Da multiplicação dos pães
a Guto, saudoso
...ou então, saldoso
hermano
E sai d'entre os meus dedos mais uma bala perdida:
"O medroso
A assombração apagou a candeia
Depois no escuro veio com a mão
Pertinho dele
Ver se o coração ainda batia."
Fosse menor, mais enxuto... um belo hai-kai, diria, com toda certeza!!
E:
"adolescência
Aquele amor
Nem me fale"
Não tem outra! Pois que dizer mais (do amor)? Hai-kai, sim! Hai(-)...
Ou:
"Casulo
azul
guarda as asas
da água"
Sem pontuação, título... Hmm... Se este tal "casulo", pois, se pusesse a descer um pouco mais... Hai-ku, hai-kai!!
Bom, o primeiro que vi [ - Pode a (a) História não interessar muito, mas...], na verdade, foi este aqui:
"Hai-kai tirado de uma
Falsa lira de Gonzaga
Quis gravar 'Amor'
No tronco dum velho freixo:
'Marília' escrevi."
Rapaz... me deu tanta raiva o adjetivo emprestado à lira em questão, que xinguei secretamente (nem sei quantas vezes), não só o poeta, mas umas dez gerações dos seus!
Sim! Tomei a mim as dores de Tomás Antônio, imaginei a sua Dona (lá do Além-Mundo) constrangida, vexada, sem ter onde pôr a cara... E quando já me sentava para redigir um sem-número de poemas satíricos acerca de sapos e pianos, com o que me deparo; com o que me presenteia um marcador de livro emprestado:
"Lira VIII
Um dia que o gado
No prado guardava
Amor me aparece
Com arco e aljava
No tronco mais verde,
Que no prado houvesse,
Amor me mandou
Seu nome escrevesse
Contente, parti
Um trono buscar
Para nele as ordens
Pronto executar
Num tronco dum freixo
Que viçoso vi
Quis gravar 'Amor'
'Marília' escrevi
Tanto que amor vê
O engano feliz
O nome beijando
Alegre, me diz:
'Não temas, Dirceu,
Não mudes de cor;
Nesse doce nome
Escreveste 'Amor'."
Palas do Recife! De uma só estrofe, certeiro, fez o que fez: Mandou passear o "viçoso" (visto pelo árcade) e tornou um heptassílabo o trecho que se vê agora (depois do "Amor" e antes de "Marília"): "No tronco dum velho freixo..." Incrível! Pois soa como sendo o braço (a tatuar-se) do amante!! E ri-se novamente alguém (do Além-Mundo), mas de mim (com certeza)!!!
Se se ri Bandeira? Nããão... Sem dúvida, ali, Mozart o entretém muito mais!
Ou seria melhor "inter(-)tém"?!
Já os dois primeiros hai-ka... poemas(!!) lá do comecinho pertencem ao grande Oswald e o derradeiro (entre eles), ao experimentalista Arnaldo, ex-titã.
Agora, uma questão que levanto quiçá (para alguns) inutilmente: "Por que dois poemas de Oswald e não um só?" Se bem que poderia tacar muito bem em lugar do segundo este, por exemplo:
"Cota Zero
Stop.
A vida parou
Ou foi o automóvel?"
...que é também de um de nuestros caros e formosíssimos Andrades!
E é certo que não é a forma ou a não tão simples fórmula do 5-7-5, irmãos, que dita o que vem a ser o hai-kai ou o senryû, mas seu conteúdo - Está muito claro!
Partindo-se daí, poderemos chegar ao senryû primeiro [que se convencionou chamar "hai-kai" (esteticamente apenas) ao longo dos anos - Voltamos à forma?!]:
"A assombração apagou a candeia
Depois no escuro veio com a mão
Pertinho dele
Ver se o coração ainda batia."
Eita, mas parece o Japão antigo, não? Repleto de (h)estórias de assombração! E volto a sorrir (comigo): Fosse mais enxuto, daria um excelente hai-kai!!
Já o senryû seguinte, embora tão curto, se basta:
"Aquele amor
Nem me fale"
Porém, ao mesmo tempo, insinua-se:
Rapaz, não se iluda:
"Aquele amor
[Nem me fale"
É um hai-kai, sem dúvida!
AH, e para que se não perca de vez a deixa, pus dois poemas do paulistano porque me lembra por demais este um "certio" baiano, amigo meu ...que já também arriscou em arte tão sintética e sentida, mas quem disse que tenho - Raso desleixo! - nas mangas um de seus textos aqui?!
E enfim:
"Casulo
azul
guarda as asas
da água"
Este, sim - Não carece discutir - é um hai-kai legítimo, que a outro, por meu turno, inspirou:
- A onda bate asas,
Mas jamais foi muito longe! -
Segredou o rochedo.
Outro ...bem como o são os epitáfios (de alguns:), e epígrafes, escritos de banheiro, e frases de caminhão... Por que não? - Um Mundo o hai-kai!
a 26/01/07