Encontro com o passado

Prólogo:

Um mito é uma narrativa sobre a origem de alguma coisa (origem dos astros, da Terra, dos homens, das plantas, dos animais, do fogo, da água, dos ventos, do bem e do mal, da saúde e da doença, da morte, dos instrumentos de trabalho, das raças, das guerras, do poder, etc.).

Ocorre que Luzia não é um mito. Ela existe e já existiu em outro tempo de forma infinitamente amorosa, tal qual hoje, feminil e santificada pela graça do esplendor de sua gênese.

Neste texto conto o momento de quando houve uma descoberta ou reencontro de almas afins. Um inusitado encontro de seres que vivenciaram uma esplendorosa história de amor digna dos mais subidos louvores. Isso aconteceu no ano de 1647. Nessa existência Luzia era uma adolescente, igual a tantas outras de sua idade, cheia de dúvidas curiosidades e sonhos coloridos.

Henrique, mais velho do que sua consorte, vivia uma vida simples, meio fastidiosa, sob a égide do medo e da traição dos seus vizinhos sempre ávidos por uma vantagem econômica. Naquela ocasião a Igreja lastrava-se pela força do violento e desrespeitoso Tribunal da Inquisição.

Esse mito narra ou uma guerra entre forças divinas ou uma aliança entre elas para provocar alguma coisa no mundo dos homens, dos apaixonados pela vida, dos que se definem como sendo semideuses, que vivem nus a espera de quem lhes vistam com o manto sagrado da glória santificada.

Luzia e Henrique viveram essa história e desencarnaram pela força maligna da inveja, da prepotência, do insano desejo de progresso a custa do sangue inocente dos espíritos afins e em franca e necessária provação.

O ano de 2010 foi o escolhido para o reencontro dos que se conheceram muito antes, isto é, em 1647. Os desejosos em resgatar um passado eivado de glórias e gozos inacabados, sofridos e agoniados reencontraram-se sem uma pretensão descabida, mas com um propósito audacioso e dignificante.

Os pudores seriam vencidos. As amarras das obliterações seriam quebradas para que eles se conhecessem na plenitude dos seus anseios.

– Henrique! Onde está você? Não adianta se esconder... Eu vou lhe achar esteja onde estiver. – A voz aflautada de Luzia emudecia os pássaros do bosque da raposa quando ela resolvia não apenas falar, mas gritar e até sussurrar ao ouvido de seu amado que se escondia sempre atrás da mesma árvore frondosa que lhes servia de abrigo e esconderijo nas tardes chuvosas do inverno rigoroso do lugarejo onde habitavam.

– Estou aqui! – falava o adolescente Henrique que adorava ficar seminu (vestindo apenas uma camisa bege sobre um calção azul) a espreita da menina branca e loira que se embrenhava entre os arbustos, guiada apenas pelo som da voz do traquina namorado.

Os notáveis leitores poderão sabiamente perguntar: “Você está escrevendo sobre filosofia ou um mito?” – Respondo dizendo que escrevo sobre um devaneio que poderá ser considerado um mito ou filosofia. A interpretação do contexto será dada pelas mentes fantasiosas de cada leitor.

Ora, o mito busca narrar como as coisas eram ou tinham sido no passado imemorial, longínquo e fabuloso, voltando-se para o que era antes de tudo existisse tal como existe no presente. A filosofia, ao contrário, preocupa-se em explicar como e por que, no passado, no presente e no futuro (isto é, na totalidade do tempo), as coisas são como são. Não compreendeu? Isto é filosofia! Entendeu? Isto é mais do que um mito... É a pura realidade!

Luzia e Henrique existem e se identificarão com o que ora escrevo porque eles são mais do que um mito. Eles são a realidade de um passado que se fez presente pela força do inexorável destino.

Não foi à-toa que Walter José de Carvalho Bezerra escreveu no Portal do Espírito:

“Realmente não existem coincidências. No Universo, a Inteligência Suprema que a tudo e todos dirige, traça um plano individual e coletivo para toda a humanidade, em todos os planos e mundos, conhecidos e desconhecidos dos sentidos limitados dos homens de nosso planeta. Portanto, concordamos em que não existe o "acaso". Também não acreditamos no destino da maneira como tem sido forjado pela mente humana.

