Representação, História e Literatura
CEFET - Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais
Departamento de Linguagem e Tecnologia – Graduação em Letras
Disciplina: Fundamentos de História Cultural e História Social das
Mídias – Professor James
Alunos:
Jaqueline Teixeira Gomes
Luís Antônio Matias Soares
1 – Explique o conceito de representação, apresentando um exemplo em cada campo:
Representações são formas coletivas da vida social de um dado grupo de pessoas. São elas que mantêm a coesão do grupo. As representações são construídas social e historicamente e se internalizam no inconsciente coletivo dos indivíduos. Posteriormente elas se apresentam como naturais.
Todo simbolismo é fator de identidade e toda cultura é cultura de um grupo.
As representações são expressas como normas, instituições, discursos, imagens e ritos a partir dos quais a realidade é concebida e percebida. Tais representações geram condutas e práticas sociais dotadas de força integradora e coesiva do grupo e passam a explicar a realidade.
Elas se colocam no lugar da realidade, fazendo com que os homens pautem suas existências através delas. São, portanto, matrizes geradoras de condutas e práticas sociais explicativas do real.
Indivíduos componentes de grupos variados dão sentido ao mundo por meio das representações que constroem sobre a realidade. Ao nascerem, as pessoas se encontram inseridas num mundo pré-construído e pré-interpretado. Esta pré-interpretação influenciará a leitura que os nascituros terão acerca desse mundo e da vida, condicionando as possíveis representações que vierem a construir futuramente.
A representação não é uma cópia do real, mas uma construção feita a partir dele. Cada grupo tem a sua própria representação da realidade, o que pode gerar uma multiplicidade de representações de mundo tão contraditória e variada quanto for a quantidade dos grupos que componham a ordem social.
a) Cidade:
Para a história cultural – ao contrário da visão marxista - a cidade não é apenas o local onde prioritariamente ocorrem a produção de bens, a acumulação do capital e o enfrentamento das classes sociais. Nessa corrente histórica ainda são analisadas as representações que se constroem nas cidades ou sobre elas, trabalhando com o imaginário urbano.
Como exemplo, poderia ser citada a maneira como a cidade de Brasília foi imaginada/representada quando de sua elaboração para se tornar a futura capital do Brasil, o centro político e administrativo.
Muito antes de sua construção, existia em relação à futura Capital do país (Brasília) uma representação imaginária de se transferir o centro administrativo para uma localidade no interior do país, onde a ideia de distanciamento funcionaria como fator de proteção contra o ataque de nações estrangeiras. Outra questão que se colocava era relacionada à integração do restante do país a partir da criação de uma capital localizada na região Centro-Oeste do Brasil.
Poder-se-ia, portanto, elaborar um estudo da criação da cidade de Brasília a partir da análise do imaginário referente à proteção, à interiorização e à expansão do país através da construção da capital numa região mais central.
Estas são ideias antigas, tendo sido sugerida pela primeira vez na metade do século XVIII pelo Marquês de Pombal ou pelo cartógrafo italiano Francesco Tosi Colombina. Posteriormente foi retomada nos ideais dos inconfidentes mineiros e reforçada mais tarde com a chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro em 1808.
b) Literatura:
Neste caso temos a literatura como fonte de estudo, pesquisa e análise histórica de determinada época. A literatura surge como uma maneira de estudar as representações das questões e inquietudes individuais e coletivas que permeiem certa época ou determinados grupos sociais.
A história dispõe perguntas e questões e faz uso da literatura para a obtenção de algumas respostas. A ficção é, então, utilizada como fonte e documento pela história cultural para responder questões formuladas pelo historiador.
A literatura deve ser usada enquanto expressão ou representação das ideias, sentimentos e questões que tomaram conta de uma época. Os personagens, não reais, expressam as mesmas representações e o mesmo imaginário que determinados grupos reais do referido período.
Na obra “O Mulato”, Aluísio Azevedo deixa transparecer a forma como a sociedade de sua época abordava as questões raciais, inaugurando no Brasil a escola Naturalista.
Outra das obras deste autor, “Casa de Pensão”, baseia-se em fatos reais: a Questão Capistrano, crime que marcou o ano de 1876 na cidade do Rio de Janeiro. O crime, que envolveu dois estudantes, foi tratado de maneira muito próxima na narrativa.
