Tempo de Inleição

ESTUDO DE TEXTOS POPULARES

SEMINÁRIO SOBRE LITERATURA DE CORDEL

1- OBJETIVOS- a)Refletir sobre a dimensão da linguagem popular como enriquecedora da produção literária

b)Distinguir em texto popular os mesmos elementos lingüísticos e literários de uma obra clássica.

c)Conhecer o cordel em seus elementos literários, mórficos e discursivos

d)Demonstrar que a língua “culta” pode e deve coexistir harmoniosamente com a linguagem popular.

2 -METODOLOGIA- Exposição de idéias, encenação de um cordel, análise literária e discursiva do texto.

3 - RESUMO: Este seminário propõe analisar o Cordel do ponto de vista discursivo e literário, onde serão focados o tema, o enredo, os personagens, a linguagem em seus aspectos morfossintáticos, discursivos e poéticos. A linguagem popular será tomada com base na teoria de Bakhitin¹ acerca da obra de Rabelais².A linguagem poética se fundamentará em Wellech & Warren³. Neste trabalho serão apresentados o estereótipo do caipira preguiçoso e a figura da mulher, na perspectiva do diálogo,como constituintes básicos do cordel.

4-JUSTIFICATIVA-O cordel é uma linguagem viva e significativa. Isto pode ser notado na atualidade, nas apresentações em feiras livres, em teatros.A recente inauguração da Casa do Cordel, em Natal, por iniciativa de Erivaldo Leite de Lima, o poeta de Abaeté, que já escreveu e publicou mais de cem cordéis, além de entidades como A União dos Cordelistas do Rio Grande do Norte (Unicodern) e a Academia Brasileira da Literatura de Cordel (ABLC), criada pelo imortal Antônio Francisco Teixeira de Melo, são provas cabais da importância literária e histórica do cordel.

Sendo a história do povo contada de forma poética, o cordel deve ser inserido nos meios acadêmicos como objeto de investigação científica, visando à ampliação dos estudos literários e à afirmação da diversidade lingüística como instrumento de inclusão e mobilidade social.

5 –INTRODUÇÃO - A literatura de cordel é típica do Nordeste brasileiro, fruto da imaginação popular retratando a realidade através de temas ligados ao cotidiano e interessantes para a comunidade.Na constituição dos cordéis é importante a distinção de elementos básicos constitutivos, como o ritmo melódico produzido pelas rimas, métrica bem definida e a ludicidade produzida pelos jogos de linguagem e pela musicalidade dos versos. No campo discursivo, pode-se notar, a figura da mulher, os estereótipos, a religiosidade, a luta do bem contra o mal, o poder,

1. Filósofo e lingüista alemão que deu grande contribuição aos estudos da Ling6uística e da Análise do Discurso.

2. Escritor francês, autor de Gargântua e de Pantagruel..

3.A partir do estudos de René Welleck e Austin Warren, a Teoria da Literatura ganhou “status” de ciência e firmou-se como disciplina dos cursos de Letras nos anos 60.

o dinheiro, elementos estes que produzem efeitos de sentido nos interlocutores, instigando-lhes a imaginação.Na interligação dos elementos mórficos e discursivos retratada nos personagens, traz para o texto o imaginário popular e o ambiente hilariante de brincadeira.

6 - OBJETO DE ESTUDO- TEMPO DE ELEIÇÃO de Jailda Santana*

7- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA-A análise do Discurso apresentada se baseia na perspectiva materialista de Pêcheux, onde são consideradas a historicidade e a ideologia como elementos constitutivos do cordel. Essa perspectiva teórica busca compreender os efeitos de sentidos e explicar o funcionamento discursivo por meio de uma análise não subjetiva, sendo a linguagem afetada pelos efeitos ideológicos, manipulada conscientemente para transmitir a mensagem. Considera-se ainda, a Semântica Discursiva (sentido conotativo e denotativo da linguagem) (Fiorin 2002) e a Sintaxe Discursiva, (frases) (idem,ibidem) demonstrando a presença do discurso direto e indireto no objeto analisado. Quanto à linguagem popular será analisada sob a visão de Bakhitin acerca do Vocabulário da Praça Pública na Obra de Rabelais, já que o cordel é uma expressão popular, a princípio produzida para ser apresentada nas praças, nas feiras, em forma recitada ou cantada. Entre os elementos rabelaisianos, revela Bakhitin que a projeção de excrementos é conhecida na literatura antiga, citando Ésquilo, em “Os Ajuntadores de Ossos”, descrevendo o lançamento de um penico na cabeça de Ulisses, e este mesmo episódio em Sófocles (O banquete dos Aqueus). Estes exemplos provam que a projeção de excrementos é um gesto tradicional de rebaixamento conhecido pelo realismo grotesco e também pela antiguidade. Segundo Bakhitin, este gesto e expressões “degradantes”, em Rabelais, têm natureza ambivalente. O “rebaixamento” ligado à zona baixa corporal, toma esta zona também como sinônimo de “fecundidade”, “nascimento”, “luz”, “renovação”. É esse aspecto positivo, que está vivo na época de Rabelais e sobrevive ainda hoje no cordel.

