TEXTOS COMENTADOS DA LITERATURA BRASILEIRA - POESIAS - INFÂNCIA - Carlos Drummond de Andrade
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.
No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu
a ninar nos longes da senzala – e nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.
Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu... Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro... que fundo!
Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que a minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.
Poesia e prosa. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1988.
Robinson Crusoé – novela do escritor inglês Daniel Defoe (1660 – 1731).
Os temas (assuntos, idéias) da poesia de Carlos Drummond de Andrade (1902/1987 - Modernismo) são as reminiscências (lembranças, impressões que ficam de uma experiência passada) da infância, a tranquilidade da vida no interior e a segurança oferecida por seu núcleo familiar no tempo em que o poeta-menino vivia em Itabira (MG).
O autor relata sua infância na pequena fazenda de sua família, registrando o dia-a-dia de todos: o pai montado a cavalo indo para o campo (Zona fora do perímetro urbano das grandes cidades, no qual predominam as atividades agrícolas), a mãe cosendo e prestando atenção ao sono reparador do irmão menor, e ele próprio, entre as mangueiras, lendo (valorizando o hábito da leitura desde os tempos de menino) e fazendo comparações entre a sua história e a de Robinson Crusoé (Daniel Defoe – 1660/1731 – escritor inglês).
Relembra também, ao meio-dia de sol forte (“...branco de luz...”) a preta velha, livre, longe da senzala, que faz um café muito bom, muito gostoso e sinal de hospitalidade. Notamos certa analogia com a história de Robinson Crusoé, que devido a um naufrágio fica afastado da civilização, ou seja, solitário, isolado do contato humano, fato que o poeta relaciona com sua infância (“Eu sozinho menino...”), não em virtude de acidentes, mas, talvez pelo fato de viver no interior de Minas Gerais, onde grandes distâncias de terras apresentam ou apresentavam baixos índices populacionais, ou ainda, em virtude da idade, isto é, pelo fato de ser criança.
Finaliza com a observação de que toda história é bonita, e que para isso, basta felicidade para seus “personagens”, a de Robinson Crusoé, mas também a nossa, são histórias belas, comoventes, interessantes.
Temos nessa poesia uma obra confessional, onde o autor utilizou fatos reais de sua vida como matéria literária, ou seja, “retornou” ao seu passado para retratá-lo de forma poética.
Augusto de Sênior.
(Amauri Carius Ferreira)
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BIBLIOGRAFIA:
O1) AMARAL, Emília.../ et. al./ Novas palavras: literatura, gramática, redação e leitura. v. 1.
São Paulo: FTD, 1997, pág. 13/14. (Coleção Novas palavras)
O2) FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.
Miniaurélio eletrônico versão 5.12. 6ª ed. 2004.