Acreditamos no Amor. Acreditamos na Lei de Reprodução, Justiça, Amor e Caridade. Acreditamos que os espíritos, encarnados e desencarnados, se buscam nas multidões deste Universo fantástico e magnífico. Em "O Livro dos Espíritos", na pergunta 386, encontramos: "Podem dois seres que se conheceram e estimaram encontrar-se em outra existência corporal e reconhecer-se?"

A resposta dos Espíritos Superiores dada a Allan Kardec foi:

"Reconhecer-se não. Podem, porém, sentir-se atraídos um pelo outro.

E, frequentemente, diversa não é a causa de íntimas ligações fundadas em sincera afeição. Os dois seres se aproximam devido a circunstâncias aparentemente fortuitas, mas que na realidade, resultam da atração de dois Espíritos, que se buscam reciprocamente por entre a multidão”.

Só que, na verdade, podem não ter se conhecido em outras existências, mas são espíritos afins ou por ideais ou por sentimentos ou por necessidades. São espíritos simpáticos. Não podemos esquecer que isto não quer dizer estarem no caminho do bem.

Nossos sentimentos, objetivos e idéias podem estar distorcidos, não acompanhando a Lei Divina. Como também podemos dizer: Somos antipáticos àquele grupo. Mas isso acontece porque nossas ideias se contrapõem às deles, por já conhecermos ou recordarmos a Lei de Deus, que está gravada em nossa consciência.

Também acreditamos que dois espíritos possam encarnar para um dia se encontrarem e muito se amarem. Existem, sim, conforme citado por Saulo de Tarso do CEPEAK, as uniões, provacionais, sacrificiais, afins e transcendentais.

A maioria das uniões são provacionais, onde duas almas se encontram em processo de reajustamento. Daí as desarmonias, a desconfiança, os conflitos. Mas, também, entendemos que o verdadeiro casamento ou união é o casamento ou união de “almas”. Os outros são relações de amizade, ajuda mútua ou mesmo ajuste de contas.

A união sacrificial é aquela em que uma alma iluminada se propõe a ajudar uma alma que se atrasou na sua jornada evolutiva. A união afim é aquela que reúne almas esclarecidas que muito se amam.

As pessoas sentem como que se já tivessem se encontrado antes. E o amor é profundo, em paz e harmonia. A união transcendente é aquela de almas engrandecidas no bem que se reencontram no plano físico para grandes realizações.

Não importam, nestes casos (afins e transcendência), as diferenças culturais ou sociais. Ao longo de nossa existência e trabalho na Seara Espírita e dedicação a estudos e pesquisas, seja no espiritismo experimental, filosofia ou religião, chegamos também a conclusão que, a medida que o homem evolui do Reino Hominal para o Reino Espiritual, sem hipocrisia, como nos alerta o Prof. José Herculano Pires, e agindo de acordo com as Leis Divinas (Leis Naturais), mesmo as pessoas casando-se mais de uma vez, para o plano maior o que vale é o casamento de almas, ou seja, a combinação vibratória de dois seres.”.

Henrique e Luzia são almas esclarecidas que se encontraram para dar continuidade às suas provações. Quando eles desencarnaram no ano de 1647 não sabiam que um dia se encontrariam. Eles foram surpreendidos no meio de suas caminhadas.

Agora, passados trezentos e dois anos (em 1949), Henrique reencarnou na América do Sul, no Brasil, no Estado da Paraíba e, passados exatos dezessete anos (em 1966) depois de seu parceiro iniciar uma nova provação... Luzia readquiriu um corpo material em um Estado da Região Norte.

Explico que só no ano de 2010 Henrique e Luzia se reencontraram após seus necessários reencarnes em anos diferentes (1949 e 1966 respectivamente). Henrique acreditava que o amor é tais quais as ondas hertzianas, que vibram como microondas medias e longas.

