MONÓLOGO DE UM PRETO VELHO

Preto veio hoje, é apenas, saudade;

Quando novo, na fazenda do senhor,

Trabaiava igual à um vapor,

Girando as moendas do engenho;

Ali saia o caldo da cana,

O mé, o açúcar, a rapadura!

Era uma loita, a vida do negro era dura.,

E para esquecer a desgraça,

Nós também fazia a cachaça,

O remédio pra nossas amarguras.

Quando o sol se descambava,

Se escondendo atrás dos montes,

Dourava os céus, os horizontes,

E tudo cessava no engenho e no campo;

Os escravos em fila pelas estradas,

Entre as matas, temerosos as feras,

Cantava os seus sonhos,suas quimeras,

Com filhos nos colos e muitos nos ventres

Sonhando talvez, muito crentes,

Em uma liberdade , em plena esfera.

Enquanto isso, no engenho, ficavam,

Escravos á serem chicoteados,

Indefesos, aos troncos amarrados,

Gracejados e cuspidos em seus rostos,

Apenas, sob o olhar dos céus!...

Aguardando o ego daquele senhor,

A ser preenchido com desamor,

Aos açoites e ranger de dentes,

Daqueles seres humanos, indigentes,

Sem lei, sem justiça e sem amor.

Tudo virou cinzas, foi carnaval...

No palco fecharam- se as cortinas,

Ocultando a dor e as ruínas,

A história e o sentimento;

A dor não cala, nem esconde as chagas,

Nem as lembranças infelizes, amargas,

Caracterizando a negra face;

Futebol, carnaval, incultura,

Ainda é remédio, enquanto perdura,

Ao futuro, há mistério, sem disfarce.

Autor: Valmy Moura Costa

Valmy
Enviado por Valmy em 12/07/2015
Reeditado em 24/08/2015
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