Em relação ao “estereótipo”, tomado como aquilo que é constituído por uma idéia pré-formada e simplificada que se impõe como sendo fixa aos membros de uma coletividade ou a cada indivíduo, nota-se que a representação de sentido não se constitui numa relação direta entre palavras e coisas, linguagem e mundo. É justamente por isso que a representação é imaginária e o estereótipo, no cordel, se configura como um dos seus aspectos jocosos. O estereótipo do caipira preguiçoso circula no imaginário social. Pode-se encontrá-lo na Literatura: Jeca-tatu (Monteiro Lobato), no Cinema Mazaroppi (inspirado no “adorável vagabundo”, Carlitos, de Chaplin) e na música “O ABC do preguiçoso” de Xangai.

Quanto á análise literária, em resumo, consiste em decompor o texto em seus elementos constitutivos, visando à percepção do valor e do relacionamento que trazem entre si para melhor interpretar e sentir a obra como um todo completo e significativo, a partir da intenção e dos recursos lingüísticos e literários usados pelo autor. Os elementos literários em seus aspectos mórficos e figurativos, serão analisados com base na teoria de Welleck &Warren, que, apesar de contestarem a essência do literário dos formalistas russos, defenderam elementos constitutivos próprios da linguagem literária distinguindo-a assim de outros tipos de linguagem. É neste ponto que serão identificadas as figuras do texto literário, no objeto de estudo.

*Autora do livro A Ti, Companheiro. JOTANESI Editora. Rio de Janeiro 1988 e do livro inédito Face à Poesia, em vias de publicação.

8- OBJETO DA ANÁLISE–TEMPO DE ELEIÇÃO

NARRADOR1- Eu contar pra vocês

Um episódio irritante

Que acontece toda vez

Nesse tempo intolerante

É tempo de eleição

E todos ficam na mão

De gente tão importante

NARRADOR2-Nesta querida Bahia

Cidade do interior

Vira praça de folia

Foguetório, redevô

Palanque pra todo lado

E o povo azuretado

Pergunta: a onde eu vô?

NARRADOR1- A prefeitura mais parece

Com casa de mãe Joana

Pois todo mundo carece

Dentadura e até cama

Todo mundo quer arrego

Precisando de emprego

Do prefeitinho “bacana”.

NARRADOR2- É um tal de lufa-lufa

Um toma lá e dá cá

É tanto fio da puta

Quereno a gente comprá

Quereno vivê no manso

E é os mermo todo ano

E nóis tudo no currá.

NARRADOR1- É sempre a mesma merda

Só promessa nada mais

Aquilo que o povo herda

É somente o “nada faz”

É preciso consciência

Chega de tanto demência

Gente precisa é de paz.

NARRADOR2 - Os home bate nas portas

É um toc-toc amuado

E cum tapinha nas costa

Vai ganhano eleitorado

Vai o povo iludino

No seu direito divino

De votá e sê votado

NARRADOR1- Quando ocorre a eleição

Povo fica afragelado

Corre atrás de avião

Besta e maravilhado

Querendo ver o doutor

Que a sua mão molhou

Naquele pleito passado

NARRADOR2- É duído tanta gente

No mêi dessa caganêra

Os ‘’ome arreganha os dente

No circo da discursêra

O home vira inté bicho

Cum a vergonha no lixo

Seno vindido na fêra.

NARRADOR1- É moça virando quenga

Homem vendendo a mulher

E dentro dessa moenda

Gente vira um qualquer

Cumpôca o povo vai dar

Sua família, seu lar

Tudo que o Poder quer.

