CESURA ÉPICA
Cesura Épica
Cesura épica pode ser definida como o descarte (para contagem do número de sílabas poéticas) das sílabas átonas (com som fraco) da última palavra, após sua tônica, no primeiro hemistíquio do verso***1 (leia a definição, se não souber o significado de hemistíquio e cesura, e deixe a discussão sobre o tema hemistíquio para ler depois do que é cesura épica, facilitará a compreensão da discussão que fiz nos asteriscos).
São casos raros em nosso idioma. Mais comum na Poesia de Língua Espanhola, no verso alexandrino espanhol e na Poesia medieval.
Ex.
No jardim colorido de rosas multicores
Na contagem deste verso de 12 sílabas poéticas (verso dodecassílabo), fiz aqui um alexandrino espanhol, descobrimos que utilizei a técnica da cesura épica.
Vejamos como determinamos que há uma cesura épica:
Façamos a escansão e separemos o verso em seus dois hemistíquios.
[No/ jar/dim/ co/lo/ri]// do [de/ ro/sas/ mul/ti/co//res]
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Cada hemistíquio deste verso deve ter 6 sílabas poéticas para formar o dodecassílabo, ok?
Ao escandir o verso até a última sílaba tônica da última palavra do verso descobrimos que a contagem deu 13 sílabas poéticas, quando o correto seriam 12 sílabas poéticas.
O que aconteceu para encontrarmos 13 sílabas poéticas?
Aconteceu que descartei da contagem das sílabas poéticas do verso a sílaba átona [do], situada após a sílaba tônica da última palavra da primeira cesura (colorido).
Esta técnica de descarte da(s) sílaba(s) átonas excedente(s) após a tônica da última palavra do primeiro hemistíquio é denominada de cesura épica.
A cesura épica é denominada de CESURA ÁTONA pelo Professor e Poeta Português: Amorim de Carvalho em seu Tratado de Versificação Literária.
Para ilustração vou mostrar, dentre outras possibilidades, duas ocorrências diversas da cesura épica - uma moderna e outra que pode ocorrer em versos decassílabos medievais.
a) Metrificação Moderna.
Observe este verso:
Estar contente viver alegre por ser amante.
Ele possui a característica de ser formado por três hemistíquios idênticos e que dividem o verso em 3 partes iguais, vejam:
Estar contente// viver alegre// por ser amante.
Se observarmos cada um dos 3 (três) hemistíquios de 4 sílabas poéticas é formado de 5 sílabas gramaticais com esta característica: sílaba átona/sílaba tônica/ sílaba átona/sílaba tônica e após o término de cada hemistíquio uma sílaba átona.
Um detalhe importante: o verso acima foi pensado para ser um dodecassílabo (verso de 12 sílabas poéticas) com acentuação em destaque, formando as cesuras na 4ª, 8ª e 12ª sílabas poéticas. Construção de dodecassílabos comum, sem a cesura épica, nos dias de hoje.
O que pratiquei para que realizasse no verso: a cesura épica, também, chamada de cesura átona. Em cada hemistíquio, as estruturas com sentido próprio do verso acima, eu descartei da contagem das sílabas poéticas a sílaba átona final e acabei tendo um verso de 12 sílabas poéticas.
Vejamos graficamente:
Es/tar/ con/ten/[te]// vi/ver/ a/le/[gre]// por/ ser/ a/man/[te].
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As sílabas entre parênteses foram excluídas da contagem das sílabas poéticas. Aqui se fez a cesura épica, também.
b) Metrificação Medieval.
Vejamos este outro verso (técnica possível nos poetas da Idade Média, mais raro para os tempos modernos):
Está sorridente! Co´a vida de amante!
Neste caso criei, utilizando a cesura épica, dois versos menores (duas unidades com significado próprio) que juntos formam o verso decassílabo.
Vejamos:
Está sorridente!// Co´a vida de amante!
O primeiro verso com sentido próprio é:
Está sorridente!
Nele temos 5 sílabas poéticas:
Es/tá/sor/ri/den/[te!]
1 2 3 4 5
A sílaba átona final [te!] foi, por mim, excluída da contagem das sílabas poéticas do verso ao utilizar a cesura épica, também, chamada de cesura átona, como já sabemos.
Vejamos o que aconteceu com a não contagem da sílaba átona final do primeiro verso, verso de significação própria e ajuntado com o segundo verso, também, de significação própria:
Es/tá/ sor/ri/den/[te!]// Co´a/ vi/da/ de a/man/te!
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Fez-se o decassílabo, observaram?
A cesura épica pode aparecer quando o primeiro dos versos ou primeira estrutura (imagine aqui uma estrutura que não tenha um significado próprio, recuperado na totalidade do verso) possuía um vocábulo paroxítono ou proparoxítono. Elimina-se da contagem das sílabas poéticas do verso para formação do decassílabo as sílabas pós-tônicas (sílaba átona/ sílabas átonas) do primeiro verso ou da primeira estrutura encaixado no verso maior ou igual (5 + 5), como fiz neste exemplo.
