O NARRADOR EM “O PRIMO BASÍLIO”, DE EÇA DE QUEIROZ
O narrador é a entidade responsável pelo discurso narrativo, através da qual uma história é contada. Possui posição privilegiada dentro da trama narrativa. Dependendo de sua posição na diegese, o narrador pode ser classificado como portador de diversas características.
No romance realista “O Primo Basílio”, de Eça de Queiroz, o narrador se apresenta como heterodiegético, pois este narra os acontecimentos em terceira pessoa, não exercendo atuação direta na obra, isto é, não se comporta como um personagem.
“Luísa ficou imóvel. Uma lagrimazinha redonda, clara, rolava-lhe pela asa do nariz. Assoou-se muito doloridamente. Aquela Juliana! Aquela bisbilhoteira! De má! Para fazer cizânia!” (QUEIROZ, 1994, p. 34.)
Esta forma de intervenção é resultante da técnica do discurso indireto livre. Este tipo de discurso possibilita intercalar as falas do narrador às das personagens, de modo que produz uma dificuldade na identificação quanto ao ser que profere tal fala. Tal recurso é propício para que o narrador se camufle na teia narrativa dos discursos e se disfarce, para poder inserir seu posicionamento critico (irônico, nesta obra) sobre a história narrada.
Outra característica do narrador queiroziano é sua focalização onisciente, em que o mesmo detém o conhecimento absoluto dos fatos, bem como das instâncias íntimas das personagens, capaz de penetrar em seus pensamentos e emoções (sondagem psíquica).
“Luísa espreguiçou-se. Que seca ter de ir se vestir! Desejaria estar numa banheira de mármore cor-de-rosa, em água tépida, perfumada, e adormecer! Ou numa rede de seda, com as janelas cerradas, embalar-se, ouvindo música!” (QUEIROZ, 1994, p. 20.)
Apesar de sua onisciência e intervenção na narrativa, o narrador concede um foco externo à obra de Eça, pois atribui maior relevância às ações externas das personagens em oposição à introspecção das mesmas. Pelo fato de o agente que narra se portar na terceira pessoa, há um distanciamento entre leitor e as personagens. Contudo, o discurso adotado no texto possibilita a aproximação entre estes elementos e garante uma identificação entre quem lê e/ou narra a história e quem vivencia a trama narrativa.
É possível observar que o narrador mostra uma criticidade mordaz (porém, de forma dissimulada) acerca do comportamento das personagens, descrevendo suas hipocrisias, vícios e toda a falsidade por trás das máscaras. Em suma, o papel do narrador em “O Primo Basílio” é a crítica voltada para a constituição da família, célula central da sociedade, esmiuçando os falsos pilares que a alicerçam. Entre eles, o narrador destaca o casamento por conveniência e a questão do adultério.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
QUEIROZ, Eça de. O Primo Basílio. São Paulo: FTD, 1994.