NARRADOR2- Falá qui o povo vota

Pruquê é pobre, coitado

Num cridito nessa mota

Tem muito dotô comprado

Pobreza não justifica

Vergonha é qui isprica

Êtha! Zome discarado

NARRADOR1- O povo tem que saber

Ele é quem manda na praça

Político tem que comer

Na mão do povo na raça

Mas tudo é invertido

E o eleitor “tão sabido”

Comendo bosta de graça.

NARRADOR2- E vamo agora narrá

A histora do Antero

Cum sua muié Dadá

Qui é um caso bem séro

Num deixa se abatê

Mermo pobre sem cumê

Ela tem os seus mistéro

NARRADOR1- E ela pensa diferente

Do marido puxa-saco

De preguiçoso é doente

E tem uma vida de gato

Só pensa em rede e mesa

E vivendo na pobreza

Não dá um prego em sapato.

NARRADOR2- No tempo da inleição

A terra treme danada

Dadá num qué votá não

Nos home da palancada

É truvejo todo dia

É tanta sucurumia

Uma zuêra retada.

NARRADOR1- Lá vem eles se chegando

Eu vou é capando o gato

Pra não ver eles brigando

Feito boi e o carrapato

Que eles falem por si

O que eu comecei aqui

Pra vocês verem de fato.

(ENTRAM DADÁ E ANTERO)

DADÁ- Marido! Seu disgramento!

Donde tu vem nessa hora?

Já foi buscá o cimento

Qui te prometeu a Flora?

Toma vergonha na cara

Não se venda a essa cabra

Prefeitinha nove hora.

ANTERO- Ô muiê discumungada!

Tu fica quéta num canto

Não me venha cum lapada

Qui eu já num guento tanto

É tempo de inleição

E um pratim de feijão

Nóis só ganha nesse ano.

DADÁ- Tu devia é trabaiá

Dexá de ser baba-ovo

E dexá de imbostá

Nessas cunversa do povo

É fêi um home pidi

Se rebaxá... sai daqui!

Pistiado priguiçoso.

ANTERO- Muiê vê se tuma jeito

Seja mais mansa cumigo

Vô votá para prefeito

No Zé, da Flora o marido

Ele vai me dá imprego

E nóis vai tê mais sussêgo

Prá acarmá nosso isprito.

DADÁ- Imprêgo? Pra qui imprêgo?

Tu num é de trabaiá

Tu nunca foi um sujeito

De uma força butá

É lerdo cuma uma lesma

Só sabe tumá celveja

E de noite furunfá.

ANTERO- Muiê me dá djutóro

Tu é a minha valença

Dê um voto ao Zé Libóro

Ou vote na sá Vicença

Largue mão de ser treitêra

Sei qui tudo é mulequêra

Mas o dinhêro é bença.

DADÁ- Tu me dêxa apirriada

Vontade de te largá

Mas tenho aguniada

Medo de Deus castigá

Ah! se pudesse, seu cão!

Pegava a mão-de-pilão

Pra tua cara rachá.

ANTERO- Dadá, muié inxirida

Se aquiete, dêxe disso

Tu é bem mais atrivida

Qui a Dadá de Curisco

Se tu dexá de sê minha

Tu vai morrer bem mortinha

Muiê largada é um bicho.

DADÁ- Tu tá bom de trabaiá

E dexá dessa lezêra

Tu só gosta no fuá

Num pensa mermo na fêra

Quem cridita in canidato

É barrido atulemado

Só véve no orivêja.

ANTERO- Ô muiê tu num me xinga

Mais eu fis uma apostinha:

Uma garrafa de pinga

E umas sete galinha

Eu sei que num vô perdê

Zé Libóro vai vencê

Vai sê bom! Vixe mainha!

DADÁ- O qui tu tem na cabeça

Num pode saí dos trio

Tu parece uma besta

Do mermo jeito do tio

Tu nada tem pra postá

Cumé qui tu vai pagá?

Só se dé eu e teus fio.

ANTERO- O canidato vem em casa

Pra cum você prusiá

Seja boa e lhe dê asa

Vá uma galinha matá

Dêxa o home cumê bem

É isso qui me convém

Pro meu imprego ganhá.

DADÁ- Tu tem arguma galinha

Para cuzê pro dotô?

Tem uma ôia de farinha

E merda qui tu cagô

Òia aqui: ô meu marido

Qui num venha o atrivido

Pois mélo ele de cocô.

