O privilégio aletológico
O texto ficcional dá-nos muitas vezes a sensação confortável e prazerosa de que estamos inseridos numa realidade indiscutível, onde todos os valores, contextos e ações são aceitos por nós de uma forma natural. Isso, faz com que procuremos muitas vezes essa dimensão que pode funcionar como uma espécie de válvula de escape do mundo real, em que muitas vezes não conseguimos satisfazer-nos de uma forma plena, segura e objetiva. Umberto Eco definiu esse fenômeno como "privilégio aletológico".
Esse privilégio, para além de garantir ao leitor o acesso a um mundo interessante e desejado, teria a capacidade também de funcionar como uma espécie de filtro nas leituras, em que aqueles conteúdos que não apresentassem parâmetros cabíveis de veracidade seriam automaticamente rejeitados ou colocados em questão. Assim, tudo funcionaria através de questionamentos produzidos por comparação entre realidades agregadas em textos ficcionais. Como exemplo, poderíamos supor um texto que contasse a história de uma viagem humana de descoberta do planeta Marte. Se nessa narração ficcional os astronautas desembarcassem no solo do planeta sem equipamento de proteção, automaticamente o leitor questionaria a construção (interpretação forçada) desse texto de ficção.