POEMA EM PROSA E PROSA POÉTICA

A temática proposta pela correspondência abaixo catalogada é muito interessante e merece transcrição integral. Observe-se a utilidade e rapidez do ferramental posto à disposição pela Grande Rede. Todo o diálogo se deu no decorrer de um único dia. Vejamos:

From: Juleni Andrade

To: Joaquim Moncks - Gmail

Sent: Tuesday, April 14, 2009 8:08 PM

Subject: PROSA POÉTICA?

Poeta,

Gostaria de saber se é PROSA POÉTICA...

“INCONFIDÊNCIA DAS GERAIS

Juleni Andrade

Quanto sal gasto por lá!

Sal das lágrimas dos infames... descendentes do morto réu.

Houve sal no terreno da casa arrasada...

Lá não haveria de nascer mais nada!

Uns o degredo foi punição...

Ao alferes, pena de morte.

Eis que surge um herói

na terra dourada explorada!

Ainda não havia este Brasil,

que aclama seus bravos

quase salvadores da mãe pátria nada gentil...

Foi conjuração de abastados

lutando pelos seus ouros e louros.

Quanto de sal em suores de negros,

nem lembrados pelos conjurados!

Na esperada derrama, quanto de prejuízo?

Vidas, fortunas e Gerais.

A Coroa traída foi cruel

com seu servo menos rico...

Deu-lhe a morte martírio e, sua vida eternizada.

Nesta terra de riquezas, belezas e povo pobre...

de sentimentos ditos nobres

dos que pisam firme e forte.

Ao condenado à morte não há de soar os sinos!

Ouviu-se cinco badaladas, contam os crentes no divino!

Roubaram a cabeça do cabeça declarado!

Ainda que Deus proteja, haverá lágrimas e morte...

É sangrenta luta diária... O bravo povo chora!

Outros heróis sempre virão... Salvadores de ocasião.

Porém, o nome Tiradentes estará presente nos compêndios

Da verde-amarelada nação... Que marcha, segue, cumpre

e bate cartão.

“Libertas Quæ Sera Tamen”, brava gente brasileira!”

From: joaquimmoncks@gmail.com

To: julenias@hotmail.com

Subject: Re: PROSA POÉTICA?

Date: Tue, 14 Apr 2009 20h44min

Poetisa Juleni! Primeiramente, acaso viéssemos a exigir perfeição classificatória, seria ‘POEMA EM PROSA’, já que o texto está escrito em versos, pelo que se vê logo ao primeiro exame: o autor pretendeu manifestar-se em Poesia.

Torna-se imperioso examinar o que ensina Massaud Moisés, em “A Análise Literária”, São Paulo, Cultrix, 12ª ed., 2000, p. 84: “E ao passo que a metáfora poética é polivalente, a metáfora da prosa tende à univalência, ou por outra, ao passo que a poesia lança mão de signos conotativos, a prosa exprime-se acima de tudo em linguagem denotativa. Obviamente, a linguagem da prosa não é pura denotação, pois neste caso perderia sua feição artística, mas dela se aproxima na medida em que o prosador assume, geralmente, atitudes diretas em face da Natureza e dos homens, à procura de ser tão explícito quanto possível.”.

Examinando-se o texto acima, “INCONFIDÊNCIA DAS GERAIS”, nota-se a presença de algumas rarefeitas metáforas, no sentido conotativo. São versos longos e nos quais aparece pouca ritmação. Praticamente não há musicalidade nem sonoridade poéticas, afora algumas assonâncias e aliterações. É a chamada poesia derramada, em que há certa linearidade pensamental.

O tema, sob a mesma lavratura (forma), sem tirar nem botar, diria o vulgo, poderia ter sido apresentado no formato em prosa. Aliás, se poderá fazer a experimentação de juntar os versos e teríamos o assunto versado em Prosa. Mas, o que fazer se prevaleceu o espírito poético e a sua autora resolveu escrevê-lo em versos?