ANTERO- Não é assim que se trata

Um home tão importante

Dê beijinhos num martrata

Mermo sem a musga, dance

Deixa o home bem filis

E vê lá o qui tu diz

Pois tu é muito falante

DADÁ- Oxente seu disgramado

Tu qué qui eu beije ôto ?

Tá ficano mariado

Ô tá quereno sê corno?

Num sô muiê de quenguice

E se tu qué levá chife

Pricisa casá de novo

.

ANTERO- Eu já tô discabriado

Vou é pru bá do Bidó

Pois eu já tô é cansado

Tu fica aí falano só

Eu vô tumá uma pinga

Vô é inchê a muringa

Pois é muito mais mió.

DADÁ- Antão survêta pistiado!

Izala daqui, cagão

Pau dӇgua incanzinado

Cara de jegue, bundão

Vai bebê tua surrapa

Mais sem fazê arruaça

Sinão eu te pico a mão.

(ANTERO SAI)

DADÁ- Vocêis viro cuma é?

In tempo de inleição

Tem qui sê muito muié

Pra guentá infernação

Parece qui tudo pode

É homem virano bode

E muié virano o cão.

Agora veja mininos

Votá pur um empreguim

E eu aqui me cunsumino

Suzinha no meu cantim

Vocêis num vão criditá

E o imprego qual será?

Qui vão dá pro Antero?

Mais ele bem qui merece

Tá morto mermo e carece

Sabe o qui ele vai sê

Se Zé Libóro vencê?

Portêro do cimitéro.

9-ANÁLISE DO DISCURSO-Através das marcas textuais pode-se compreender o funcionamento discursivo da linguagem. No objeto apresentado é possível observar através do percurso discursivo a existência de três estágios :1º , apresentação do tema na voz dos narradores; 2º , desenvolvimento da temática na voz de Antero e Dadá; 3º conclusão na voz de Dadá.O percurso formulado é trabalhado para que a personagem Dadá seja configurada como exemplo social, a ser transmitido no meio onde circulará o cordel e é formulada a partir de sua concepção política diferente da idéia geral que o cordel deixa transparecer, que é a compra de votos e os expedientes usados para este fim. A voz social da mulher aparece também atrelada às idéias de pecado x punição, demonstrando a religiosidade típica do cordel. O estereótipo, “caipira preguiçoso”, inter-texto para o cordel, faz com que a autora apenas coloque os sentidos já existentes sobre a figura de Antero. A repetição de palavras entre os verso (palavras em negrito) “É um tal de lufa-lufa: Um toma lá e dá cá; É tanto fio da puta “Quereno a gente compra; Quereno vivê no manso” e as rimas alternadas produzem a melodia efeito de brincadeira. Esse efeito é constituído por meio do funcionamento do ritmo e permite que o cordel, mesmo tratando de um assunto polêmico, que é a política, circule de maneira mais amena entre os interlocutores (público). Os elementos de Rabelais estão presentes em “Comendo bosta de graça” , expressão despida de maldade, usada corriqueiramente,especialmente no Nordeste significando “esforço infrutífero”, ou em “ “Mélo ele de cocô”, onde a ambivalência de que fala Bakhitin demonstra que longe de se revestir de um sentido deprimente, a expressão significa o repúdio e a revolta de Dadá contra os métodos escusos e mesquinhos que alguns políticos usam para conseguirem votos, reafirmando assim a sua ideologia política, contrária ao senso comum demonstrado pelos narradores. Na literatura é assim: “cocô” pode significar dignidade e pureza de caráter.

Quanto ao lugar de fala, a autora se desloca e este deslocamento é notado nas marcas de língua culta deixadas intencionalmente na fala do Narrador1. Depois há marcas textuais pouco usadas na fala popular como a inversão de termos como em “Zé, da Flora o marido” e a supressão de letras (“Os ’ome arreganha os dente) para manter a fidelidade às leis da métrica e consequentemente ao ritmo que caracteriza o cordel. Outro argumento para a mudança do lugar de fala da autoria é a criação de personagens a quem é delegado o poder de discurso, para transmitir uma ideologia e o compromisso da fala no narrador 1 onde se nota predominância da linguagem culta. O direito de discurso outorgado aos personagens cria um efeito de sentido, pois quando se coloca a própria pessoa se significando, através da sua voz, torna a mensagem muito mais expressiva, do que se fosse um outro falando da vida de quem ele observa.

