabalho inútil de enxugar gelo.

O tema “ENXUGANDO GELO” faz sentido porque é exatamente essa a sensação sentida ao tentar ensinar, a quem teima em pensar, falar e escrever numa linguagem coloquial tão prejudicial, não apenas num concurso, mas sobretudo ao progresso sociocultural.

“Enxugar gelo” significa insistir em algo inútil, mas sendo eu um recalcitrante... Prossigo na difícil missão e de lucro sempre estou aprendendo um pouco mais.

ENCONTRANDO UMA VELHA AMIGA

Fazia algum tempo que eu não encontrava a doce amiga Vanessa Santos. Por puro acaso nos encontramos numa fila de uma agência, na CEF, numa segunda-feira, apinhada de pessoas, em pleno pico da pandemia, para receberem a primeira parcela do auxílio emergencial do governo.

Ambos, Vanessa e eu, fomos pagar os IPTU de nossos imóveis. Uma atendente da CEF se aproximou e ao perguntar nossos propósitos nos orientou para efetuarmos os pagamentos por meio dos aplicativos dos celulares. isso seria mais fácil e menos trabalhoso.

Acatamos a orientação. Saímos da enorme fila e fomos a uma confeitaria para tomarmos um lanche e mantivemos um prazeroso diálogo próprio entre bons amigos. Aliás, entre mim e Vanessa não existe abismo cultural, mas sim afinidade social e espiritual.

O DIÁLOGO ENTRE MIM E VANESSA

O notável leitor (a) já deve ter escutado ou visto escrito frases do tipo: "Gostaria que o assunto ficasse entre eu e você!" — Cuidado! O correto é: "entre mim e você". Portanto, ENTRE MIM E VANESSA é o correto. — (N. do A.).

— Você não mudou nem um pouco desde a última vez em que nos encontramos em João Pessoa, PB, em 2009. Está mais jovem, a pele aveludada, fresca; mais magra... O que andou fazendo? — Não sou hipócrita, mas essa foi a única forma encontrada de iniciar um diálogo.

— Mudei sim. Mudamos a cada dia, a cada mês e ano. Passei alguns aperreios conjugais e financeiros de 2010 a 2018. Nesse tempo perdi um filho com 18 anos por acidente de moto, separei-me do marido ogro, perdi dinheiro; as amigas se afastaram, as oportunidades sumiram e tudo isso causou-me uma depressão profunda. — Estaria minha linda amiga se vitimizando? — Pensei com receio de ter perdido algo irrecuperável.

— Quer conversar sobre isso noutra ocasião? Podemos marcar local, um dia e horário? Ainda mora em João Pessoa? — Confesso que tentava fugir da conversa tendenciosa ao sofrimento espiritual, mas talvez eu pudesse ser de alguma forma útil. Quem sabe?

— Pode ser. Vamos lanchar e depois marcamos. Atualmente resido na Rua Campos Sales, Bairro de José Pinheiro, aqui mesmo em Campina Grande. Me diga... (SIC) Como você está? Esses cabelinhos grisalhos lhe dão um ar de bondosa sabedoria. Os olhos continuam claros e a boca mais insinuante do que nunca (risos).

— Você é minha amiga e estas palavras elogiosas não valem. Você continua fazendo concursos públicos? Já foi aprovada em algum? — Tentei desviar a conversa afagando-lhe o pescoço fino, por trás, e sob os cabelos rebeldes.

— Estou com quase cinquenta anos e continuo tentando. Posso? Acha que estou enxugando gelo? Já estou ficando indiferente, sem fé; vejo mulheres mais jovens sendo aprovadas em concursos e eu nem sequer sou classificada. Preciso de uma dica. Pode me ajudar?

— Você sabe que aos dezenove anos eu participei de um concurso para a Escola de Sargentos das Armas — (EsSA), de abrangência nacional, sendo composto por verificações de requisitos intelectuais, de saúde, físicos, psicológicos e documental.

Nesse certame fui candidato único aprovado na cidade de Campina Grande, PB. Não sou um superdotado com Quociente de Inteligência — (QI) acima da média, mas usei uma estratégia.

