O CACOETE DA CONDENAÇÃO À POESIA
O escritor de textos curtos que pretender encontrar-se com a Poética, necessita ler e refletir sobre centenas ou milhares de poemas que contenham os elementos identificadores do gênero. Enfim, precisa tomar contato com a Poesia, seus meandros e sortilégios. Tomar conhecimento das escolas do verso clássico e da contemporaneidade; dos costumeiros e usuais formatos; dos recursos identificadores e/ou características marcantes de autores consagrados em cada período do itinerário da humanidade e de seu amadurecimento, afim de poder entender o registro através dos signos estéticos peculiares à Poética; aprender e colher frutos, criteriosa e ordenadamente com esta experimentação, percebendo a fixação do andamento rítmico dos versos e do universo próprio a cada poeta-autor e apreendendo estilos e um incontável número de palavras novas e seus significados; a reconhecer e identificar as figuras de linguagem, especialmente a metáfora e seus diversificados efeitos imagéticos. É necessário apreender e aplicar os recursos estilísticos ao texto para que tome características de poeticidade e se apresente poeticamente, especialmente através da utilização da metáfora – a princesa da linguagem. É urgente educar os ouvidos a fim de perceber os cacófatos e cacofonias, os pleonasmos viciosos e outras preciosidades adversas anteriormente imperceptíveis. Acabará adquirindo um olhar clínico para o fenômeno poético e do exercitar sobrevirá um andamento rítmico pessoalizado, individual; advirá, através da pertinácia e do empenho, sem que o poeta-autor se aperceba por inteiro, por absorção e convivência, um genuíno e original cacoete poético dentro da cabeça do criador: o espiritual passa a ser um eito mais meticuloso – menos espontâneo ou imediatista – e parece dar um comando ao cérebro: Cautela, meu estro criador, pois estamos dando voz e vez ao Mistério, o único que realmente produz o poema com Poesia! E mais: o ordenamento psíquico-intelecto-sensível sabe que a partir daquele momento a linguagem já não é mais aquela costumeira ao cotidiano: aberta, derramada, entendível. Resta então instalada a linguagem em sentido conotativo, reflexiva, codificada, pejada de estranhamentos, portanto em plenitude, densa de significantes e significados. E o poeta-autor entra em “Estado de Poesia” e começa a lançar suas garatujas no mundo dos fatos – aquele do patamar de realidades que a fez nascer como instrumento de felicidade – capaz de produzir no receptor a luz de um mundo novo, curiosamente com apreciável dose de verossimilhança. É tão fortemente veraz a descrição deste universo trágico-lírico, que se escafede a irrealidade, a farsa e o sonho, graças à habilidade intelectiva e o talento instintivo do poeta-autor acrescido do conhecimento no campo simbológico da Poesia. E a Arte recria a vida através do poema com Poesia.
– Do livro inédito OFICINA DO VERSO: O Exercício do Sentir Poético, vol. 02; 2015/18.
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