Diálogo entre as obras "Amor", de Clarice Lispector e "Bliss", de Katherine Mansfield
Este ensaio pretende estabelecer um breve diálogo entre os contos "Bliss", de Katherine Mansfield e "Amor", de Clarice Lispector, a fim de demonstrar que existe uma aproximação entre as duas obras. Para fazer esse diálogo, serão apresentados neste trabalho alguns pontos em comum que unem as duas narrativas.
O primeiro ponto em comum entre as obras aparece logo no título. Ambos os contos são nomeados por uma palavra que denota um sentimento. O conto de Lispector é intitulado com a palavra "amor" e o de Mansfield com a palavra "felicidade". Esses dois títulos são uma referência aos sentimentos que as personagens centrais irão experimentar durante a maior parte das narrativas.
O segundo ponto em comum diz respeito ao enredo. Os dois contos falam sobre uma personagem feminina que experimenta uma emoção motivada por alguma coisa. O conto de Mansfield é sobre Bertha Young, uma mulher que é tomada por um sentimento de felicidade ao refletir sobre o quanto é bem sucedida no casamento e em sua vida pessoal. Já o de Lispector é sobre a história de Ana, uma dona de casa que é envolvida por um sentimento de compaixão ao observar um cego em um bonde.
Entretanto, esses dois sentimentos experimentados pelas personagens serão temporários. Isso porque nos dois contos ocorre um mal estar que interrompe esses estados de espírito. No conto de Mansfield, isso acontece quando Bertha Young descobre que o seu marido mantém um caso extraconjugal com Pearl Fulton, uma pessoa por quem Young tinha admiração. No conto de Lispector, esse mal estar acontece quando Ana está em sua casa e se vê retornando à rotina do seu dia a dia.
A segunda semelhança entre os dois contos é que as protagonistas compartilham características parecidas. Ambas são descritas como senhoras casadas, cuidadosas com o lar e dedicadas aos filhos. Além disso, as duas são descritas como pessoas economicamente favorecidas e providas de conforto material.
Além dos aspectos em comum presentes nas personagens, outra semelhança que aparece no conto é referente ao cenário. As duas histórias têm como pano de fundo um jardim, o qual é descrito como um lugar repleto de árvores, flores e frutos. O jardim e as árvores são simbólicos e representam a vida das personagens.
A quarta semelhança é que as duas personagens fazem constantes reflexões sobre suas vidas. Exemplos disso são quando a personagem Ana faz um flashback sobre seu lar e seus filhos no momento em que ela está dentro do bonde e quando Bertha está na sala e pensa sobre o quanto se sente satisfeita por ainda ser jovem, ter um marido que a ama, ser mãe de um bebê maravilhoso e ter a amizade de pessoas interessantes.
O quinto e último ponto em comum entre as obras é o fato de que ambas fazem uma crítica à sociedade. Na época da publicação desses contos, ainda prevalecia a visão patriarcal de que a mulher só existe para servir o marido e cuidar da casa e dos filhos. Assim, os contos de Mansfield e Lispector vão trazer de forma irônica essa visão que a sociedade tinha sobre a mulher.
O presente ensaio se restringiu a apresentar apenas cincos semelhanças entre os contos “Bliss”, de Katherine Mansfield e “Amor”, de Clarice Lispector. No entanto, há muitos outros pontos em comum que podem ser observados e considerados nas duas obras. A intenção deste trabalho foi unicamente a de demonstrar que existem características que aproximam os dois contos. E essa proximidade entre as duas obras indica que Clarice possivelmente baseou o seu conto no de Mansfield.