Apenas dormi menos e estudei mais do que devia para superar minhas dificuldades. — Com essas palavras eu já estava passando uma dica (dormir menos e estudar mais) valiosa para a amiga ansiosa e viciada em onicofagia. Percebi isso ao olhar, de soslaio, as unhas roídas das mãos.

— Mas eu sempre estudei! Talvez esteja estudando errado, mas estudo sim. — Foi nesse momento que percebi ela tentando esconder a mão esquerda por baixo da bolsa de cor lilás muito bonita. Para disfarçar resolvi fazer uma brincadeira com a amiga Vanessa.

— Preste bastante atenção à pergunta que vou fazer. Onde você vai depois do lanche nessa confeitaria? — Perguntei cometendo dois erros propositais na frase interrogativa.

— Vou para minha casa. Na Rua Campo Sales, em José Pinheiro... Por quê?

— Você percebeu os dois erros gramaticais na minha pergunta?: “Onde você vai depois do lanche nessa confeitaria?”.

— Não. Confesso que não. — Respondeu ajeitando os cabelos por trás da orelha direita a apreensiva e sofrida amiga.

— Entre outros, este é um problema de desatenção. Eu deveria ter perguntado: “Aonde você vai depois do lanche nesta confeitaria?”. A diferença entre “onde” e “aonde” é uma questão de regência. Na frase, o verbo “ir” tende a exigir a preposição “a”; portanto, quem vai, vai a algum lugar.

NESSA: Usa-se quando aquilo que está sendo demonstrado está espacialmente distante. Ou quando o objeto/situação sobre que se fala se refere ao passado.

NESTA: O pronome demonstrativo ‘nesta’ deverá ser usado quando aquilo que está sendo demonstrado está espacialmente próximo da pessoa que fala.

Ora, nós estamos dentro da confeitaria. Portanto, o pronome demonstrativo ‘nesta’ é o mais adequado para a supracitada frase interrogativa. — Fiz um ar de riso e afaguei as madeixas esbranquiçadas da amiga embevecida, talvez extasiada.

— Adoro seu ar professoral. Sinto-me cansada, velha e despreparada para competir com os mais jovens. Você tem razão. Preciso ser mais estudiosa. Mais observadora. Mais exigente comigo mesma. Dormir menos e estudar mais! Tudo como você sempre me dizia e disse ainda há pouco.

UMA PAUSA NO DIÁLOGO PARA ESCREVER SOBRE A COBIÇADA CARREIRA PÚBLICA

Ingressar na carreira pública é o sonho de muitas pessoas, não importa a idade. Estabilidade, plano de saúde, bons salários são alguns atrativos dessas carreiras. Mas há uma idade mínima e máxima para realizar concursos? Não! O edital ditará as regras do concurso e por isso é fundamental estudar minuciosamente esse documento.

De acordo com a lei 8112/90, a idade mínima para se tornar um servidor é de 18 anos na data da posse. O que quer dizer, que você pode realizar concursos antes dos 18 anos, desde que na data da posse você já tenha 18 anos completos. Quanto a idade máxima, alguns concursos requerem a idade de 65 anos. Porém, na Constituição Federal, no artigo 7º, inciso XXX não prevê uma idade limite.

Artigo 7º “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”.

No entanto, algumas profissões, em função das atividades físicas mais intensas, têm um limite de idade diferente como na Marinha, Exército, Aeronáutica e Área Policial, normalmente para participar desses concursos é preciso ter 18 anos a 29 anos, talvez um pouco mais.

VOLTANDO AO TEMA

Minha amiga Vanessa sabia que sou um eterno aprendiz. Estudo o tempo inteiro e, se resolvesse fazer um concurso, mesmo com a idade avançada, certamente seria aprovado. Mas qual é o meu segredo? Depois da análise do edital eu estudaria um pouco mais as matérias em que estivesse deficitário. Essa é uma excelente dica.

Naturalmente estudo quando leio, escrevo, consulto dicionários; vejo filmes autobiográficos, ouço músicas, escuto pessoas falando, resolvo provas de concursos anteriores. Valorizo sobretudo a linguagem falada e escrita no contexto formal.

