CADA POEMA É UM NOVO MUNDO

Na intenção de ajudar na compreensão do fenômeno da linguagem figurada (se é que tal é possível no campo cognoscitivo), retomamos a discussão sobre os versos finais da peça poética, tentando abordar como este se apresenta à emoção, aos olhos e à intelecção do leitor. Inicialmente, é necessário se ter em conta de que valem, em poesia, as regras prosaicas de qualquer trabalho expositivo, mesmo que o território de fantasia utilize metáforas profundas e abuse do sentido conotativo. A peça poética, formalmente, também possui introdução, desenvolvimento e conclusão. É compreensível que nem sempre com a clareza desejada, ou a que se pode observar nas peças prosaicas expositivas. Peças poéticas são de outro sentir. De outra vertente formalmente exposta. Normalmente, nos trabalhos técnicos, é luminar a objetividade. Em Poesia, isto é exceção. O ferramental da Poesia é aquele que escancara o sentido conotativo. O poeta coloca um véu sobre o fato subjacente ou originário que serviu para a confecção do poema. A palavra é esta máscara aberta ao mundo, buscando o entendimento e a lucidez de quem consome o poema. É a partir do desenvolvimento das idéias contidas na peça que a característica poética da “sugestão” vai ou não aparecer no poema. Por ela o consumidor de poesia transporta-se ao campo das imagens. Vivencia, pela “sugestão”, um plano novo, um berçário de novidades: palavras quase sempre com múltiplos sentidos. Este conjunto de signos carregadinho de imagística (meu mestre Zeferino Paulo Freitas Fagundes falava em imagética, terminologia ainda não consagrada em dicionários) vai produzir no leitor a sensação do novo, do inusitado, daquilo que quase sempre beira ao inesperado: o que parece, mas não é... Pelo uso das metáforas profundas, o mergulho na sugestionalidade (e a curiosa ampliação dos sentidos) pode conduzir o raciocínio a algo que tem pouco ou quase nenhuma identificação no mundo real. Voeja-se no sonho, no fantasioso. O cuidado que se tem de ter é na “transpiração”, o segundo momento de criação da obra poética, na qual prepondera a inteligência, e não a “inspiração”, a centelha original pejada de emoção. É possível que, com alguma acuidade pontual com a palavra, se consiga o mais importante, no poema: a TRANSCENDÊNCIA. Esta se dá ou não na obra poética. Quando esta avulta no poema, o leitor de Poesia viaja e apanha estrelas, navega no mundo novo das imagens e se constroi a realidade impalpável. Os praticantes do gênero Poesia produziram, na prática do soneto clássico, o chamado “fecho-de-ouro”, que nada mais é do que o resultado prático da transcendência. Aquilo que catapulta o leitor à reflexão sobre o lido, o consumido. Nem sempre os bons autores de poesia da contemporaneidade têm cuidado com esta busca. É necessário aprender com os bons sonetistas. Já dissemos que o território da criação poética, no conteúdo, é o do sonho, a fantasia gerada. Porém é a abordagem com alguma veracidade correlacionada, no mundo real, o que pode levar o mudo interlocutor ao ALUMBRAMENTO, de que nos falava o gênio Manuel Bandeira.

– Do livro A POESIA SEM SEGREDOS, 2009/12.

http://recantodasletras.uol.com.br/teorialiteraria/1854383