Um clássico é clássico não porque esteja conforme a certas regras estruturais ou se ajuste a certas definições (das quais o autor clássico provavelmente jamais teve conhecimento). Ele é clássico devido a uma certa juventude eterna e irreprimível. (página 22)
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O que é literatura?
Literatura é linguagem carregada de significado. Grande literatura é simplesmente linguagem carregada de significado até o máximo grau possível. Enfim, literatura é novidade que PERMANECE novidade. (28)
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Escritores, Criação, Resultados
Se nos dispusermos a ir em busca de "elementos puros" em literatura, acabaremos concluindo que ela tem sido criada pelas seguintes classes de pessoas:
1. Inventores
Homens que descobriram um novo processo ou cuja obra nos dá o primeiro exemplo conhecido de um processo.
2. Mestres
Homens que combinaram um certo número de tais processos e que os usaram tão bem ou melhor que os inventores.
3. Diluidores
Homens que vieram depois das duas primeiras espécies de escritor e não foram capazes de realizar tão bem o trabalho.
4. Bons escritores sem qualidades salientes
Homens que tiveram a sorte de nascer numa época em que a literatura de seu país está em boa ordem ou em que algum ramo particular da arte de escrever é "saudável". Por exemplo, homens que escreveram sonetos no tempo de Dante, homens que escreveram poemas curtos no tempo de Shakespeare ou algumas décadas a seguir, ou que escreveram romances e contos, na França, depois que Flaubert lhes mostrou como fazê-lo.
5. Beletristas
Homens que realmente não inventaram nada, mas que se especializaram em uma parte particular da arte de escrever, e que não podem ser considerados "grandes homens" ou autores que tentaram dar uma representação completa da vida ou da sua época.
6. Lançadores de modas
Sem maiores comentários.
Enquanto o leitor não conhecer as duas primeiras categorias, será incapaz de "distinguir as árvores da floresta". Ele pode saber de que "gosta". Ele pode ser um "verdadeiro amador de livros", com uma grande biblioteca de volumes magnificamente impressos, nas mais caras e vistosas encadernações, mas nunca será capaz de ordenar o seu conhecimento ou de apreciar o valor de um livro em relação a outros, e se sentirá ainda mais confuso e menos capaz de formular um juízo sobre um livro cujo autor está "rompendo com as convenções" do que sobre um livro de oitenta ou cem anos atrás. (43)
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Produzindo arte com inteligência
A linguagem é um meio de comunicação. Para carregar a linguagem de significado até o máximo grau possível, dispomos - como já foi acentuado - de três meios principais:
1. Projetar o objeto (fixo ou em movimento) na imaginação visual.
2 . Produzir correlações emocionais por intermédio do
som e do ritmo da fala.
3 . Produzir ambos os efeitos estimulando as associações (intelectuais ou emocionais) que permaneceram na consciência do receptor em relação às palavras ou grupos de palavras efetivamente empregados. (55)
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Das cuidadosas palavras
A incompetência se manifesta no uso de palavras demasiadas.
O primeiro e o mais simples teste a que o leitor deve
submeter o autor é verificar as palavras que não funcionam; que não contribuem em nada para o significado ou que distraem do fator MAIS importante do significado em favor de fatores de menor importância. (63)
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Crítica e beleza
Uma definição de beleza: adequação ao objetivo.
Quer se trate de uma definição boa ou não, é fácil constatar que uma boa dose de crítica RUIM foi escrita por homens que presumiam que o autor estivesse tentando fazer algo que ele NÃO estava tentando fazer.
O crítico honesto deve contentar-se em encontrar uma parcela MUITO PEQUENA da produção contemporânea digna de atenção séria; mas deve também estar pronto para RECONHECER essa parcela, e para rebaixar de posto uma obra do passado quando uma nova obra a supera. (89)
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A inesquecível primeira vez
A primeira fase dos escritos de qualquer pessoa sempre mostra o autor fazendo algo "parecido com" algo que ele já ouviu ou já leu.
