SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ENTRE A TRÍADE SIMBOLISTA PORTUGUESA
O movimento simbolista emerge, em parte, como uma reação ao espírito racionalista e cientificista do realismo/naturalismo e parnasianismo. Ele vem acompanhado de correntes filosóficas e artísticas que negam o poder hegemônico de explicações do mundo, por meio do racionalismo e cientificismo, pois a arte simbolista rejeita veementemente essas correntes.
A poesia desse movimento expressa uma nova visão de mundo que contraria os preceitos realistas, valorizando o subjetivismo e o inconsciente, tornando-se uma forma de sondagem do mundo inteiro do “eu” lírico. Essa introspecção criou caminhos diferentes nos vários poetas simbolistas, levando uns ao intimismo saudosista, outros à expressão dos desencontros da vida como à angústia diante do destino da morte.
Assim, embora os poetas simbolistas tenham características comuns do movimento como a evasão. Eles se diferenciam uns dos outros de forma peculiar.
Eugênio de Castro, introdutor do simbolismo em Portugal através da obra Oaristo, apresenta uma poesia que se opõe aos lugares-comuns, rimas abtuais e vocábulos pobres que tanto caracterizavam a poesia portuguesa. E propõem uma nova maneira do fazer poético apelando para o vago, o misterioso e o ímpar.
Com isso o poeta pretendia revolucionar a poesia introduzindo inovações ao nível da imagem, da rima e do trabalho do verso em geral e da explosão musical da língua.
Apesar de ser o precursor do Simbolismo português, o autor não permaneceu fiel a esse movimento, tendo em vista que sua poesia se mantem simbolista nitidamente, apenas em Oaristo e Horas, tendendo em outras, para certa forma que o aproxima do estilo parnasiano. Essa confusão surgiu em virtude dos “ismo” da época que propiciou a obra de Castro diferentes manifestações que foram do decadentismo, a ações parnasianas, voltando-se depois para o classicismo.
Mas ao todo sua produção foi mais clássica do que simbolista porque tal como os poetas clássicos Eugênio de Castro não deixou o sentimento extravasar. E assim, refletiu somente as dúvidas da existência humana faltando-lhe a sensibilidade artística que pudesse identifica-lo como alguém que desejasse a transcendência.
Por isso sua poesia não foi verdadeiramente simbolista, pois lhe faltou o sentimento humano que será visível mais tarde na obra de Antonio Nobre e Camilo Pessanha.
Antonio Nobre é um dos poetas português mais popular, em vida deixou somente uma obra publicada, o livro Só, e com ele obteve grande sucesso. Com temas voltados para os saudosos tempos da infância, falando com simpatia das pessoas simples e cantando numa linguagem suave e espontânea os devaneios, as tristezas, o amor e o sonho, com isso o autor seduziu o público.
A sua poesia por esta presa as tradições, apresenta temas da cultura portuguesa, há ainda variação de ritmo que obedecem as batidas do coração fluindo e oscilando a voz sem transparecer uma regularidade rítmica. Os versos são livres com ritmo musical expressando conteúdos que falam da cultura popular.
Para o poeta as pessoas não podiam se desprender das tradições, pois o ser humano só encontra equilíbrio se estiver sintonizado com o passado. Assim, como os grandes nomes da história, Antônio Nobre é um idealista.
A poética do autor de Só, ao contrário da de Eugênio de Castro obedeceu fielmente aos princípios simbolistas, através da manifestação de um lirismo sentimental, romântico, muito subjetivo que conservando as raízes tradicionais, responsáveis pela extensa ressonância que seus versos encontravam nas almas populares.
Nobre ao trabalhar dessa forma, assemelha-se a Garrett, pois faz na poesia o que esse fez na prosa que foram as inovações narrativas, o tom coloquial, apresentando assim, uma espécie de neo-garretismo, por isso sua obra é mais romântica do que simbolista.
Camilo Pessanha é o expoente máximo do simbolismo de Portugal. Sensível e senhor de um estilo próprio, teve a capacidade de dar bela expressão artística a seus dramas, em função disso colocou-se no mesmo patamar dos grandes poetas que expressam a angústia humana.
Pessanha formou-se em Coimbra, mas passou a maior parte de sua existência no oriente. Teve publicado em vida, apenas uma obra de poemas Clepsidra. A poética desse autor trata de temas que degenera o belo e o bom e despreza a materialidade da época.
Diante disso ele revela uma arte que possui sentimentos estranhos em função do mundo e até de si próprio e de tudo que o ligue a realidade concreta. Esse quadro pessimista e melancólico da poesia de Pessanha é bastante influenciado pelas correntes de pensamento da época.
Se por um lado a dor o sofrimento está associada ao pessimismo de Schopenhauer, por outro ela é movida pela crise existencial seguida de um horror ou medo da vida tornando-se cercada de um niilismo e desgosto de viver, por isso a evasão e a busca de explicações para a vida no místico, inconsciente, subconsciente, vago, etéreo e misterioso.
Dessa forma, Camilo Pessanha retrata em sua obra um universo que parece existir apenas em sua visão, sendo que a realidade surge de modo referencial em meio a paisagens de difícil decifração, apenas sugerindo, evocada, de forma nebulosa, vaga, imprecisa, imprevisível e surpreendente, além disso, há uma extrema musicalidade em seus versos que serve bem ao propósito da escola simbolista.
Compreendidos os pressupostos supras citados, conclui-se que embora Eugênio de Castro, Antônio Nobre e Camilo Pessanha pertençam à mesma escola literária, cada um possui um estilo próprio de fazer poesia.
Castro é altamente formal, trabalhando uma linguagem rebuscada que aborda temas clássicos e universais. Não tem qualquer preocupação com o leitor, assim, apresenta uma leitura fria sem sentimentos, como é um profundo conhecedor da língua utiliza a assonância e a aliteração para produzir a musicalidade de sua obra.
Nobre ao contrário do autor de Oaristo, apresentar uma linguagem popular falando do cotidiano, preocupando-se com o leitor, por isso utiliza uma linguagem simples espontânea, carregada de sentimentos, feita para ser compartilhada com o povo. Em função disso Nobre trabalha a musicalidade das canções populares (cantigas de amigo), empregando, assim, uma espécie de neo-garretismo.
Pessanha diferencia-se de Castro e compartilha com Nobre a inquietação diante da vida e do mundo, dos homens e de si. Esses dois poetas expressam seus interiores através de sentimentos resultantes de uma tentativa de reconciliação com o mundo.
Mas ao contrario do outros poetas, Camilo Pessanha é mais simbolista, pois não está preso como eles a escolas anteriores, por isso e livre para produzir uma obra verdadeiramente simbolista, evadindo-se para o próprio eu, envolvido num lirismo suave que os sentimentos e sensações somente sugere e insinua através do vago e do indefinido. Sua realidade não é concreta ela é substituída pelo sonho e o visionário que lhe dá uma visão espiritual das coisas.
Apesar das diferenças mencionadas, os poetas possuíam algo em comum que era a evasão que propiciou uma total descompromisso com o real, o concreto, o palpável, expressando, assim um mundo multifacetado onde cada poeta exprimia um mundo novo, particular e pessoal.
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Referencias Bibliográfica
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa através de textos. 22 ed. São Paulo: Cultrix, 1997.
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa em perspectiva. São Paulo: Atlas, 1994.
PINHEIRO, Célio. Introdução à literatura portuguesa. São Paulo: pioneira, 1991.