O FAZER CRIANDO III

Em Poética, vale dizer, no poema ou na prosa com poesia – modalidades literárias que se caracterizam pela codificação verbal e pela utilização da linguagem em sentido conotativo – não acredito na abastança e total primazia da INSPIRAÇÃO, que é a centelha instintiva e original desencadeadora do processo, e que vem embebida na momentânea emoção, retorcendo-se de choro ou riso. Estas explosões da emocionalidade são o cadinho da contemplação extática, o resultado da ilação com os fatos e situações da realidade; também da fantasia ilusória e da farsa com que o espiritual vivifica-se, absorvendo os antagonismos, adversidades reais e cansaços de alma e do físico. À falta deste surto criativo – que nunca se sabe de onde vem – nada exsurgirá em termos de criação literária. É vertente originária desaguando o filete de água boa. Sem que aconteça este derramamento os versos não afloram. No entanto, em regra, a inspiração ou espontaneidade, de per se, só excepcionalmente (em casos de manifestação da genialidade autoral) virá a fixar a formatação do poema ou da narrativa. O que vale mesmo para a fixação da peça em definitivo é o trabalho revisional assentado na racionalidade: a TRANSPIRAÇÃO. Curiosamente, os iniciantes, em seu diletantismo, sempre acham que o texto poético nasce pronto... Ledo engano!

– Do livro OFICINA DO VERSO, 2015.

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