LITERATURA E LITERATURA ARTÍSTICA - reeditado

Há, em nossas vidas, principalmente nos dias atuais, incontáveis opções de lazer. Entretanto, analiso o lazer como algo que, ao mesmo tempo em que distrai a mente e descansa o corpo das obrigações diárias, deveria proporcionar aquele algo mais as nossas almas. Evidente que, não sendo máquinas ou computadores, cuja missão é acumular conhecimentos, não queremos sobrecarregar-nos de informações; isto seria muito mais prejudicial do que saudável. Contudo, tento enfatizar a gama de passatempos e distrações doentias que nos envolvem, vindas de todo lado. Se prestarmos atenção, veremos que os próprios canais destinados a levar às massas o alimento espiritual contido nos bons passatempos, deixam muito a desejar no cumprimento dessa missão valiosíssima.

Analisando a música ou o que chamam de música, os programas de entretenimento, banalizados pelo frequente apelo sexual embutido no seu contexto e o que deveria ser arte, pois contratam atores experientes para representá-la, porque precisam sobreviver, podemos concluir que a arte mesmo, no que tange o seu real contexto didático, educativo e cativante, ficou ludibriada e esquecida.

É verdadeiramente deplorável, num mundo que cresce economicamente, em que países claudicantes e desacreditados, têm emergido das cinzas do esquecimento, restabelecendo sua dignidade e posição no mudo, termos que conviver com mentes entorpecidas pela unilateralidade do consumismo, ao visar exclusivamente às vantagens econômicas das transações artísticas ou o que eles denominam de arte. Dentro deste mundaréu de lixo digestivo, o que regurgita na esperança da sobrevivência nos deleita o espírito moribundo de mediocridade.

Deitar a alma carente do talento real e sincero é tarefa, às vezes árdua para aqueles um pouco mais exigentes; sim, um pouco, porquanto os sobremaneira exigentes perder-se-ão na busca cansativa da garimpagem. A não ser que se entreguem à contemplação do passado rico de genialidade, numa fuga à realidade persistente, terão que, aceitar, o que não creio possível ao bom gosto, ou mergulhar no oceano da depressão; mas existe uma saída; o prêmio adocicado pela bondade dos que se foram e dos que ainda vivem no nosso meio.

Todo passatempo que nos faz compensar as agruras de uma atividade rotineira é, de certa forma, benéfico. Isto porque, apenas o fato de contrabalançar o estresse e fazer afluir os hormônios do bem estar, já traz intrínseco, o germe da saúde; é por isso que os produtos da pseudo arte persistem. A questão “gosto não se discute” vem carregada do entusiasmo cego dos pouco ou nada exigentes. Não chega a ser uma questão de exigência, senão de gosto apurado. O fato de gosto não se discutir não exclui a existência do precipício entre o bom e o mau gosto.

Tomemos como exemplo o ato da leitura. Àqueles que não o apreciam - infelizmente existem, e não são poucos; já contatei pessoas adultas que me deixaram boquiaberto ao afirmarem que, em toda sua vida nunca leram um livro sequer - poderemos causar a impressão de seres incomuns ou excêntricos, da mesma forma que espicaçamos a excentricidade das suas preferências. É por isso que gosto não se discute. Do jeito que queremos sua compreensão, esforcemo-nos por compreender o porquê de possuírem tais preferências; pode ser uma questão de cultura, mas aí já é outro departamento.

Entre os livros e outros produtos postos à disposição de quem lê também existem o bom e o medíocre, mas, concordemos, é muito mais raro. O que faz um livro ser ruim, por exemplo? Certamente não é o fato de estar mal escrito, mas de o assunto não ter muito a ver conosco e não ser a nossa preferência; pode fazer, todavia, a felicidade e o nirvana de muitos outros apreciadores deste tipo de linha. Pode ser aí novamente uma questão de gosto, mas estamos falando de literatura! Sopesemos a diferença entre escrever um romance, um conto rebuscado e atraente ou mesmo um belo poema e simplesmente rabiscar algumas letras no papel e chamar a isto de literatura. Os sites de literatura estão carregados de textos primorosos, de jovens iniciantes na fantástica arte de escrever, fazendo-o com insofismável talento.

Porém, de cada dez inserções - pelo menos os que tenho analisado - sete ou oito são o que chamam de poesia. Deve ser tão fácil sentar-se e escrever algumas linhas e chamar a isso de texto ou poema que há hoje mais autores de poesias do que escritores. Escrever é coisa séria, exige esforço mental que não transige com a preguiça. Os noventa e nove por cento de transpiração devem vir após aquela inspiração de um por cento que, após brotar, precisa ser desenvolvida e é esta a tarefa que exige dedicação e continuidade.

Imaginemos, como exemplo, as notas musicais, que simplicidade! Que insignificância numérica! Sete palavrinhas monossilábicas; mas, que poder! É incomensurável o esforço de entender a capacidade e o talento de um maestro ou de um músico realmente músico. Uma simples existência não é nada para assimilar, compreender e executar um terço da grandiosidade contida na mescla e potencial criativo destas sete letrinhas. Quando penso num Beethoven, num Bach ou num karabitchevski, acho que compreendi uma fração do que pode ser capaz o intelecto humano e de uma mente disciplinada e convicta de sua missão de transmitir a arte pura, pois se não houver pureza não existe arte.

Imaginemos, agora, não sete, mas vinte e três letrinhas apenas, unidas com o objetivo de projetar o ser humano a outras esferas, como projetar estas àquele, trazendo-lhe o Divino deleite. Pensemos então na responsabilidade que vem a ser o difundir a arte através da escrita. Acho que é para poucos convictos como deveria ser para tantos outros, curiosos e descompromissados.

A alegria de um escritor ao ver repercutir suas letras mundo afora e saber que de sua pena ou de suas digitais saíram conhecimento para o qual não existe intransponibilidade deve ser inconcebível. O mundo virtual permite isto a todos. Dentro desta condição jaz a dualidade perversa, capaz de despejar a chusma tóxica do mau gosto literário. Pelo menos se fica a conhecer a importância contida num ato tão simples, mas não tão fácil de ser executado com maestria. Não há, na vida, nada que seja tão fácil quanto escrever mal. Mas, é tão gostoso que brincamos com a atividade, encontrando palavras e juntando letrinhas; como a mãe boba encontra no solfejo inocente a felicidade de ninar o filho querido.
Professor Edgard Santos
Enviado por Professor Edgard Santos em 13/12/2012
Reeditado em 13/12/2012
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