Infinitivo 

Estudo de Gramática Descritiva

José Maria Rodrigues: o infinitivo pessoal deriva do imperfeito do subjuntivo latino (proposta atualmente aceita).

amarem Ø amar

amares Ø amares

amaret Ø amar

amarémus Ø amarmos

amarétis Ø amardes

amarent Ø amarem

Verbóide: é o termo proposto por Rodolfo Lenz para as formas nominais.

Como pensam alguns gramáticos

"Forçoso é confessar que saber empregar a flexão pessoal é mais da estilística do que da gramática." (João Ribeiro)

"O emprego do infinitivo pessoal é regulado pela clareza e pela euforia. Os gramáticos inventaram numerosas regras para disciplinar o emprego do infinitivo pessoal, mas toda essa multiplicidade só serve para trazer confusão." (Antenor Nascentes)

"... o emprego do infinitivo pessoal é assunto sobre que não se pode dogmatizar (...) a harmonia da frase e a clareza da expressão são as duas leis regulamentares do emprego correto do infinitivo pessoal (...). As regras absolutas dadas pelos gramáticos são artificiais, não condizem com os fatos do idioma vernáculo e lançam a confusão no espírito dos escritores principiantes. (Eduardo Carlos Pereira)

"A clareza, a ênfase e a harmonia também influem muito para a escolha de umas e outras formas: o infinitivo impessoal é mais vago, mais abstrato; o outro, é mais preciso, mais concreto, mais enérgico." (Sousa da Silveira)

De fato, à luz da literatura modernista, podem se formular pouquíssimas regras de valor absoluto, e vislumbrar, aqui e ali, certas tendências mais ou menos acentuadas.

Exemplos:

“Talvez este (índio) fosse entrar. Seria preciso sustentar luta com ele dentro de casa, porque mais dois índios já vinham chegando...” (Diná Silveira Queirós)

“Dormiam (Fabiano e Sinhá Vitória) naquilo, tinham se acostumado, mas seria mais agradável dormirem numa cama de lastro de couro, como outras pessoas.” (Graciliano Ramos)

“É impossível a um homem e a uma mulher equilibrarem-se por longo tempo...”(Ciro dos Anjos)

“E o soluço de tudo quanto existe,/ a ânsia sem fim, cuja lembrança coube aos pobres poetas perpetuar. (Tasso da Silveira).

“De qualquer modo, é preciso lutar pelo advento de um tempo em que a virtude dirija os homens. É preciso aprendermos a nos esquecer de nós mesmos. É preciso entregarmo-nos ao trabalho anônimo e saber encontrar a felicidade que nele existe. É preciso, sobretudo, nutrir uma esperança secreta...”( Ciro dos Anjos)

O exemplo de Ciro dos Anjos liquida com a rigidez da concordância.

Já nas frases abaixo, entretanto, impunha-se a forma impessoal, pois o verbo está na plenitude do seu valor nominal:

“Viver é andar para trás, é ceder terreno, é assim como um perde-ganha.” (Rachel de Queiroz)

“Pescar, acima de tudo, é um esporte.” (Rachel de Queiroz)

“Viver numa grande cidade é quase sempre estar longe.” (Drummond)

A flexão do infinitivo serve muitas vezes para eliminar a ambigüidade:

“Infanta, no exílio amargo,/ só o existirdes me consola.” (Tasso da Silveira)



Caso fosse existir (não fosse existirdes), o sujeito de existir seria o mesmo de consola,ou seja, Infanta.

“Mas os homens continuavam, já agora praguejando, no seu afã de descobrir um melhor ponto para sairmos do barco”(Diná Silveira Queirós)

Sairmos= silepse de pessoa, pois o autor de incluiu na ação.

“Dona Amélia sofria com aquela animosidade dentro de casa. Uma vez falou com o marido para sair, para procurar um lugar para morarem em casa que fosse deles.”

