MONÓLOGO DE UM PRETO VELHO
Preto veio hoje, é apenas, saudade;
Quando novo, na fazenda do senhor,
Trabaiava igual à um vapor,
Girando as moendas do engenho;
Ali saia o caldo da cana,
O mé, o açúcar, a rapadura!
Era uma loita, a vida do negro era dura.,
E para esquecer a desgraça,
Nós também fazia a cachaça,
O remédio pra nossas amarguras.
Quando o sol se descambava,
Se escondendo atrás dos montes,
Dourava os céus, os horizontes,
E tudo cessava no engenho e no campo;
Os escravos em fila pelas estradas,
Entre as matas, temerosos as feras,
Cantava os seus sonhos,suas quimeras,
Com filhos nos colos e muitos nos ventres
Sonhando talvez, muito crentes,
Em uma liberdade , em plena esfera.
Enquanto isso, no engenho, ficavam,
Escravos á serem chicoteados,
Indefesos, aos troncos amarrados,
Gracejados e cuspidos em seus rostos,
Apenas, sob o olhar dos céus!...
Aguardando o ego daquele senhor,
A ser preenchido com desamor,
Aos açoites e ranger de dentes,
Daqueles seres humanos, indigentes,
Sem lei, sem justiça e sem amor.
Tudo virou cinzas, foi carnaval...
No palco fecharam- se as cortinas,
Ocultando a dor e as ruínas,
A história e o sentimento;
A dor não cala, nem esconde as chagas,
Nem as lembranças infelizes, amargas,
Caracterizando a negra face;
Futebol, carnaval, incultura,
Ainda é remédio, enquanto perdura,
Ao futuro, há mistério, sem disfarce.
Autor: Valmy Moura Costa