Azevedo estuda as influências da sociedade sobre o indivíduo, sem qualquer idealização romântica, retratando rigorosamente a realidade social e trazendo para a arte narrativa da literatura um Brasil até então ignorado.
Aluísio Azevedo focaliza problemas relacionados aos preconceitos de classe ou raça, miséria e injustiça social. Descreve a vida nas chamadas pensões familiares onde se hospedavam jovens que vinham do interior para estudar na capital. As teses naturalistas, especialmente o Determinismo, alicerçam a construção das personagens e do enredo.
c) Imagem:
O uso das imagens ainda é um campo de utilização recente enquanto fonte histórica.
Imagens são representações do mundo para serem vistas. Elas estabelecem uma rápida ligação entre o mundo do espectador e o mundo do produtor, tendo a realidade como referência e colaborando diretamente na constituição do imaginário das pessoas.
Toda imagem comporta, assim, uma mensagem discursiva. Para a compreensão da imagem não se faz necessário que o receptor disponha de qualquer espécie de aprendizado ou conhecimento para compreendê-la ou participar dela, como ocorre no caso do discurso escrito onde é necessário que o leitor saiba inicialmente ler.
Já a imagem atinge o espectador direta e imediatamente. Elas são dotadas de alto poder de mobilização. E é testemunho tanto de uma época quanto de sua própria criação. Representam a maneira particular que essa época encontrou para se retratar a si mesma ou ao seu passado, apontando neste retrato os seus valores e os sentimentos responsáveis por sua própria criação.
A imagem tem valor documental e indica os valores que representavam a sociedade e eram direcionados para atingir direta ou subliminarmente o espectador. E é este espectador de cada época que realiza a leitura e a transcrição da imagem gravada.
Como exemplo de imagem, citam-se fotografias ou pinturas que retratam a bandeira brasileira. Sabe-se que as cores da bandeira possuem uma representação para grande parte das pessoas: a cor verde simbolizaria as matas e florestas; a cor amarela o ouro e as riquezas; a azul representa o céu e o branco a paz.
Estes aspectos simbólicos podem, no entanto, ser alterados conforme a visão e a representatividade do grupo que esteja em contato com a bandeira nacional. Para o historiador cultural, portanto, a análise de imagens, retratos ou pinturas da bandeira brasileira pode informar acerca da significação/representação que esta imagem provoca ou provocou em determinados grupos sociais de épocas variadas.
d) Identidade:
A identidade é uma construção simbólica de sentido que organiza um sistema compreensivo a partir da ideia de pertencimento. Ela possibilita coesão social a partir da identificação da parte (o indivíduo) com o todo (o coletivo).
O que define ser brasileiro, por exemplo?
As identidades neste caso são múltiplas e surgem no eu pessoal construtor da personalidade, fazendo com que um mesmo indivíduo superponha e acumule em si diferentes perfis de identidade.
Estes perfis não são excludentes por si mesmos nem costumam atingir uma composição sempre amigável, harmônica ou sem conflitos. Existem modalidades de identidade, por exemplo, que se referem ao território e ao espaço, mas que muitas vezes extrapolam as simples divisões político-administrativas.
É o que ocorre, por exemplo, com a ideia de separação surgida em três estados da região Sul em relação ao restante do Brasil, com a correspondente ideia da formação de um novo país.
Em sua Carta de Princípios, o referido movimento cita fatores políticos, tributários, econômicos, geográficos, culturais, sociais, morais e históricos na defesa da ideia da separação e da criação de um novo país.
Para o historiador cultural, todos os motivos que predispõem à separação – tanto quanto aqueles que apresentam razões para a não separação – são questões a serem abordadas e analisadas a partir das várias e possíveis representações existentes nos diversos grupos sociais que compõem o nosso país, mais especificamente nas populações que habitam estados da região Sul em contraposição com aqueles que habitam os demais estados do Brasil.
2 – Diferencie história e literatura:
Para a história cultural, história e literatura são formas diferenciadas de representar/expressar o mundo. Ambas guardam características que num certo sentido as aproximam uma da outra ao mesmo tempo em que as tornam distantes quando pensadas a partir de um ponto de vista epistemológico.
Para Pesavento, a história (no sentido cultural) é uma ficção “controlada”. E o seu controle surge a partir de suas fontes, do método e da metodologia de que se utiliza para pesquisar, conhecer e “narrar” o passado. Tais características a diferencia profundamente da narrativa ficcional literária.
