Sobre escrever ensaios
Escrever Ensaios - Orientações
1. O que é um ensaio e o que se espera que os alunos mostrem ao produzir um ensaio?
Um ensaio é um texto argumentativo em que se defende uma posição sobre um determinado problema filosófico. Os ensaios feitos por alunos do Ensino Médio, por exemplo, não devem ter mais de 2 páginas (com uma fonte Times New Roman, tamanho 11 e 1,5 de espaço entre linhas), obrigando-os a concentrar-se no essencial e a deixar de lado as meras associações de ideias.
O ensaio deve mostrar que o seu autor sabe relacionar clara e corretamente os problemas, teorias e argumentos em causa. Por isso deve ter a forma de resposta a uma pergunta. Pergunta essa à qual se deve poder responder com um "sim" ou com um "não", procurando o aluno avaliar criticamente os principais argumentos em confronto, de modo a tomar uma posição pessoal na disputa.
Num ensaio, não se pode limitar a dar a sua opinião. Tem também de avançar com argumentos e de responder aos argumentos contrários. Caso não lhe pareça possível defender uma das partes, deverá dizer, de forma argumentada, por quê.
2. Como se deve preparar um ensaio?
Lendo criticamente o pequeno conjunto de leituras indicadas pelo professor (1 ou 2 pequenos artigos ou capítulos de livros) acerca do tema proposto. Nessas leituras devem procurar-se as teses em confronto e os argumentos que as sustentam, bem como a correta compreensão do que está em causa. O aluno deverá guiar as suas leituras tendo em conta a pergunta a responder, pois o objetivo não é fazer um relatório de todos os argumentos e posições apresentadas nas leituras, mas que seja capaz de isolar aqueles que acha mais pertinentes de modo a responder à questão.
3. Como escolher o título do ensaio?
A melhor maneira de intitular o ensaio é apresentar o mais claramente possível o problema que se vai tratar. E a melhor maneira de o fazer é colocar uma pergunta.
Exemplos de títulos de ensaios podem ser:
• Será que quando fazemos juízos morais estamos apenas a exprimir as nossas emoções?
• Será que os animais têm direitos?
• A pena de morte é moralmente aceitável?
• Será que as nossas ações são boas ou más apenas em função das suas consequências práticas?
• Será que todas as obras de arte expressam sentimentos?
• É a existência do mal compatível com a existência de Deus?
Títulos como:
• A moral e as emoções
• Os direitos dos animais
• A pena de morte
• A arte e a expressão de sentimentos
• Deus e o mal
embora possam ser adequados em ensaios mais longos e abrangentes, devem aqui ser evitados pois não parecem obrigar os seus autores a tomar posição nem a ser críticos e argumentativos. Além de que, a tentação de fazer um relatório de tudo o que aprendeu sobre o tema em causa será mais forte perante tais temas.
4. Como se deve estruturar o ensaio?
O ensaio deve ser estruturado de acordo com as seguintes seis fases.
1. Formular o problema e esclarecer de forma rigorosa o que está em causa.
2. Mostrar a importância do problema.
3. Apresentar o mais claramente possível a tese que se quer defender.
4. Apresentar os argumentos a favor dessa proposição.
5. Apresentar as principais objeções ao que acabou de ser defendido.
6. Responder às objeções e tirar as suas conclusões.
Em 1 muitas vezes não basta formular o mais claramente possível o problema para as coisas ficarem completamente claras e não haver margem para dúvidas ou ambiguidades. Temos também de explicar as noções principais envolvidas. Quando, por exemplo, se pergunta se os animais têm direitos, é preciso saber exatamente que direitos são esses e dar exemplos concretos; assim como devemos deixar bem claro se nos estamos a referir a todos os animais (incluindo os piolhos e as baratas) ou só a alguns. Do mesmo modo, quando discutimos se a existência do mal é compatível com a existência de Deus, temos de esclarecer que concepção de Deus temos em mente (se é o Deus dos teístas, dos panteístas, etc., e o que isso significa), pois há diferentes concepções acerca da natureza de Deus; assim como devemos esclarecer de que tipo de mal se está a falar.