Claro que nem sempre é possível estabelecer um diálogo com alguém sem utilizar a linguagem coloquial, mas é preciso ficar atento ao uso dos verbos em seus tempos, desinências e concordâncias. Todo estudante sabe ou deveria saber que nas relações de concordância nominal ou verbal, a desinência é essencial.

Antes de nos despedirmos sem o tão desejado caloroso abraço por causa da medonha e indesejada pandemia, a Vanessa e eu trocamos nossos números de telefones para uso no “WhatsApp” e “e-mail". Tenho Instagram, mas não aprendi o bastante para usar com mais frequência.

Anotei o endereço da amiga e lhe forneci meus endereços residencial e de escritório onde pratico a advocacia e consultoria. Trata-se de um trabalho proficiente, um verdadeiro múnus público, por ser indispensável à administração da Justiça aplicada pelo Poder Judiciário. Prometemos visitar um ao outro.

UMA NARRAÇÃO HILÁRIA COMO EXEMPLO

Certa ocasião recebi a visita de um parente supostamente esclarecido (com o ensino médio completo) em nossa casa. Na hora de servir o lanche o visitante disse: “Passe o salzeiro por favor” — (SIC). Eu não sabia sobre o que ele estava falando e achei estranha a palavra “salzeiro”. Referia-se talvez ao saleiro?

Incontinenti entreguei o saleiro e comentei para ver se ele percebia a correção: “Este saleiro está quase sem sal, mas temos outro saleiro bem mais moderno e abastecido com sal rosa do Himalaia.” — Esse tipo de sal é mais saudável. Tem menor concentração de sódio. Debalde. O visitante não percebeu a correção feita, com sutileza, por mim.

Não quero, com esta narração, tornar sem importância a linguagem coloquial. O problema é que o falante que pronuncia ou escreve “salzeiro”, com um “z” a mais e, portanto, desnecessário, certamente continuará a escrever, quando o fizer, do mesmo modo como fala.

Talvez esse estudante quisesse dizer ou escrever “salseiro” com “s”, mas esse salseiro com “s” não poderia ser, pois significa: Desorganização, bagunça, desarrumação, amontoado e isso não se põe em comida. Claro, ele estava se referindo ao recipiente com sal e, portanto, a um saleiro.

Oh! Idioma pátrio complicado para todos nós brasileiros pouco ou mais antenados (atentos, bem informados.). Creio nisso por análise de muitas redações nas provas do ENEM e outros concursos não menos importantes.

Escrevem-se banalidades, há um completo desleixo com a ortografia. Não se preocupam os candidatos com as partes essenciais de uma redação: Introdução, Desenvolvimento e Conclusão.

CONCLUSÃO

Uma preocupação comum é a daqueles que já estão numa idade mais avançada como é o caso da amiga Vanessa e acreditam que não têm mais possibilidade de realizar concurso público. Mas a verdade é que todas as pessoas são aptas a aprovação, basta ter dedicação, fé, resiliência e bons estudos!

Não existe idade ideal e isso pode ser visto nas listas de aprovados para os principais concursos de todo o Brasil. Em certames concorridos de nível superior, como o da Receita Federal, por exemplo, você vai encontrar desde recém-formados na Graduação com vinte e poucos anos até profissionais de carreiras consolidadas, mais idosos e experientes em outras áreas que decidiram embarcar no mundo dos concursos.

Desde que tenha acesso a boas apostilas, cursos de preparação e videoaulas (cuidado com esta palavra. Vide observação abaixo) qualquer candidato poderá aprender as matérias exigidas no edital.

Dê sempre preferência para matérias direcionadas para concursos públicos, que lhe ensinarão os conceitos mais cobrados e a forma em que elas aparecem nas provas.

OBSERVAÇÃO SOBRE A PALAVRA VIDEOAULA

A forma correta de escrita da palavra é ‘videoaula’, escrita de forma junta. Embora essa palavra não esteja registrada no vocabulário ortográfico da Academia Brasileira de Letras, é possível estabelecer um paralelismo com outras palavras formadas com a palavra vídeo, como videolocadora e videocassete.

_________________

NOTAS REFERENCIADAS

– Textos livres para consulta da Imprensa Brasileira e “web”;

– Assertivas do autor que devem ser consideradas circunstanciais e imparciais.