Ele (o amor) ainda é muito mais, porquanto invade todas as frequências e auxilia em todas as distâncias, da mínima à máxima, levando a mensagem de esperança, de alegria, de caridade e da existência de Deus.

Ocorre que o autodidata não sabia se Luzia professava as crenças dele e essa dúvida havia sido, há pouco tempo, esclarecida em um sonho demasiado belo e colorido quando Henrique ouviu uma voz reconfortante que dizia:

“Se por acaso sofreis a estranha doença da melancolia, com saudades profundas de alguém que não conheceis no presente, não desdenheis a vida por esse fato. Essa alma existe em algum lugar e também sofre, com certeza, as mesmas consequências. Sede inteligente: apurai os sentimentos, desdobrai a tolerância e aumentai a fé em Deus, que o encontro há de se dar, mais cedo ou tarde, por sintonia, pois, na matemática divina, a equação é...AMOR.”.

Luzia é inteligente e possui o controle de sua própria vida. Intrigada pela personalidade enigmática, distante, um tanto quanto surreal de Henrique, ela mergulha em um relacionamento de pura sensualidade que se intensifica tornando-a sonhadora e dependente dos devaneios eróticos, de fantasia e dominação imaginados e escritos pelo poeta das ilusões.

Em pouco tempo ela já sonhara com seu consorte Henrique praticando atos desejados, reprimidos e recônditos por muitos anos. Muito breve ela precisaria escolher: entre seus desejos... e sua sanidade ou equilíbrio mental; sua crença e afeição latente prestes a eclodir.

Provavelmente Luzia não atinara, ainda, para uma verdade: Amar é ato sagrado, principalmente entre as criaturas que já atingiram ponto elevado do ambiente da felicidade. Quando o amor não duvida, ele cura, alegra, conforta, faz todas as virtudes brilharem por todos os roteiros, permanentemente.

Henrique seria o seu guia. Mais experiente, ele lhe transmitiria seu aprendizado e convicção: Não há almas que desde suas origens, estejam predestinadas a união. Cada um de nós não tem, nalguma parte do Universo, sua metade, a que fatalmente um dia reunirá. Não há união particular e fatal, de duas almas.

A união que há é a de todos os Espíritos, mas em graus diversos, segundo a categoria que ocupam, isto é, segundo a perfeição que tenham adquirido. Quanto mais perfeitos, tanto mais unidos. Da discórdia nascem todos os males dos humanos; da concórdia resulta a completa felicidade.

CONCLUSÃO

No sagrado mistério da vida cada coração NÃO possui no Infinito a alma gêmea da sua companheira divina para a viagem à gloriosa imortalidade. NÃO SÃO Criadas umas para as outras, as almas parecidas se buscam, sempre que separadas, para se fortalecerem e juntas buscarem suas eternas luzes.

Embora sejam diferentes, até por conta de seus progressos individuais, a união perene é-lhes a aspiração suprema e indefinível.

Milhares de seres, se transviados no crime ou na inconsciência, experimentam a separação das almas que os sustentam, como a provação mais ríspida e dolorosa, e, no drama das existências mais obscuras, vemos sempre a atração eterna das almas que se amam mais intimamente, evolvendo umas para as outras, num turbilhão de ansiedades angustiosas, atração que é superior a todas as expressões convencionais da vida terrestre.

Quando se encontram, no acervo dos trabalhos humanos, sentem-se de posse da felicidade real para os seus corações — a da ventura de sua união, pela qual não trocariam todos os impérios do mundo, e a única amargura que lhes empana a alegria é a perspectiva de uma nova separação pela morte, perspectiva essa que a luz da Nova Revelação veio dissipar, descerrando para todos os espíritos, amantes do bem e da verdade, os horizontes eternos da vida.

Ao encontrar Luzia no mundo virtual Henrique quis saber se encontrara sua alma gêmea e para isso fez uma consulta espiritual.