A maioria dos escritores nunca ultrapassa esse estágio.
Em Londres, não faz muito, em 1914, a maioria dos
poetastros ainda estranhava a idéia de que a poesia fosse uma arte; eles achavam que a poesia devia ser feita sem qualquer análise, tinha que "brotar".
É precisamente aqui que tem lugar o sistema usual de sofismar com meias-verdades. De fato, as melhores obras provavelmente "brotam", mas só depois que a técnica se tornou uma "segunda natureza", e o escritor não precisa mais pensar em cada detalhe. A força, o impulso etc, seguem a intenção principal, sem dano para a unidade do ato. (76)
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Profetas, ouçamo-los sempre!
Os artistas são as antenas da raça.
Um problema mais grave requer a analogia biológica: os artistas são as antenas; um animal que negligencia os avisos de suas percepções necessita de enormes poderes de resistência para sobreviver.
O homem lúcido não pode permanecer quieto e resignado enquanto o seu país deixa que a literatura decaia e que os bons escritores sejam desprezados.
A literatura não existe num vácuo. Os escritores, como tais, têm uma função social definida, exatamente proporcional à sua competência COMO ESCRITORES. Essa é a sua principal utilidade.
Uma nação que negligencia as percepções de seus artistas entra em declínio. Depois de um certo tempo ela cessa de agir e apenas sobrevive. (78)
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Frases esparsas
A linguagem nebulosa dos trapaceiros serve apenas a objetivos temporários. (36)
O segredo dos autores populares é não meter numa página mais do que o leitor comum possa engolir sem QUALQUER esforço além da sua atenção habitualmente relaxada. (68)
O mau crítico se identifica facilmente quando começa por discutir o poeta e não o poema. (80)
Creio que o professor ideal seria o que examinasse qualquer obra-prima que estivesse apresentando a seus alunos quase como se nunca a tivesse visto antes. (81)
Certos escritores caçam sentimentos para acomodá-los a seu vocabulário. (92)
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Perfil de Ezra Pound
Poeta e crítico norte-americano ( 1885 – 1972 ). Desenvolve um dos principais estudos sobre literatura moderna, criando critérios para análise da poesia baseados na ciência. Nascido em Hailey, no estado de Idaho, Ezra Loomis Pound forma-se em filosofia e estuda várias línguas, além de gramática e literatura inglesas.
Em 1908 muda-se para Londres. Lá faz amizade com os poetas William Butler Yeats e T.S. Eliot, que ajuda a tornar conhecidos. Escreve sobre literatura para pequenos jornais londrinos e publica Personae e Exultations e The Spirit of Romance (O Espírito das Línguas Românicas).
Entre 1912 e 1914 torna-se líder do movimento imagista, que prega que a poesia deve ter uma eficácia informativa, sem excessos nem rebuscamentos, e dizer o máximo possível com o mínimo de palavras. Em 1925, na Itália, publica o primeiro volume de Cantos, sua principal obra, que havia começado em 1915 e só finaliza em 1960.
Durante a II Guerra Mundial (1939-1945), declara-se favorável às idéias fascistas e é internado sob o pretexto de ter problemas mentais. Libertado, morre em Veneza, na Itália.
Obras: Personae (poemas), Exultations, Provence, Cathay, Versi prosaici (espécie de autocrítica poética), Instigations, Love poems of ancient Egipt, From Confucious to Cummings, The Spirit of Romance (ensaios) e Os Cantos (obra-prima de fundo épico e inspiração dantesca). Escreveu ainda A arte da poesia e ABC da literatura (crítica literária).
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Fontes de consulta:
www.infoescola.com/biografias/ezra-pound
http://books.google.com.br/books=abc+da+literatura
(versão integral)
www.algosobre.com.br/
ABC da Literatura, de Ezra Pound. 220 p.
11ª ed. Apresentação de Augusto de Campos.
Tradução de Augusto de Campos e José Paulo
Paes. Ed. Cultrix, São Paulo, 2006.
Wikipedia (artigo sobre Ezra Pound)