Assim, torna-se idêntico para se determinar a contagem de sílabas do verso sem e com cesura épica, por exemplo, todos estes decassílabos:
5 + 5 e 5 + (sílaba(s) átona(s) descartada(s)/ + 5;
idêntico para 3 + 7 e 3 + (sílaba(s) átona(s) descartada(s)/ + 7;
idêntico para 4 + 6 e 4 + (sílaba(s) átona(s) descartada(s)/ + 6;
idêntico para 6 + 4 e 6 + (sílaba(s) átona(s) descartada(s)/ + 4.
Atenção!
Neste verso a seguir não se consumou a cesura épica/ átona:
Toda vida nasce em um forte choro.
Escandindo:
To/da/ vi/da/ NAS//ce em/ um/for/te/CHO/ro.
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Temos aqui um único verso, uma única estrutura: - Toda vida nasce em um forte choro -.
Temos neste caso um estrutura dividida em dois hemistíquios com 5 sílabas poéticas cada um:
To/da/ vi/da/NAS//
1 2 3 4 5
ce em/ um/ for/ te/ CHO/ro.
6 7 8 9 10
Esta construção do verso é moderna e formada por dois hemistíquios de 5 cinco sílabas poéticas. A 5ª e 10ª sílabas poéticas são necessariamente acentuadas.
A 6ª sílaba poética (átona) não foi descartada da contagem das sílabas poéticas, ela iniciou, isto sim, o 2º hemistíquio do verso, após o 5º verso tem a cesura e o novo hemistíquio começa, além de ser contemplada a regrinha da elisão, que obrigatoriamente, na feitura perfeita de um verso com dois hemistíquios iguais em número de sílabas poéticas prevê que se a palavra final do 1º hemistíquio for paroxítona escrita no singular deve-se começar o 2º hemistíquio com palavra iniciada por vogal ou consoante muda. Assim se dá a elisão. Uma consideração importante: na feitura perfeita de um verso não se faz uso de proparoxítona ao término do 1º hemistíquio.
Tanto o decassílabo: Está sorridente!// Co´a vida de amante! - como o decassílabo: - Toda vida nasce em um forte choro. - são denominados na Literatura Poética de decassílabos de arte maior, porém, o primeiro tem construção com cesura épica e de origem medieval e é raramente realizado, e o segundo é uma construção praticada com frequência.
Na estrutura do verso decassílabo de arte maior de feitura moderna fica nítida a cesura pós 5ª sílaba poética:
To/da/ vi/da/NAS// (cesura)
1 2 3 4 5
ce/ em um/ for/ te/ CHO/ro.
6 7 8 9 10
As sílabas [vi] e [for] - 3ª e 8ª sílabas poéticas do verso apresentam ao término de suas pronúncias, apenas uma pausa maior que entre sílabas poéticas normais, não caracterizando uma cesura. A pausa maior possui um tempo de duração menor que a cesura;
A cesura é visualizada pós 5ª sílaba poética, sílaba lida com entonação maior, o que determina a cesura e os dois hemistíquios do verso. O 2º hemistíquio com término na última sílaba poética tônica do verso que nos traz a cesura final do verso.
Observem na leitura em voz alta a diferença da pausa maior e da cesura. As outras sílabas poéticas provocam pausas menores, também, observáveis, na leitura em voz alta do verso.
Então, num mesmo verso, podem ocorrer as:
Pausas menores (após sílabas poéticas átonas),
Pausas maiores (após sílabas poéticas tônicas),
Cesura(s) - (nas tônicas principais).
Já na construção de um verso decassílabo de arte maior com cesura épica e estrutura com dois versos encaixados aparecem 4 cesuras.
Observemos este exemplo:
Renasceu// a vi// da! --- Renasceu// do cho// ro!
1º verso 2º verso
// cesura; --- separação do 1º e 2º verso encaixados.
E por quê?
Porque temos dois versos encaixados que se juntaram e carregam junto a cesura interna de cada verso em separado, cesuras que provocaram os dois hemistíquios de cada verso, sendo que o último hemistíquio teve seu término na última sílaba poética do verso com a 4ª cesura.
Vejamos:
Renasceu// a vi// [da!]* Renasceu// do cho// ro!
1º 2º 3º 4º
* sílaba descartada pela cesura épica, utilizada pós 1º verso.
***1 HEMISTÍQUIO*** - é a divisão central ou + ou menos central de um verso, determina-se o seu tamanho e localização pela(s) cesura(s) do verso. Um verso regular de até 12 sílabas poéticas possui geralmente 2 (dois) hemistíquios, podendo ter 3, 4, 5 até 6 hemistíquios, dependendo do tipo de verso construído. O 2º hemistíquio e os outros hemistíquios de um verso começam após a CESURA, que é (são) a(s) pausa(s) mais prolongada(s) que encontramos na leitura de um verso. O último hemistíquio do verso termina na última sílaba poética e tônica do verso, junto da última cesura dele. A cesura somente acontece após as sílabas tônicas principais de um verso.