Buscou e encontrou a seguinte resposta dada pelo Espírito Emmanuel:

"Separadas ou unidas, nas experiências do mundo, as almas irmãs caminham, ansiosas, pela união e pela harmonia supremas, até que se integrem, no plano espiritual" - (deixa a entender que a integração, de fato, ocorre no plano espiritual em estágio de harmonia suprema.). Dúvidas! Dúvidas! Dúvidas! Infinitas dúvidas!

A resposta era em forma de parábola. A mente atrasada do autodidata Henrique estava povoada de dúvidas. Ele não sabia, ao certo, se encontrara sua alma irmã, gêmea ou afim.

André Luiz (espírito), cita exemplo de casal de encarnados: Adelino e Raquel são Espíritos associados de muitas existências em comum, partilham o mesmo cálice de dores e alegrias terrestres.

Na atualidade, durante o sono, seus corpos repousam um ao lado do outro, no mesmo leito; entretanto, cada um vive em plano mental diferente. E muito difícil estarem reunidas nos laços domésticos as almas da mesma esfera.

• Raquel, durante a emancipação de sua alma, fora dos veículos de carne, pode ver a avozinha, com quem se encontra ligada no mesmo círculo de elevação.

• Adelino, porém, somente poderá ver Segismundo, com quem se encontra imantado pelas forças do ódio que ele deixou, imprudentemente, desenvolver-se, de novo, em seu coração...

Esquecendo o campo espiritual, pois o tempo certamente se encarregaria de aclarar suas dúvidas Henrique fez uma seleção de sete filmes para assistir inúmeras vezes. Nessas películas, onde o sexo selvagem impera, ele consolidaria seu aprendizado e passaria a refletir sobre as suas reais necessidades afetivas reais e convencionais.

Luzia, sua consorte mais íntima, seria concitada a assistir os mesmos filmes tendo em vista o seu aperfeiçoamento nas técnicas sexuais e ser encorajada a romper os grilhões que lhe obstavam as realizações de suas fantasias mais reprimidas por força de sua formação religiosa e familiar.

Após ambos assitirem todos esses filmes poderiam, Luzia e Henrique, avaliar suas crenças no ENCONTRO COM O PASSADO.

São esses os filmes selecionados:

ÚLTIMO TANGO EM PARIS (1972)

Atores: Maria Schneider e Marlon Brando

INSTINTO SELVAGEM (1992)

Atores: Sharon Stone e Michael Douglas

CORPOS ARDENTES (1981)

Atores: Kathleen Turner e William Hurt

ATA-ME! (1990)

Atores: Victoria Abril e Antonio Banderas

CIDADE DOS SONHOS (2001)

Atores: Naomi Watts e Laura Harring

9 e 1/2 SEMANAS DE AMOR (1986)

Atores: Kim Basinger e Mickey Rourke

BONITINHA MAS ORDINÁRIA (1981)

Atores: Lucélia Santos e cinco atores

Após assistir quaisquer desses filmes Luzia tinha sonhos eróticos e Henrique explicava que, de um modo geral, estes sonhos podem ocorrer em caso de abstinência sexual prolongada, hiperfunção glandular ocasional, desejos insatisfeitos ou ânsias recolhidas.

Os sonhos da professora Luzia deixavam Henrique com mais dúvidas do que o normal quando ele se aventurava a compreender o intangível conceito de eternidade. Por isso Henrique fez uma consulta ao seu dicotômico Wilson.

Ele tinha a absoluta certeza de que não ficaria sem uma resposta esclarecedora à luz de seus conhecimentos e da ciência já tão avançada nesse assunto intangível. Foi assim que, com a voz suave e ar professoral, Wilson explicou ao Henrique silente e atento:

“Hoje, a análise dos sonhos é uma técnica indispensável no tratamento de neuroses, já que nos sonhos podemos encontrar causas e motivações inconscientes dos conflitos. Conflitos estes que se escondem atrás de distúrbios psicossomáticos.

Os sonhos revelam: Desejos secretos, medos, amores e ódios. Os sonhos podem, ainda, libertar nossas inibições, e também libertar emoções doentias que estão acumuladas. Emoções que, durante o dia, não são permitidas pela sociedade.

