A Cena na Literatura
O consultor literário internacional James McSill define cena no livro de ficção como algo que se vê do ponto de vista externo, por meio da lente de uma câmera. Mas, ao contrário das produções cinematográficas, ele afirma que a cena na literatura é cinco vezes mais poderosa.
Isso porque ela não é apenas visualizada, e sim percebida através dos cinco sentidos. Em uma passagem da história, por exemplo, o personagem pode sentir pelo tato a textura de um divã que é a peça-chave de uma investigação criminal; ou pelo olfato ele tem a oportunidade de sentir no ambiente o perfume de sua amada, e assim saber que ela esteve ali recentemente.
O autor deve, portanto, na construção de uma cena, iniciar a narrativa pelo exterior da mente de seu personagem e filmar o enredo com todos os sentidos necessários em cada estágio de seu desenvolvimento. Nos diálogos predomina a audição, já nos pensamentos ou na narração é possível mesclar a visão, o ouvir, o tato, o paladar e o olfato.
Assim como em um filme, a obra literária é estruturada por uma série de cenas entretecidas, programadas ou não pelo escritor. Deve ser sempre viável ao leitor perceber a transição de uma cena para a seguinte. É importante que o autor, antes de compô-las, crie a premissa de seu livro.
Isto é, ele deve ter em mente a sua história, o universo no qual ela se insere, em que momento se passa, qual a sua geografia, quem são os personagens, de qual deles será o ponto de vista e o porquê de tudo. Mesmo que os detalhes da narrativa estejam presentes apenas nas entrelinhas, devem antes de tudo estar impressos na mente de seu criador. Resumindo, na cena devem estar presentes o tempo, o espaço, o ponto de vista do personagem e a sequência dos fatos.
Só então o autor terá condições de dar início à criação de suas cenas. É como se ele fosse o arquiteto ou o projetor de uma obra; o primeiro passo é sempre compor o projeto, a marquise, para só então a construção ser executada. Do contrário, poderá se perder nos labirintos de seu processo criativo.
Da mesma forma que não é necessário edificar primeiro a cozinha ou o banheiro de um apartamento, também é desnecessário produzir as cenas na sequência em que serão inseridas no formato final do livro. O escritor pode até criar a cena inicial e a final e depois seguir elaborando as restantes.
Cada cena deve ser essencial para a evolução da história ou para a apresentação dos personagens. É a única razão para sua existência. É imprescindível que haja um nexo na trama, e para isso todas as cenas devem estar perfeitamente encadeadas até a conclusão do enredo. A emoção é outro elemento essencial da cena; quem deseja, portanto, ser um escritor, deve ter claro em sua mente que não basta escrever, é fundamental imprimir uma carga emocional a cada frase, como destaca James McSill.
Por Ana Lucia Santana