Teoria e exemplificação da imagética na poesia (e prosa)
O escritor trabalha tanto com aspectos musicais — ritmo e espécie de sons — quanto com aspectos imagéticos — sucessão e qualidade de imagens. Às vezes, esquecemo-nos deste último.
"Alegres campos, verdes arvores, (...)"
Primeiro nos vem à mente a imagem de campos, depois adicionamos a essa imagem os arvoredos. O primeiro adjetivo é alegres — que, por ser abstrato, permite-nos criar uma imagem pessoal —, enquanto o segundo adjetivo, verdes, não nos liberta tanto quanto o primeiro.
"Claras e frescas águas de cristal, (...)"
O adjetivo claras é visual, enquanto o frescas é tátil. Em seguida, de cristal — que é a substância mesma das águas — reforça claras, dando-lhe maior poder imagético. Já se vê que Camões quer que o leitor sinta antes de imaginar, pois os adjetivos, tanto neste verso quanto no anterior, antecedem os substantivos. O melhor exemplo disso é frescas.
"Que em vós os debuxais ao natural, (...)"
A expressão em vós é muito forte, já que estabelece as águas como o fundamento dos campos e arvoredos. Ou seja, não é por meio de vós, mas em vós.
"Discorrendo da altura dos rochedos; (...)"
Esse verso é incrível. Já temos a imagem das águas de cristal, e então ocorre a sucessão discorrer, alto, rochedo. Primeiro imaginamos as águas discorrendo, então olhamos para cima e lá encontramos os rochedos.
Além disso, podemos nos servir de aspectos sonoros para reforçar imagens.
"Bramindo, o negro mar de longe brada,
Como se desse em vão n'algum rochedo."
Em que a repetição do som do r (que golpeia o céu da boca) representa o mar atingindo, repetidas vezes, os rochedos.