Curso Produção de Textos - Encontro 2
Olá, querido colega.
Continuemos o nosso Curso Produção de Textos.
"Encontro 2"
" A Inflexão Textual"
Inflexão é o ato de alterar o tom da voz, dando realce ao texto falado.
No texto escrito, não contamos com o poderoso recurso da INFLEXÃO oral, o que ocasiona um grande problema para os escritores, sobretudo os iniciantes.
Observe:
Suponha que um autor escreva a seguinte frase:
"Eu te odeio."
Pense nas inúmeras possibilidades que esta frase pode representar.
Vamos contextualizar a frase:
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Maria está vestida de noiva. Uma mulher chega de supetão e fala:
- Tu vais casar, teu noivo é lindo e rico e, ainda por cima, ele te ama muito. Eu te odeio.
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Vamos agora pensar em duas possibilidades para um autor escrever esta cena.
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Possiblididade 1. As mulheres são inimigas.
Maria está vestida de noiva. Uma mulher (sua inimiga) chega de supetão e fala:
- Tu vais casar, teu noivo é lindo e rico e, ainda por cima, ele te ama muito. Eu te odeio.
Análise:
Aqui, a inimiga de Maria tem raiva, inveja. A inflexão será em tom agressivo, forte.
- Aqui: "Eu te odeio" significa: Eu te odeio!
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Possiblididade 2. As mulheres são amigas.
Maria está vestida de noiva. Uma mulher (sua amiga) chega de supetão e fala:
- Tu vais casar, teu noivo é lindo e rico e, ainda por cima, ele te ama muito. Eu te odeio.
Análise:
Aqui, a amiga de Maria brinca com a "sorte" da amiga, talvez por ela mesma desejar se casar, ser amada como a amiga. É uma "inveja" boa, entre amigos.
- Aqui: "Eu te odeio" significa: Ai, como você é sortuda e eu não!
Muita diferença entre uma forma e outra de ler "o mesmo texto".
Como então traduzir para a forma escrita a inflexão?
Como um escritor pode, sem precisar explicar, inserir em seus textos as milhões de intensões que podemos dar à mensagem quando falamos?
A resposta é: Pontuação + Interjeição + Sensibilidade.
Observe, atente para as pausas da pontuação e leia em voz alta:
Possiblididade 1. As mulheres são inimigas.
- Tu vais casar. Teu noivo é lindo... e rico e, ainda por cima, ele te ama muito. Afff... Eu te odeio!!!
Possiblididade 2. As mulheres são amigas.
- Tu vais casar, teu noivo é lindo, é rico e, ainda por cima, ele te ama muito... Ah, nega, Eu te odeio!
Leves mudanças de pontuação produzem ritmos diferentes de leituras.
O escritor precisa dominar a Inflexão Textual para que possa preencher com "subtextos" as suas mensagens, fazendo elas "expressarem" muito além do que está "escrito", fazendo ARTE, portanto.
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Observe alguns mecanismos de manipulação da palavra:
Gostei imensamente de sua voz.
- Eu posso intensificar este "gostar":
Gostei, imensamente, de sua voz!
Atente ao fato de a pausa, causada pelas vírgulas, ressaltarem a palavra "imensamente", tornando-a ainda mais intensa.
Outro exemplo:
O homem que pensa é considerado homem.
- Eu posso diferenciar as palavras homem (qualquer homem ou Ser humano). Observe:
O homem que pensa é considerado Homem.
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(Uso de maiúscula)
Ainda...
- Na frase abaixo eu digo que "todo" homem pensa, portanto, todos são "Homens".
O homem, que pensa, é considerado Homem.
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Oração Adjetiva Explicativa
- Já na frase seguinte eu digo que "apenas" o homem que pensa é considerados "Homem".
O homem que pensa é considerado Homem.
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Oração Adjetiva Restritiva
Assim, percebemos que a Gramática não é apenas um "conjunto de regras", e sim um "arsenal" de ferramentas que podemos utilizar para executar a ARTE de ESCREVER.
Observe:
"porque és o avesso do avesso do avesso do avesso"
- Caetano Veloso.
Vamos entender primeiro o que significa literalmente:
"Algo" é o avesso (lado contrário) do avesso do avesso do avesso.
Temos 4 vezes a palavra "avesso"... Que resulta:
Algo é o...
avesso - lado contrário
avesso do avesso - lado certo
avesso do avesso do avesso - lado contrário
avesso do avesso do avesso do avesso - lado certo
Ou seja:
"porque és o avesso do avesso do avesso do avesso"
é o mesmo que:
"porque és o lado certo"
Mas por que motivo o autor preferiu repetir 4 vezes a mesma expressão em vez de dizer logo: Você é o lado certo.?
Observe:
Ele poderia ter dito: Você é o lado certo.
E a mensagem terminaria aí. Pouco Artística, com poucas ideias, sem subtextos. (Dentro de outro contexto, talvez esta frase fosse a ideal. Mas não numa poesia musicada. Ele precisava de ritmo, de repetição de sons, de ênfase no que é "avesso".)
Na verdade, o mestre Caetano disse muito. E disse muito em poucas palavras, Observe:
"porque és o avesso do avesso do avesso do avesso"
Análise Subtextual:
- A repetição nos diz que este "algo" vira-se, revira-se, parece contrário, parece certo, parece contário de novo, mas no fim das contas este "algo" é o lado certo.
- Caetano retira do "algo" a capacidade de ser o lado certo ou contrário, e entrega a ele mesmo o direito de definir: ele olha: parece oposto, olha de novo: parece certo... Ou seja: é "algo" que, para ele, é um tanto confuso, que precisa de mais observação para, enfim, concluir que se trata do lado certo:
"porque és o avesso do avesso do avesso do avesso"
- Ou seja, o Autor escreve em poucas palavras um "sem número" de informações, que deixam seu texto rico, inteligente e instigador.
Escrever nada mais é do que brincar de quebra-cabeças com as palavras.
Vamos, aos poucos, conhecendo e utilizando elementos importantes na formação de um Escritor, dominando nossas ferramentas de trabalho e produzindo textos brilhantes, entendíveis que nos traduzam em "essência" para o mundo.
Boas leituras.
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