O Soneto
O soneto
O Soneto
O soneto é uma composição de forma fixa, com 14 versos, dispostos em 4 estrofes (ou estâncias), sendo dois quartetos e dois tercetos. O desenvolvimento da idéia subordina-se ao limite das estrofes, e se faz por períodos que se contém rigorosamente em cada uma das estrofes, de forma que o fim de cada estrofe é marcado por uma pausa. De origem controversa, o soneto teve em Petrarca (1304-1374), a organização do conteúdo em forma fixa, que serviu de modelo em toda a Europa. Introduzido em Portugal por Sá de Miranda, em 1527, coube a Camões assegurar o triunfo do gênero. Os sonetos de Camões são a parte mais conhecida de sua lírica; considerados os melhores escritos em língua portuguesa. Através dos tempos a estrutura do soneto veio permitindo diversas outras soluções. No período Barroco, o soneto prestou-se às extravagâncias gongóricas e foi se complicando com inúmeras soluções engenhosas e rebuscadas.No Arcadismo, a reação contra o cultismo e conceptismo Barrocos, impôs um soneto formalmente correto, rígido na estrutura e frio e convencional quanto ao conteúdo. Bocage, grande sonetista, reabilitou o gênero, incorporando a seus sonetos uma eloqüência sonora e um acabamento formal modelares. No Romantismo, o soneto foi abandonado pelos poetas românticos, que optaram por formas mais livres, que não condicionavam as expressões poéticas. No Realismo, o soneto clássico vai reaparecer, principalmente na obra de Antero de Quental. Foram os Parnasianos que elegeram o soneto, a sua forma predileta, modernizando-o em muitos aspectos. O Modernismo afastou os poetas do soneto, surgindo uma oposição às formas canônicas, das quais os modernistas se utilizaram para parodiar e ironicamente dessacralizar os 14 versos. Porém, passada a fúria iconoclasta da revolução modernista, o soneto volta revigorado. O soneto é portanto um caso único de sobrevivência de um modelo literário que resiste às evoluções e revoluções de gosto.
No Brasil, um dos primeiros sonetistas foi o poeta barroco Gregório de Matos Guerra- Boca do Inferno – que escreveu poemas satíricos e eróticos.
SONETOS DE CAMÕES
Amor é fogo que arde sem se ver;
È ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
A dificuldade do poeta em conceituar o amor, posto que é um sentimento complexo, faz com que a definição se dê por paradoxos, pois o que o poeta sente é inseparável daquilo que ele pensa. Porém pensar e sentir são movimentos antagônicos; o sentir deseja e o pensar limita, o resultado é o acúmulo de contradições que desembocam na perplexidade do poeta, e na sua desconcertante interrogação sobre os sentidos do amor.
AQUELA TRISTE E LEDA MADRUGADA
Aquela triste e leda madrugada,
Cheia toda de mágoa e de piedade,
Enquanto houver no mundo saudade
Quero que seja sempre celebrada.
Ela só, quando amena e marchetada
Saia, dando ao mundo claridade,
Viu aparta-me de uma outra vontade,
Que nunca poderá ver-se apartada.
Ela só viu as lágrimas em fio,
Que duns e doutros olhos derivadas
Se acrescentaram em grande e largo rio.
Ela ouviu as palavras magoadas,
Que puderam tornar o fogo frio
E dar descanso às almas condenadas.
O sentimento de dor da separação transforma a madrugada num momento angustiante para o poeta. A madrugada é portanto, praticamente um elemento sensível, humanizado, que se comove com a dor alheia,mas incapaz de expressar-se, contrastando sua beleza plástica com o sofrimento humano. A madrugada é o instante psicológico de dor profunda e contida, tornando-se a única testemunha dos sentimentos do poeta.