A CRUZ DA SABEDORIA ESTÉTICA

Entendo que nem todas as obras poéticas são frutos do intuitivo, regadas pela inspiração em alta conta. Alguns criadores trabalham exaustivamente o verso, e, dependendo do patamar de sua instrução e vivências, conseguem poemas burilados de ótimo vigor estético, que é o caso, por exemplo, de João Cabral de Melo Neto e dos irmãos Campos, da "Poesia Praxis", a partir da década de 60, no Brasil. Cada um vê o mundo segundo o concebe... Há um "chinelo velho pra cada pé torto", segundo o dito popular. Concebo a Cultura simbolizada por uma "cruz", composta por dois braços, um vertical (escolaridade) e o outro horizontal (vivências). Tenho pra mim que, por volta dos setenta anos, o braço horizontal – a escola da vida – atinge o ponto máximo de acúmulos vivenciais, correndo sobre o trilho vertical. No ponto relevante e superior, em que os dois braços se juntam, formando a Cruz do Cristo, exsurge o nó górdio da Sabedoria humana. A arte poética que nasce neste momento é esteticamente sábia, formosa, plena de Confraternidade e Universalidade. Portanto, o mistério da criação, em Poesia, nasce da junção feliz entre a intuição e o que foi colhido nos livros. Catulo da Paixão Cearense e Patativa do Assaré, inicialmente matutos, na maturidade tornaram-se sábios. No Sul, Jayme Caetano Braun é outro genial sábio histórico-terrunho. Uma forte dose de intuição não dispensa o talento burilado, cinzelado pelo tempo, alargada a dose de inteligência e lucidez...

– Do livro QUINTAIS DO MISTÉRIO, 2012.

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