. A intimidade com palavras e expressões populares nos dá o entendimento de que fazem parte do universo em que a autora convive e que o caráter ficcional dos personagens tem bases na mimese (Aristóteles) da realidade. Dadá e Antero são tipos inspirados nas vivências e no senso observador e crítico. Em Dada, é expressa a não-aceitação da submissão da mulher a seu companheiro e o desejo de que todas as mulheres se libertem pessoal e politicamente. O nome “Dadá”faz uma referência à “Dada” de Corisco,figura feminina ligada ao cangaço e consequentemente ao cordel brasileiro. “Antero”, só para fins estilísticos (rimas). Os dois nomes são comuns no Nordeste.

10-ANÁLISE LITERÁRIA

I-Tema- Política brasileira e suas mazelas, recortada à pequenas cidades.

II_+Enredo- Desenvolve-se através de uma briga de casal, ensejada pela política partidária.

III-Recursos discursivos- a)Narração:

“Eu contar pra vocês

Um episódio irritante

Que acontece toda vez

Nesse tempo intolerante

É tempo de eleição

E todos ficam na mão

De gente tão importante”

b)Diálogo

“-Eu já tô discabriado

Vou é pru bá do Bidó

Pois eu já tô é cansado

Tu fica aí falano só

Eu vô tumá uma pinga

Vô é inchê a muringa

Pois é muito mais mió.

-Antão survêta pistiado!

Izala daqui, cagão

Pau dӇgua incanzinado

Cara de jegue, bundão

Vai bebê tua surrapa

Mais sem fazê arruaça

Sinão eu te pico a mão”.

IV-Foco narrativo- 1ª pessoa do singular tanto na narração como nos diálogos, o que revela o caráter intimista do cordel.Na Narração: “Eu contar pra vocês” (...) “ Pra vocês verem de fato”. No Diálogo: “Eu já tô discabriado

Vou é pru bá do Bidó(...)

V- Personagens- Antero e Dadá

Aspectos Físicos- Por ter perspectiva intimista, o cordel não declara os caracteres físicos dos personagens.

Aspectos psicológicos – Antero: a) Preguiçoso, indolente e bajulador

“Tu devia é trabaiá

Dexá de ser baba-ovo

E dexá de imbostá

Nessas cunversa do povo

É fêi um home pidi

Se rebaxá... sai daqui!

Pistiado priguiçoso”.

b)Mau-caráter- - “Muiê me dá djutóro Sei qui tudo é mulequêra

Tu é a minha valença Mais o dinhêro é bença”

Dê um voto ao Zé Libóro

Ou vote na sá Vicença

Largue mão de ser treitêra

c)Inconvincente- Todas as falas de Dadá)

d)Fraco: “ Antão survêta pistiado!

Izala daqui, cagão

Pau dӇgua incanzinado

Cara de jegue, bundão

Vai bebê tua surrapa

Mais sem fazê arruaça

Sinão eu te pico a mão”.

Dadá- a)Corajosa- “Tu devia é trabaiá

Dexá de ser baba-ovo

E dexá de imbostá

Nessas cunversa do povo

É fêi um home pidi

Se rebaxá... sai daqui!

Pistiado priguiçoso”.

b)Contestadora- Todas as falas

c)Irônica- “Vocêis num vão criditá

E o imprego, qual será?

O que vão dá pro Antero?

Mas ele bem qui merece

Tá morto mermo e carece

Sabe o qui ele vai sê

Se Zé Libóro vencê?

Portêro do cimetéro”.

d)Politicamente consciente- “Tu tá bom de trabaiá

E dexá dessa lezêra

Tu só gosta no fuá

Num pensa mermo na fêra

Quem cridita in canidato

É barrido atulemado

Só véve no orivêja”.

VI-Espaço- Algum lugar do interior da Bahia.

VII_Tempo- Período que precede as eleições municipais.

VIII-Aspectos Mórficos:a) Tipologia Textual- Versos heptassílabos (contém sete sílabas poéticas ou pés), formando estrofes de sete versos, excetuando-se a última estrofe que possui doze versos, também contendo sete pés.

b)Rimas – apresentam-se sob o aspecto: ABABCCB com exceção da última estrofe, cujo aspecto formal é ABABCCDEEFFD

XIX-Elementos típicos do cordel –a) Religiosidade “Mas tenho aguniada Medo de Deus castigá”, argúcia dos personagens e o poder do dinheiro

“Muiê me dá djutóro

Tu é a minha valença

Dê um voto ao Zé Libóro

Ou vote na sá Vicença

Largue mão de ser treitêra

Sei qui tudo é mulequêra

Mas o dinhêro é bença”.

b)Submissão da mulher. O poder masculino típico do cordel é contestado por Dadá.