Em 2 devemos procurar mostrar por que razão, ou razões, é importante que nos ocupemos do problema de que nos ocupamos. Uma maneira de fazer isso é mostrar o que estaríamos a perder se não o fizéssemos. Se, por exemplo, nos perguntamos se é imprescindível estudar lógica formal em filosofia e a nossa resposta à questão for afirmativa, então devemos mostrar que, se não o fizermos, não só nos arriscamos a cometer erros de raciocínio, mas também a não compreender os raciocínios dos outros.
Em 3 devemos apresentar a nossa posição. Isso deve ser feito mostrando qual é a proposição que irá ser defendida. Por exemplo, em relação ao problema de saber se a existência do mal é compatível com a existência de Deus, e caso a nossa resposta seja afirmativa, podemos tornar clara a nossa posição começando por dizer que defendemos a proposição "Deus existe, apesar de existir o mal no mundo" e explicar sucintamente o que isso significa. Em certos casos é possível e desejável apresentar exemplos do tipo de ideias que queremos defender.
Em 4 devemos apresentar cuidadosamente os argumentos a favor da proposição que queremos defender. Pode haver vários argumentos. Alguns deles podem até ser argumentos tradicionais, discutidos por alguns dos mais destacados filósofos. Nesse caso devemos concentrar-nos apenas nos dois ou três que nos parecem ser os mais fortes e expô-los por palavras nossas, tentando mostrar que são válidos e que as suas premissas são verdadeiras ou, pelo menos, que são bastante plausíveis.
Em 5 devemos enfrentar as principais objecções aos nossos argumentos (quer indicando possíveis contra-exemplos ao que é afirmado em alguma das premissas, quer disputando a sua plausibilidade ou até a validade dos próprios argumentos). Devemos procurar as objecções que nos parecem mais fortes e não escolher apenas as mais fracas e fáceis de responder. Nesta parte devemos apoiar-nos nas leituras que nos foram previamente recomendadas. Devemos também aqui apresentar as objecções por palavras nossas e não limitar-nos a citar os autores consultados, pois só assim mostramos compreender o que escrevemos.
Em 6 devemos dizer o que há de errado com as objeções avançadas anteriormente ou como lhes responder. Um aluno que defenda num ensaio o direito ao aborto, por exemplo, sem responder aos argumentos contrários ao aborto presentes nas leituras dadas pelo professor, exibe um deficiente domínio da dialética filosófica; é preciso que o aluno compreenda que tem de entrar em diálogo com as ideias e argumentos que leu. Devemos terminar resumindo muito brevemente o nosso argumento principal e expor as nossas dúvidas, caso existam (mesmo que nos inclinemos mais para um dos lados).
5. O que se avalia num ensaio?
O professor não procura saber se o aluno concorda ou não consigo. O que procura saber é, em termos gerais, o seguinte:
• Qual é o grau de compreensão dos assuntos por parte do aluno?
• Que qualidade têm os argumentos que oferece?
• A redação é clara e bem organizada?
Mais detalhadamente, o professor verifica se os seguintes critérios são satisfeitos:
• o problema em causa é clara e corretamente formulado
• a importância do problema é claramente mostrada
• a tese defendida é óbvia para o leitor
• os argumentos utilizados são bons e não há falácias evidentes
• apresenta os principais argumentos contrários à tese defendida de forma caridosa
• responde aos argumentos contrários
• apresenta as ideias de forma pessoal (utilizando palavras suas e os seus próprios exemplos)
• a estrutura do ensaio e as ideias nele apresentadas são claras para o leitor
Orientações em parte baseadas em:
Aires Almeida e António Paulo Costa, A Avaliação das Aprendizagens em Filosofia, DES
(http://w3.des.min-edu.pt/download/ac/aval_aprend_filosofia.pdf)
A. P. Martinich, Philosophical Writing: An Introduction, Backwell, Oxford, 1998 James Pryor, Como se Escreve um Ensaio em Filosofia (http://www.criticanarede.com/fil_escreverumensaio.html)