NA SELVA COM A INGRID BETANCOURT (sobre o livro, Não há silêncio que não termine)
Estou lendo sobre o que a Ingrid Betancourt passou nos sete anos presa no meio da selva com o pessoal das FARC.
Sabia que ia me emocionar, o livro é surpresa do inicio até onde estou no momento, primeiro parece um filme de ação daqueles! Em seguida, mesmo sabendo que ela não consegue fugir nos sete anos de cativeiro, torcemos a cada tentativa de fuga, que ela e sua colega tentam e são severamente castigadas, após cada tentativa.
Tentamos imaginar o terror que elas sentiram na primeira vez que tiveram que ir ao banheiro e se depararam com buracos no chão cheios de merda e milhares de moscas varejeiras, se uma entra em minha casa morro de nojo e trato de matá-la, imagine milhares?
A rotina no cativeiro, as horas intermináveis de nada a fazer, de baixo de um mosquiteiro de dois metros de comprimento.
O comportamento da colega, que a culpa por estarem ali, e a trata com rispidez, deixando-a mais sozinha ainda.
O comportamento das mulheres guerrilheiras e dos homens, de inicio são agressivos e a fazem sentir-se muito isolada, mas com o passar do tempo a convivência vai se estreitando e alguns deles se mostram até simpáticos com ela, as escondidas, pois tem um código entre eles que todos devem delatar todo comportamento diferente, e não pode haver amizades entre guerrilheiros e sequestrados.
Tem um momento em que Ingrid pede ao chefão, para bordar e ele permite, ela recebe o material e algumas mulheres passam a aprender a bordar também, ela aprende a fazer cinto com um dos rapazes, e resolve fazer para seu filho que fará aniversário, no dia do aniversário ela pede permissão para fazer um bolo, nessa hora me vi chorando, tamanha a beleza do que ela descreveu daquelas almas presentes.
Ela olhou os jovens guerrilheiros, da idades dos seus filhos, sorrindo, comendo, dançando, naquele momento ela sentiu pena deles, e como se fossem seus filhos também, percebeu que eram iguais, e uma ternura se faz naquela atmosfera festiva sem o aniversariante.
Mais uma vez eles mudam de lugar o acampamento, e sempre cada vez mais, mata a dentro, vamos sentindo o cheiro de podre das folhas, bichos em decomposição, a umidade da floresta, quase nos molhamos com as chuvas fortes...tamanho realismo do relato desse livro dramático e muito verdadeiro
vou parar por aqui, ainda estou lendo o livro.
Hoje cheguei na parte em que Ingrid completa um ano de cativeiro, vão para uma jaula de madeira, no meio da selva, o clima é de terror, com ameaça de morte, ela se vê em desespero quando um buraco é feito dentro do barraco de madeira em que elas estão, ela pensa ser a cova para seus corpos, só respira aliviada quando vê um vaso sanitário.
Uma macaquinha, após ter sua mãe morta pelo chefe dos guerrilheiros,
é presa por ele e passa a viver junto deles, amarrada em uma árvore, Ingrid se apega a ela e a chama de Cristina, logo a bichinha também se apega a ela, mas essa alegria é logo terminada com a vinda de dois cachorros, eles a comem, ela percebe que não pode se apegar a nada e nem a ninguém nesse cativeiro, um guarda noturno de bom coração, empresta um rádio de pilha, para que ela escute as notícias a noite e não enlouqueça. ele diz que reza por ela e lhe dá bons conselhos, mas logo é trocado, quando se percebe o quanto ele gosta dela, mas Ingrid se lembra do que ele disse, "você vai recuperar sua liberdade, nunca retribua uma agressão, cale-se diante das perturbações, você será vencedora, gosto de você", isso muito a fortaleceu, e o rapaz devia ter apenas uns dezessete anos.
Fizeram uma decoração de natal, improvisada, e na noite de natal, cantaram músicas juntos, no barraco de madeira da Ingrid e por uns momentos ela sentiu-se em casa.
Até agora eu não tinha percebido o tamanho da violência que essa mulher sofreu no meio dessa selva, com esses seres doentes, hoje recebi um e-mail onde ela é violentada sexualmente por muitos deles, é uma violência tão grande, que em nenhum filme pornográfico já vi algo assim, uma mulher frágil, sozinha, no meio do nada com monstros mascarados a violentando de todas as formas, filmando e ainda com uma música erudita ao fundo, em contraste com seu choro desesperado de dor, de vergonha e de revolta.
Me pergunto por que isso? Pra que tanta violência? O que essa organização deseja afinal? até agora não entendi direito se eles desejam libertar prisioneiros? se querem dinheiro? Se querem assumir o poder político?
Hoje ela se encontra com um senador, seu colega e ambos se unem em um desabafo e sente-se melhor, mais uma vez mudam o lugar do cativeiro.
Do pouco que li desse relato, estou cada vez mais admirada, que FORÇA essa mulher tem! Que lucidez! Nada que tenhamos sofrido chega perto da dor que essa mulher sentiu!
Me pergunto: Como está seu emocional hoje? Será que ela dorme com facilidade? O que sente em relação aos seus carrascos? Como ficou sua relação com Deus? Será que lida bem com sua libido?
Nesse momento estou na parte em que sua companheira que está grávida fica sozinha em um galinheiro, ela seu amigo Lucho, voltam para a prisão principal, onde os outros prisioneiros a invejam por ser a única citada nas reportagens.
Ela relata que naquelas condições os seres humanos deixam aflorar o que de pior tem em seu ser, inveja, ódio... até ela se vê se chateanda por uma porção a mais, que alguém recebe daquela coisa que eles comem, um ruido, coisas que em outras situações não teriam a menor importância, ali viram um casos de vida ou morte.
