O SER HUMANO: CRIADO E CRIADOR

Recebo de um amigo estudioso da área de Letras e de História, talentoso poeta e pesquisador, duas contribuições sobre o efeito do texto poético em relação ao receptor, quando de seu encontro com o texto, à leitura primeira. Aquela sensação de “estranhamento”, o inusitado que ocorre na cabeça do leitor, especialmente aquele que ama a Poesia como gênero literário e aceita a sua proposta de reflexão. Vejamos:

“O termo “estranhamento” que utilizas, seria a tradução de "ato epifânico" de que tratam alguns críticos... e que seria uma função ou missão da arte... No caso a poesia!” (1ª mensagem)

“Tenho o “ato epifânico” como o relato de uma experiência que a princípio se mostra simples e rotineira, mas que acaba por mostrar toda a força de uma inusitada revelação... ou ainda, segundo Affonso Romano de Sant'Anna, que tenta assim definir esse fenômeno pelo termo “revelação”, ou seja, um episódio provocado por atos comuns do dia-a-dia, que resulta num momento de êxtase em que se percebe uma “realidade atordoante”. E para Massaud Moisés, trata-se de um “instante existencial”, um momento quase sempre fugaz em que, no caso dos personagens de Lispector, tomados de uma “súbita revelação interior”, apercebem-se de seus destinos.” (2ª mensagem)

– Moisés Menezes, via Facebook, remessas em 26/09/2012.

Amigo poeta Moisés! Nunca me topei com a expressão "ato epifânico", o que pra mim é novidade. Não sei se a poderíamos ter como sinonímia, já que "Epifania" é, segundo o Aurelião: "aparição ou manifestação divina". E o que apontamos aqui é o "ato de estranhar (-se)", segundo a mesma fonte de dicionarização. É a sensação de novidade que surpreende o receptor, principalmente no instante da primeira leitura do poema, aquela sensação inusitada e insólita que alguns POEMAS (COM POESIA) nos propõem... E nada tem de "divinal", sendo manifestação inerente ao ser humano, exceto para aqueles que imaginam a Poesia como fonte imanente do "Divino", com a qual não concordo. Por sinal, a deploro, porque nega a capacidade do humano de ser criado e criador. Quanto à segunda mensagem, agora sim, ficou tudo mais palatável e palpável. Tudo muito humano, em nada “divinal”. O bom é que estamos discutindo a nossa própria ontogênese, à revelia de conceitos gerados fora da simples (e complexa) dimensão humana. Como poderíamos assinar os (nossos) atos emocionais e intelectuais se não fossem nossos, e, sim, provindos da suserania do Divino? Seríamos meros portadores da mensagem capaz de propor o “estranhamento”? Entendo que – para alguns poetas – qualquer ato divino é o próprio “alumbramento”. Mas parece não ser o nosso caso...

– Do livro QUINTAIS DO MISTÉRIO, 2012.

http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/3903327