Pelo teor do exposto, na peça em exame nega-se a síntese, que é outro elemento formal caracterizador da Poesia de todos os tempos, mormente a do século XXI. A contemporaneidade sintetiza tudo, desde as corruptelas da linguagem da juventude até o poema, em linguagem culta ou não.

A Prosa Poética se dá na lavratura linha a linha, sob o aspecto de forma, assim como se escreve qualquer outro texto que não em linguagem poética. No entanto, ocorre nela predominância de metáforas, sendo logo revelados o sentido denotativo e o conotativo.

Dado que o sentido conotativo é preeminente, classifica-se privilegiando e qualificando a PROSA, aduzindo-se o qualificativo “POÉTICA”. No Brasil, Mário Quintana é um bom exemplo do que se está a falar. O poeta deu dignidade incomum à Prosa Poética.

No caso da peça abaixo, a INCONFIDÊNCIA DAS GERAIS, parece-me tratar-se de um poema em prosa, de caráter épico-histórico, a exemplo do que fez a imortal Cecília Meireles no longuíssimo poema em prosa "ROMANCEIRO DA INCONFIDÊNCIA".

Claro que, neste, há uma forte preeminência das metáforas poéticas polivalentes, mercê do valor histórico e riqueza dos personagens. Mas, como não há esta classificação (esse critério classificatório) no site do Recanto das Letras, resta apresentá-lo como PROSA POÉTICA.

Espero ter ajudado. O poetinha JM.

From: Juleni Andrade

To: Joaquim Moncks - Gmail

Sent: Tuesday, April 14, 2009 9:52 PM

Subject: RE: PROSA POÉTICA?

Obrigada, amigo Joaquim! Não sei se um dia chegarei a definir por um estilo. Nem sei se é preciso isso. Não tenho formação acadêmica em literatura, gosto de escrever. E, aprendi que "só se aprende a fazer fazendo"... Quando passei a divulgar meus escritos, foi pra receber críticas. Então, sua participação didática está ajudando meu aprendizado.

Fico muito agradecida e feliz com isso. Sua atenção está sendo importantíssima em minha caminhada. Tem meu apreço e consideração. Mais uma vez, obrigada! Mil vezes obrigada!

Abraço com muito carinho e respeito. Juleni.

From: Joaquim Moncks - Gmail

To: Juleni Andrade

Sent: Tuesday, April 14, 2009 10:52 PM

Subject: "fazer fazendo"

Amiga e confreira Juleni! As classificações ou modalidades literárias expendidas no e-mail anterior nada tem a ver com “ESTILO”, ressalto. Este identifica signos de composição, condiz com o aparecimento de elementos identificadores de determinado autor, com base na linguagem, originalidade de abordagens andamento rítmico individuado, uso reiterado de figuras de linguagem e no inusitado das criações, por assuntos, temática, e, em raros casos, pela trazida de vocábulos provindos de outros ramos do conhecimento humano, como é o caso dos temas da medicina na poesia de Augusto dos Anjos ou a temática indígena em Gonçalves Dias.

Continua a tua arte, a de "fazer fazendo", e, concomitantemente com o que vais amealhando de informações, deixarás de ser mera diletante.

O diletantismo – o amadorismo – nunca produzirá estilo, a não ser que estejamos tratando com gênios. Bem, quem é dotado de genialidade, nunca será classificado como amador. É necessário estudar sempre – mais e mais – mesmo que se queira, apenas, jogar à rua o talento pessoal.

O que falamos na mensagem anterior é sobre classificação de textos, principalmente para se utilizar esses conhecimentos nas publicações no Recanto das Letras – site para escritores. Também aprendi fazendo, estudando, pesquisando e sempre fazendo. Afinal, POIESIS, do grego, quer dizer “fazer criando”.

E como tu tens somente trinta e sete anos, fico imensamente feliz em poder contribuir.

MONCKS, Joaquim. A POESIA SEM SEGREDOS. Obra inédita em livro solo, 2006/2012.

https://www.recantodasletras.com.br/escrivaninha/publicacoes/preview.php?idt=1540627