Análise do Poema “CHOVE” , de Fernando Pessoa

CHOVE. É dia de Natal. A

Lá para o Norte é melhor: B

Há a neve que faz mal, A

E o frio que é ainda pior. B

E toda a gente é contente C

Porque é dia de o ficar. D

Chove no Natal presente. C

Antes isso que nevar. D

Pois apesar de ser esse E

O Natal da convenção, F

Quando o corpo me arrefece E

Tenho frio e Natal não. F

Deixo sentir a quem quadra G

E o Natal de quem o fez, H

Pois se escrevo ainda outra quadra G

Fico gelado dos pés. H

Fernando Pessoa

(25-12-1930)

___________________________

A Análise

O poema “Chove” de Fernando Pessoa, apesar de pertencer cronologicamente ao Modernismo português, cujo ideal é quebrar regras com a tradição formal, apresenta-se com forma fixa de quatro estrofes, cada uma contendo quatro versos (quadras – característica da poética de Fernando Pessoa o uso de quadras como predominância), divididos em sete sílabas poéticas (redondilho maior). Além disso, possui rimas alternadas (ABAB – CDCD – EFEF - GHGH) e há a predominância de rimas ricas.

Do ponto de vista semântico, o “eu-lírico” diz que chove no dia de Natal e antiteticamente afirma a preferência em achar no Norte o melhor lugar para ficar nesse período, pois lá o frio torna-se pior do que o que já está a sentir (“[...] Lá para o norte é melhor: / Há a neve que faz mal, /E o frio que é ainda pior. [...]” - antítese). Isso porque combinaria mais com o espírito deste “eu-poético” que não concorda com o clima de alegria trazido pelo Natal.

Esse dia deixa as pessoas contentes, pois há a troca de presentes - a palavra “presente” no terceiro verso da segunda estrofe é ambígua, pois pode ser o presente (tempo) ou o presente (substantivo – do ato de presentear). Então, apesar de ser uma convenção a festa natalina, ela torna-se um momento bonito e de alegria que não há espaço para a frieza da neve, pois existe o calor das pessoas que possuem o espírito natalino.

Porém, o “eu-lírico” por não possuir esse calor natalino dentro dele, sente o corpo frio (“[...] Tenho frio e Natal não. [...]” – Elipse do verbo “ter”) e prefere optar em terminar o poema à não acrescentar outra quadra – metapoema - uma vez que no verso “[...] Pois se escrevo ainda outra quadra [...]” o “eu” que fala comenta, no poema, sobre o próprio fazer poético. Faz isso, pois, com o frio que diz sentir, não há, portanto, possibilidade de dar continuidade ao texto.

___________________________

Conclusão

Esse poema, portanto, mostra características da poética de Fernando Pessoa como a utilização de quartetos, a métrica de sete versos (em redondilho maior) e uma linguagem simples, porém de forma bem trabalhada. Além disso, mesmo através de um humor negro, conforme o penúltimo verso, há presente no texto um dos temas de sua poética que é a metapoesia.

___________________________

Referência

PESSOA, Fernando. Obra Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 2003.