Sair=ação do marido

procurar= ação do marido

morarem= Dona Amélia se incluiu.

Casos obrigatórios

Segundo a tendência da literatura modernista:

1º caso: infinitivo impessoal nas conjugações perifrásicas (locuções verbais).

“Vamos viver no Nordeste, Anamaria.”(Manuel Bandeira)

“Podeis crer, Padre.”(Diná Silveira Queirós)

“Os cavalinhos começavam a rodar.”

Os gramáticos admitem, por uma questão de clareza, a flexão do infinitivo quando, entre este e o auxiliar, interpõem-se palavras.

A literatura modernista prefere o infinitivo sempre inflexionado nas locuções verbais, mesmo que ocorra afastamento entre o auxiliar e o verbo principal: embora sejam encontrados alguns exemplos diferentes.

“... e até mesmo homens acorrentados ao armazém logram, de quando em quando, à força de abstenções, receber do pagador da companhia, atônito, uma cédula de cem cruzeiros” (Drummond).

“Vão os que desejamabafar suas angústias e seus tormentos procurar essa atmosfera capitosa de serenidade.”(Diná Silveira Queirós)

logram receber-= forma perifrásica

desejam procurar= forma perifrásica.

Outros exemplos

“Mas, hoje-em-dia, agora, agorinha mesmo, aqui, aí, ali, em toda parte, poderão os bichos falar e serem entendidos, por você, por mim.” (Guimarães Rosa)

“E aqueles, pés que nunca sentiram o contato do chão, que a seda mais fina pode ferir, irão calçar a terra com força e fincarem-se nela tomando posse do seu lugar ao sol...” (Rachel de Queiroz)

2º caso: o verbóide refere-se a um pronome pessoal átono e a oração infinitiva serve de objeto direto a um dos verbos seguintes: ver, ouvir, deixar, manda, fazer

“Levantou-se antes dos dois, mas viu-os partir, em seguida...”(Tasso da Silveira)

“...enquanto se espalham outras/ em polvorentas partículas,/ sem as vermos fornecer.”

Lessa: Faça-os entrar. Dizer que os é sujeito e objeto direto concomitantemente é comodismo didático.

Há a forma inflexionada com preposição:

“O mestre aconselhou-os a subir.”(José Lins do Rego)

Há a forma flexionada com preposição:

“Convoco-as a serem terra outra vez.” (Drummond)

Exemplos raros, quando o verbóide apareceu flexionado:

“Por fim, viu-os se sumirem na estrada.”(José Lins do Rego)

“... tomar dois temas e opô-los, fazê-los lutarem, embolarem, ferirem-se e estraçalharem-se e dar a vitória a um ou, ao contrário, apaziguá-los num entendimento.” (Bandeira)

3º caso: infinitivo impessoal com a forma ativa e o sentido passivo.

“E os eucaliptos faziam-se mais ouvir do que ver.”(José Lins do Rego)

“Si é que não partiram pro interior em busca de fazendas por colonizar.” (Mário de Andrade)

Servindo de complemento aos adjetivos fácil, difícil, raro, passível e outros. Faz-se reger da preposição de

“... e Baleia respondia com o rabo, com a língua, com movimentos fáceis de entender” (Graciliano Ramos)

“Reconheço mais a existência de temas eternos, passíveis de afeiçoar pela modernidade...”(Mário de Andrade)

4º caso: infinitivo pessoal

É de natureza gramatical e muito usado pelos modernistas. O verbóide apresenta-se com sujeito claro e expresso na própria oração infinitiva. Exemplos:

“Vinham até convites dos engenhos de perto para as moças irem passar o dia.”(José Lins do Rego)

“E nada dos dois homens se mexerem de onde estão.”(Guimarães Rosa)

O fato do verbo estar posposto ao sujeito em nada altera:

“Se algum dia caírem estas linhas sob os olhos de alguém, rirão...” (Ciro dos Anjos)