Na definição básica e mais divulgada, o hemistíquio estaria relacionado ao verso alexandrino de 12 sílabas poéticas com a divisão em dois versos menores de 6 sílabas poéticas, obedecendo quando necessária, a elisão central; o que poderia ser estendido para o decassílabo moderno de arte maior e o sáfico quebrado (formado de dois hemistíquios com 4 sílabas poéticas e 2 cesuras) que tem a mesma característica e outros versos que formam duas estruturas idênticas: possuindo o mesmo número de sílabas em cada hemistíquio.
*** Estou considerando hemistíquio observando a colocação das tônicas principais e obrigatórias, necessárias para a boa confecção de um determinado tipo de metro e ritmo, ex. verso decassílabo heroico, verso alexandrino, verso com estrutura anapéstica: duas sílabas fracas + uma forte em sequência (2, 3 ou 4 vezes em sequência). Da colocação dessas tônicas principais surgem os hemistíquios. Então, se justifica ter até 6 hemistíquios em um único verso, porque se coloco uma sequência de seis pés (segmentos melódicos) formados de 1 sílaba fraca + 1 sílaba forte, neste formato de verso alexandrino:
Nascer, viver, brincar, sonhar, crescer, morrer.
Como dizer o que é central aqui? Para dizer temos dois hemistíquios. Aqui vejo seis hemistíquios hierarquicamente iguais, se me entendem.
Discussão:
Por que a afirmação + ou - central? Porque em um verso, por exemplo, no verso decassílabo heroico, onde a cesura principal está localizada na 6ª sílaba poética do verso temos dois hemistíquios, mas o primeiro possui 6 sílabas poéticas e o segundo 4.
A cesura principal está + ou - no centro do verso, mas pode ocorrer caso em que está bem deslocada do centro do verso, como neste exemplo:
Que/ro/ rir!// Mas/ não/ há/ con/ten/ta/men/to.
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
// cesura principal
Vejam que o primeiro hemistíquio tem 3 sílabas poéticas e o segundo 7 sílabas poéticas. Poderíamos até dizer que existe uma 2ª cesura depois da sílaba poética [há] se não pensarmos na estrutura de dois versos encaixados e com sentido próprio formando um verso maior: decassílabo. No decassílabo criado, a cesura está após 3ª sílaba poética, formando a partir daí o 2º e último hemistíquio do decassílabo, que para mim possui 7 sílabas poéticas.
Não se faz uma grande pausa após a sílaba poética [há], a ponto deu enxergar outra cesura. Vejo apenas uma pausa maior, que as outras existentes na pronúncia do verso.
Apesar de a sílaba poética [há] oferecer uma pausa na leitura não se pode afirmar que exista cesura, pelo fato de ser a 6ª sílaba poética tônica, condição essencial para a existência de um verso decassílabo heroico, pois creio não existir perfeição e intenção de construção deste verso como decassílabo heroico.
Estamos, isto sim, diante de uma construção de decassílabo em formato medieval, separando o verso em duas estruturas de 3 e 7 sílabas poéticas, respectivamente. O decassílabo heroico se formata com a cesura principal localizada pós 6ª sílaba poética, impreterivelmente.
Se fosse um verso separado de 7 sílabas poéticas: - Mas não há contentamento - ai sim! A cesura é mais notada na pronúncia. Eu penso haver a necessidade da pausa mais prolongada: a cesura, que todo verso composto: verso com mais de 5 sílabas poéticas possui, excetuando é claro, casos de versos com palavra única: - infinitamente - ou com artigo + palavra: - a felicidade -; - um contentamento – .
Poderia até construir assim*:
Sonho rir, aos quatro ventos,
*Mas não há! Contentamentos.
Última dica.
Guardem esta regra da metrificação:
Quando se constrói um verso decassílabo heroico, hierarquicamente, a 10º sílaba poética é a principal e a 6ª sílaba poética é a segunda principal, nelas estão as cesuras do decassílabo heroico. Sempre se busca colocar nestas posições do verso, as palavras centrais, realizando, assim, com maior perfeição o verso heroico.
Será semelhante na construção dos outros decassílabos e demais metros e seus ritmos, obedecendo é lógico a colocação das sílabas poéticas tônicas que formem as cesuras e os hemistíquios do verso.
Conhecendo onde incide a(s) sílaba(s) poética(s) tônica(s) obrigatórias de cada construção clássica de verso, com denominação própria, se constrói com segurança o verso desejado.
Assim, por exemplo, no decassílabo sáfico teremos três cesuras e três hemistíquios: da 1ª até a 4ª sílaba poética (o primeiro); da 5ª até 8ª sílaba poética (o segundo) e 9ª e 10ª sílaba poética (o terceiro, que termina na última cesura do verso), porque se constrói o decassílabo sáfico com tônicas principais (que são, também, cesuras) na 4ª, 8ª e 10ª sílaba poética.
Ex. {Um/ bom/ ca/[mi] //} {nho/ pro/cu/ [ra] //} {mos [sem]//} pre.
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
/ separação de cada sílaba poética;
// cesura;
[] sílaba poética principal;
{} hemistíquio.
No decassílabo sáfico, hierarquicamente, a 10ª sílaba poética é a principal e a 4ª e 8ª tem o mesmo peso.
Podemos, enfim, dizer que a última sílaba poética tônica do verso clássico é a principal de todo o verso por nós confeccionado.
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