“Oxente seu disgramado

Tu qué qui eu beije ôto ?

Tá ficano mariado

Ô tá quereno sê corno?

Num sô muiê de quenguice

E se tu qué levá chife

Pricisa casá de novo”

X- Figuras de Linguagem- a)Aliteração( repetição de palavras e sons no início dos versos)”Tu num gosta de trabaiá . Tu mum foi um sujeito de uma força botá;”

b) Metonímia-“pratim de feijão” toma a parte pelo todo, significando qualquer alimento;

c)Substantivação- (Mudança da classe gramatical de uma palavra ou termo por intermédio da anteposição de um artigo definido. ”Aquilo que o povo herda É somente “o nada faz”

d)Hipérbole- ( exagero de expressão como reforço de sentido) “corre atrais de avião...”

e)Metáfora- (Comparação intrínseca) “O circo da discusêra” (A autora compara os comícios à palhaçada, pilhéria);

f)Prosopopéia- (Atribuição de caracteres humanos a seres inanimados)” A terra treme danada”.

g)Onomatopéia- ( Reprodução de sons e ruídos) “ É um toc-toc amuado”

h)Neologismo- (Palavras criadas a partir da necessidade momentânea) “palancada” e “mota”, criadas para efeito de rima.

i) Símile- ( Igualdade ou aproximação de duas idéias, por meio de uma preposição) “feito boi e carrapato” “ é lerdo cuma uma lesma”.

j) Pleonasmo- ( Reforço de expressão por meio da repetição “T u vai morrer bem mortinha”

l) Ironia- representada pelas aspas em “Desses homens “importantes” e” E o eleitor “tão sabido”

m)Antítese- (aproximação de idéias contrárias) “Sei qui tudo é mulequêra mas o dibhêro é bença”

É importante notar que no último verso da 3ª estrofe (Do prefeitinho “bacana”.) há um efeito idêntico ao que há na música “Cálice” de Chico Buarque”(...) Silêncio na cidade não se escuta. De que me vale ser filho da santa Melhor seria ser filho da outra”. Nota-se em Chico que, ao invés de “filho da outra” pensa-se na palavra óbvia ( puta) que rimaria com luta, bruta, escuta mas que não foi autorizada devido à época em que a música foi criada. No cordel, a palavra “bacana”, face à liberdade de expressão atual poderia ser “sacana”, mas, deliberadamente a autora deixou a dedução para o leitor.

11- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Espera-se que este trabalho tenha contribuído para os estudos da Literatura de Cordel no sentido de se fugir à visão equivocada de que a linguagem da cultura popular é tosca e pobre. No decorrer das análises procura-se evidenciar, tanto do ponto de vista literário quanto discursivo que os elementos e imagens focados no texto são os mesmos que podem ser identificados numa obra clássica, sacramentada pelo mundo dito “culto.

8 -REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ORLANDI. Discurso e texto, formulação e circulação dos sentidos. Ed.Pontes, Campinas 2002.

PÊCHEUX, M.(1988) Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Editora

MOISÉS. Massaud. A Análise Literária. 14ª edição. Editora Cultrix. São Paulo.Sp 1996.

WELLECH &WARREN. René e Austin. Trad. L.C. Borges.Teoria da Literarura e Metodologia dos Estudos Literários. Editora Martins Fontes. Campinas.SP.2003

BAKHITIN, Mikhail. O Vocabulário da Praça Pública na Obra de Rabelais. In BAKHITIN, Mikhail. A Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento. No contexto de Rabelais, 5ª edição de S. Paulo SP. Hucitec 2002 PP 125-169.

BAGNO. Marcos. Preconceito Lingüístico:o que é, como se faz Editora Loyola. São Paulo-SP2002.

FIORIN. José Luiz. Linguagem e Ideologia. 8ª edição. Editora Ática. São Paulo.SP.2002.

KAYSER. Wolfgang. Análise e Interpretação da Obra Literária. Trad. De ArMênio Amado. 6ª edição. Editora Coimbra. São Paulo.1976.

Vivianna di Castro
Enviado por Vivianna di Castro em 07/11/2010
Reeditado em 07/11/2010
Código do texto: T2602134