“Mediam tudo, pensavam tudo, para não surgirem decepções.”(Graciliano Ramos)

Casos em que o infinitivo se manteve impessoal

Casos raros

“Há três meses que Bento chegara ali e nada de aparecer notícias do padre Amâncio.”(José Lins do Rego)

“O curral das vacas com as manjedouras com o cocho dos animais beber água destruídos. “ (José Lins do Rego)

Quando o sujeito se acha posposto ao infinitivo: a preferência é pelo infinitivo impessoal:

1. Verbo na oração principal é ver:

“Via chegar ao engenho os meninos do Zé Medeiros do Pilar.”(José Lins do Rego)

“Podia ver debandarem ao longe os reinóis batidos e humilhados.”( Diná Silveira Queirós)

2) Verbo da oração principal é ouvir:

“Rosália, quando ouvira, rente à janela do seu quarto, estugirem maldições sobre Bento Coutinho. (Diná Silveira Queirós)

3) Verbo principal é sentir:

“... não se conteve, ao sentir varejar na folhagem junto dele, os tiros dos emboabos.”(Diná Silveira Queirós)

“E senti relvarem os rochedos.”(Diná Silveira Queirós)

4) Verbo principal é fazer (preferência pelo impessoal):

“Mas a boca deixava passar ainda a mesma coisa obscura, que fazia crescer as veias do pescoço, inutilmente.”(Drummond)

“Mesmo o cipó quebrador, que aperta e faz estalarem os galhos de uma árvore anônima.”

5) O verbo principal é deixar:

“Os passageiros deixavam cair os tostões na coité...”(J.L.Rego)

6) O verbo principal é mandar:

“Fazia riscos, bordados, mandava vir rendas de Grão Mogol, cosia com amor...”

5º caso: infinitivo impessoal (tendência)

O infinitivo regido de preposições de, em, a, restringe ou especifica a noção indicada por um substantivo ou adjetivo a que se prende:

“Eu vivia com todos os meus nervos expostos, capazes de sofrer com a menor variação de humor.”(José Lins do Rego)

“... desta (tu) os petrificados; aturde (tu) os caules no ato de crescer.” (Drummond)

Há também o emprego do infinitivo pessoal:

“Os velhos santos da família não correriam o risco de quebrarem o pescoço com a igreja caindo por cima deles.” (José Lins do Rego)

“E ainda outro bando, mais baixo, com as maitacas verdinhas, grulhantes, incapazes de acertarem as vozes na disciplina de um coro.” (G. Rosa)

Já no exemplo abaixo, foi a necessidade de clareza que induziu os escritores a preferirem a forma pessoal:

“Pois se o fato existirdes/ não me dá gozo e ventura,/ pelo menos me ilumina/ de uma luz pura e divina...” (Tasso da Silveira)

Existir= daria impressão de ser o poeta.

“Um prêmio que seu Maciel oferecia aos que tinham de manhã recebido a Nosso Senhor a liberdade de sacudirmos as pernas à vontade.

Sacudirmos= o autor se incluiu.

6º caso: infinitivo pessoal (tendência)



É muito comum (mas não é rigor) flexionar-se o infinitivo do verbo ser, quando este funciona como auxiliar na formação da voz passiva.

“Certos bolos e cremes, antes de serem degustados pela boca ávida, o são pelo nariz e pelos olhos...”(Drummond)

“Os homens saíam da cadeia para serem ouvidos pelo juiz.”( José Lins do Rego)

A forma impessoal também ocorre, mas é menos freqüente:

“Eram pessoas que estavam já habituadas a ser informadas quase que diariamente sobre...” (Diná Silveira Queirós)

“Somos vinte a ser destruídos.”(Drummond)

Resumo do capítulo

Emprego do Infinitivo Pessoal e Impessoal

do livro O Modernismo Brasileira e a Língua Portuguesa, de Luiz Carlos Lessa, Fundação Getúlio Vargas, 1966.

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