A própria literatura é uma das fontes utilizadas pela história cultural no objetivo de se aproximar do passado e captar suas representações. Ela permite ao historiador o acesso à “sintonia fina” e ao “clima de uma época”, isto é, ao modo como ali se descreveu as maneiras como as pessoas viviam, pensavam o mundo e a si próprias, seus valores, conceitos e preconceitos. A ficção literária é uma fonte riquíssima de representação do real.
Para Aristóteles a diferença entre realidade e ficção estaria demarcada no fato de que na história haveria uma correspondência entre a realidade e o discurso, enquanto que a literatura procuraria expressar a realidade de sua época pela verossimilhança, sem se preocupar com a veracidade dos fatos. A narrativa literária não almejaria a veracidade, mas a simples verossimilhança, isto é, tudo aquilo que mesmo não sendo verdadeiro, apresentaria o aspecto e a possibilidade de poder sê-lo.
A história, portanto, se aproximaria da literatura em face desse ingrediente ficcional narrativo/descritivo presente nela (assim como na ficção) quando de sua busca da reconstrução dos fatos do passado.
Por outro lado, a história se afasta da literatura pela utilização de um método científico empregado na base do seu relato descritivo/narrativo do passado. Seus métodos, suas fontes e objetivos são controlados pelo historiador e demarcam a diferença entre história e literatura.
O texto literário não reproduz os fatos do passado, mas reflete a realidade de uma época, as verossimilhanças, as representações do real explicitadas no momento da escrita da própria obra. Já o texto histórico, embora também possa se expressar de forma narrativa e descritiva como o texto ficcional, guarda a preocupação de que suas representações sejam sempre baseadas em fontes documentais e num método estritamente científico de pesquisa, buscando aproximar suas representações da realidade vivida e experimentada pela sociedade e os grupos sociais de determinada época.
A história estaria ligada tanto à verossimilhança literária (no momento, por exemplo, em que o historiador se torna uma espécie de narrador/contador de histórias) quanto à veracidade dos fatos (no momento em que o pesquisador busca provar determinada verdade ou ideia a partir das fontes, conceitos e da metodologia de que se utiliza).
No dizer de Ricocur, a ficção é quase história e a história é quase ficção. E, em resumo, história e literatura são formas de “ler” e “dar a conhecer” o mundo e as representações deste ao leitor.
O discurso histórico - ainda que atuando de forma semelhante com a literatura, através da verossimilhança - produz um efeito de veracidade, de verdade. E é exatamente este efeito que não é encontrado no discurso ficcional. A narrativa histórica é uma narrativa onde se propõe e se supõe contar, retratar e representar o passado enquanto realidade acontecida.
3 – Qual o impacto dos conceitos/ideias discutidos sobre sua compreensão das atividades de editoração de textos?
Em primeiro plano surgiu a questão de que os textos (literários ou não) constituem específicas e variadas representações do mundo por autores que participam ou participaram de grupos sociais distintos e bem caracterizados. E que - assim como são representações de determinados autores – podem se tornar a forma de leitura para a compreensão da realidade por determinados grupos sociais. Tais grupos podem ser constituídos por jovens, idosos, mulheres etc.
Ao editor de textos é necessário, pois, o conhecimento das ideias e sentimentos que tenham afetado tanto as épocas passadas quanto a contemporaneidade.
Por exemplo: a partir da percepção de que determinado tipo de leitura se faz mais comum na atualidade e de como ela atua no imaginário dos leitores enquanto indivíduos componentes de uma dada coletividade, o editor de textos pode vir a ter uma noção acerca das necessidades ou dos interesses de leitura de certa parcela de leitores.
De posse desta percepção, o editor pode tentar prever quais os tipos de textos seriam mais vendáveis ou não em certo momento e em determinada sociedade. Ou, por outra forma, quais os tipos de livros ou ideias representam uma garantia de boa vendagem editorial ou um grande encalhe literário.
Percebe-se hoje, por exemplo, que um excelente campo de venda de livros se encontra naqueles que se referem a histórias de vampirismo (vide a saga Crepúsculo), à uma religiosidade popular e espiritualista (as obras de Paulo Coelho são um bom exemplo) e aos livros de autoajuda (livros sobre relacionamento e sexologia, formas de enriquecimento ou de vivenciar os anos da melhor idade etc.).