Os sonhos maus, nos quais cometemos atos antissociais revelam que temos tendência criminosa e é preciso estar atento quanto a um pensar destruidor, pois, mais tarde, a aversão com pessoas que nos rodeiam, fantasias sexuais irreprimíveis ou tendência criminal pode ocasionar uma doença emocional muito agressiva.

Mas os sonhos nos levam, ainda, o desejo da volta à infância, pois se a vida atual não é agradável, desejamos nos recolher e voltar à infância, quando não tínhamos problemas, preocupações... E o sonho pode, ainda, ser bipolar, descrevendo emoções antagônicas como amor e ódio ao mesmo tempo.

Essa função do sonho (função bipolar) muitas vezes se junta a uma sétima função, que é a repressão. De acordo com o meio social em que vivemos, não podemos satisfazer a maioria de nossos desejos. Não podemos esquecer que somos humanos e limitados! Durante o sono, estes desejos encontram sua válvula de escape através dos sonhos.

Na psicanálise, os sonhos servem para informar o analista como anda o seu progresso no tratamento e, ao trazer à tona do consciente o que está reprimido no inconsciente a pessoa começa a alcançar um ajustamento emocional satisfatório, que faz toda a diferença em sua vida...".

Continuava explicando o poeta eclético. Ah! Se Henrique fosse assim tão arguto quanto o seu univitelino Wilson:

"... Certamente os sonhos são indicadores de algo escondido no íntimo de cada sonhador e as condições físicas, como fome, indigestão, dores, podem influenciar a natureza de um sonho.”

UM SONHO DE LUZIA

Num desses sonhos Luzia percorre um corredor escuro, estreito e profundo, com paredes em pedra e, aqui e além, archotes acesos iluminavam o caminho. À sua frente seguiam dois vultos, cobertos com uma capa e capuz, olhando para trás via mais dois personagens tétricos. Não conseguia ver-lhes o rosto nem distinguir-lhes o sexo.

Sentia-se presa entre eles, enquanto caminhava em passos cadenciados, em sintonia com os deles. Luzia estava descalça e o seu corpo coberto por uma capa negra, igual à dos seus acompanhantes, guardas ou salvadores.

Por baixo da capa estava nua, antes vestia um negligê negro, de seda, que apertava de lado com uma fita verde, finíssima. Seus condutores se aproximaram por trás e puxando-lhe os cabelos forçavam-na a ficar de joelhos.

No seu rosto, que tateou trêmula, enlouquecida, num misto de desejo e aflição, sentiu uma máscara que lhe cobria olhos, nariz e parte das faces. A boca estava livre e isso deixava Luzia menos aflita, mais aliviada.

Agora os quatro condutores estavam em sua volta. Todos nus, sob suas vestes escuras, pareciam fantasmas vorazes e pegajosos. Ainda de joelhos Luzia tinha sua cabaça empurrada ao encontro dos corpos surreais. Sua boca se abria e ela se sentia invadida por todos os algozes de sua via crúcis. Um após outro... Todos lhe invadiam entre tapas, gritos, xingamentos e bordoadas lancinantes. O tempo era interminável.

De repente um vulto dourado surgia na penumbra do corredor escuro. Em sua volta uma aura, azulada e tênue, emitia fulgores como flocos de neve com a mais branca das alvuras. A proximidade da figura lampejante fez os demônios negros abandonarem a abstida Luzia que, ainda de joelhos, chorando, golfava esguichos de uma gosma esbranquiçada de sua boca trêmula.

O paladino, agora mais perto, aspergia um cheiro cítrico e suave, seus dentes à amostra sugeriam um encanto de felicidade ansiada. De seu pescoço varonil pendia um trancelim de ouro onde na extremidade balouçava um pingente em forma graciosa e delicada de uma letra “H”.

Sem emitir uma só palavra o ser espectral abraçou Luzia e nesse instante suas auras se amalgamaram, fundiram-se forte, exteriorizando e marcando o encontro com o passado.