É o ser humano no limite da loucura, o que os alivia é SORRIR, nesse caso LUCHO, é muito importante, pois consegue fazer piadas. Me vi sorrindo quando ela nos conta que para passar as imensas horas vazias, sua amiga Glória, conseguiu um baralho e eles passam a jogar pela manhã, Ingrid e Glória contra Lucho e um outro, Elas fazem de tudo para ganhar e eles fazendo de tudo para perder, disso dependia o humor do resto do dia. Imaginem a cena!
Lucho é diabético dependente de insulina, naquelas condições há muito tempo que não é medicado, comendo aquela gororoba, é certo que terá uma crise, e teve, e a luta foi emocionante para mantê-lo vivo, só entre os prisioneiros, o enfermeiro das FARC, ignorou a crise dele, saiu de perto sem olhar o pobre homem. Por fim ele se recupera aos poucos e a memória vai voltando lentamente e seu bom humor também. Após uma conversa com um dos líderes Ingrid consegue que seu amigo receba um reforço na alimentação para fortalecê-lo e evitar as crises, o chefe diz que ele não recebe insulina porque não há refrigeração para conservar.
Ler esse livro com mais de quinhentas páginas é o mesmos que ficar na selva com aquela gente, eles são um mundo a parte, com gente ruim, assassina, com gente que ama, que é traído e trai, gente amiga, gente feliz, gente infeliz. É um mergulho profundo na alma humana. Acho que se Freud lesse esse livro, ia ter um ótimo material para suas teses.
Uma coisa curiosa é o comportamento dos outros prisioneiros, que sentem raiva por Ingrid está sempre sendo lembrada na mídia. Ela tem um rádio de pilha, e escuta a noite, a voz dos parentes que mandam mensagens, essas palavras são repassadas para os outros e servem de alento.
Sua amiga teve o filho no meio da selva e a criança vai para junto dos guardas das Farc.
Ingrid fica muito mal, seu corpo fraco e doente, não resiste mais é a pobre mulher, mesmo assim é obrigada a seguir para um novo acampamento, mas dessa vez ela não consegue andar, então um guerrilheiro a carrega nas costas. No caminho ela é atacada abelhas.
Não podemos imaginar o que essa mulher sentiu ao ter esses insetos por todo seu corpo, eles não a picava, mas a incomodava muito.
Finalmente terminei de ler esse livro incrível!
Não contarei o final, deixo para você ler, é demais! como um filme de emoção.
Emocionante até o último momento, importa saber que a força da família, do amor, a manteve viva todos esses anos de torturas. Nessa hora faz toda a diferença ter uma família estruturada, uma mãe de verdade e filhos amados, quanto ao marido? Bem isso já é um caso a parte, que acho que não cabe aqui se falar, acredito que apenas uns raros homens, sabem amar além do prazer que seu pênis produz, poucos homens mantem seu amor firme além do aqui e o agora.
Quero deixar aqui meu mais profundo respeito por essa mulher, que na minha opinião é uma heroína de verdade.
Esse livro é o resultado de uma narrativa delicada, de uma realidade muito mais feroz, que nos faz ver com olhos de sentimentos, e até de tentar entender as realidades de cada algoz, que nada justifica tamanha violência, mas de uma certa forma nos mostra outras óticas de vida, de sentimento de liberdade e escravidão.
Já li muitos livros nessa minha vida, mas esse é sem sombra de dúvida o melhor biográfico, que já li.
Acompanhei pelo noticiário sua saga no cativeiro, rezei por ela, e me alegrei com sua libertação, quando a vi na televisão, mas jamais pensei em dividir momentos diários com ela, no seu cativeiro, torcer por suas tentativas de fuga, mesmo sabendo que não conseguia.
PARABÉNS INGRID!!! Tenha certeza tudo que passastes deve ter um motivo de crescimento de alma, e você já demonstrou que sua alma é gigante.
Fiquei sabendo que esse livro foi escrito por ela em uma montanha cheia de neve, ela mergulhava nessa selva para escrever e depois ia até a janela e via a neve, sentia a liberdade, foi escrito em um ano e um pouco mais, um dia eu gostaria de ter essa delicadeza ao relatar um texto tão violento, essa autora é de uma alma linda! Buscando na internet sobre algumas interrogações que o livro não esclarece... E sua amiga com o filho? Lucho? Vi vídeos deles todos em liberdade, o menino é uma gracinha! Mas sua mãe é bem aquela mulher descrita no livro, acho que a autora amenizou, ela demonstra um enorme desequilíbrio no falar muito rápido e um olhar de inveja, faz comentários que não devia ser feito e as pessoas que deixam mensagem, falam muito mal da Ingrid, achei horrível! Mas fiquei feliz em saber que pelo menos aqueles seres sofridos se libertaram e que aquele menino gerado no meio da violência, criado por eles, terá uma chance de não ser um deles.
Ouvi uma reportagem da Ingrid, que ela fala que tem pesadelos terríveis, e sente dificuldades para dormir, que na selva era uma escuridão total a noite, que não via a própria mão, que passou anos amarrada em árvores, que era humilhada de todas as formas, mas a serenidade em seu rosto, nos ensina que podem atacar nosso corpo, e nos ferem muito, mas a beleza da alma fica intacta, poque essa é a essência de Deus.
Anida bem que o Jô Soares não fez nenhuma piada com ela, quando a entrevistou em seu programa, foi educado e a deixou a vontade para falar sobre essa terrível vivencia.