CONTAGEM SILÁBICA DO VERSO (sílabas poéticas)


 

Os versos devem ser contados até a última sílaba tônica, dispendando-se as demais.


Para a contagem das sílabas em um verso usam-se critérios que não os estritamente gramaticais. 
Em poesia, leva-se em conta mais o que se ouve
do que o que se lê
.
Ou seja, importa mais como ouvimos as sílabas do que sua expressão escrita.

Basicamente
, existem dois critérios para tal:


1º critério:

Como na fala, em poesia fundem-se ou juntam-se em uma única sílaba a terminação vocálica átona (a última vogal átona de uma palavra) e o início vocálico (a primeira vogal) da palavra imediata. 

Assim, por exemplo, o verso "chorando como uma criança" deve ser lido da seguinte forma:


Cho/ran/do/ com'u/ ma/ cri/an/ça (Cecília Meireles)

Dizemos que houve "elisão" ou "absorção" da vogal  O  de "como".
Na verdade, mais do que um fenômeno poético, trata-se de um fenômeno típico da língua falada. Dificilmente falamos sem absorver ou suprimir vogais.

Sob esse critério (elisão ou junção de vogais), podemos agrupar dois tipos de fenômeno:


a) Crase


     1   2   3    4    5     6     7        8
"Cho-ra-rei -to-
da a-noi-te, en-quan//(to)  perpassa o tumulto nos ares" (C. Meireles)

Neste verso ocorre o encontro de vogais átonas.
Na quinta sílaba do primeiro verso, a sílaba DA (to-da) e o A do artigo fundiram-se numa só sílaba: DA.
O mesmo se deu na sétima: o E da sílaba TE (noi-te) confundiu-se com o E da sílaba EN (enquanto), do que resultou apenas uma sílaba métrica: TEN
. Chamamos esse fenômeno de crase, pois ocorreu entre vogais idênticas.


b) Sinalefa

Se esse encontro acontecesse entre vogais diferentes, então teríamos o fenômeno da sinalefa:

  1    2   3   4   5     6     7   8
"A- noi-te- to-da -
se a-tor-do//(a)" (C. Meireles)

O encontro de E + A, na sexta sílaba, produz o ditongo "ia" (tal como é pronunciado), sendo ambos os elementos pronunciados com nitidez. 
Não ocorre aqui elisão ou crase, mas junção de vogais.


2º critério:

Os hiatos (encontro de vogais pronunciadas separadamente) podem ser lidos como ditongos (encontro de vogais pronunciadas como uma unidade sonora). 
E ditongos, por sua vez, podem ser lidos como hiatos.
Sob esse segundo critério, podemos identificar basicamente dois fenômenos:


a) a diérese:  transformação de um ditongo em hiato.
É um recurso pouco usado.


1      2    3    4    5    6            7    8     9   10
"A A-ve-Ma-ri-a, a-ssim,- no a-zul- pa-re//(ce)"


A palavra Maria, que, na contagem silábica gramatical, pode ter duas ou três sílabas, apresenta-se nos poemas muitas vezes como tendo apenas duas sílabas (Ma-ria).
Raimundo Correia (o autor dos versos acima) preferiu, no entanto, considerar três sílabas (Ma-ri-a).


b) a sinérese:  transformação de um hiato em ditongo.
A palavra "juízo", por exemplo, é normalmente pronunciada com três sílabas (ju-í-zo). Em poesia, no entanto, pode aparecer como ditongo (jui-zo).

        1       2    3    4    5   6          7        8      9     10
"Que-a-que-la-mo-ça- to-me- en-fim-seu- juí
//(zo)"...


A poética conta ainda com o recurso da
aférese.

Trata-se da supressão de um fonema, ou grupo de fonemas, no início da palavra.  Com isso, pode-se ter diminuição de sílabas num dado verso.

A aférese é comum na linguagem cotidiana e familiar.

Exemplos:


muito frio! (por "está")
Inda agora ele telefonou. (por "ainda")
Ele largou a
batina (por "abatina")
Falei com o
da padaria. (por "José")
'Stamos em pleno mar (por "estamos")



 
Nota final: é melhor que se faça a contagem silábica da cada verso em voz alta, naturalmente, sem escandir (= pronunciar sílaba a sílaba de cada palavra do verso é um modo artificial da fala; mascara a emissão natural, quebra a sonoridade/ musicalidade do verso).


                                                



Fontes de apoio a este apontamento:

Língua e Verso (Celso Cunha)
Alô Escola - TV Cultura - Literatura
Elucidário Métrico (Eno Theodoro Wanke)