Sonetos para Fernada
Sonetos para Fernanda
I
Amei-te tanto, e agi ao desertar-te,
De modo tal obrando qual não fora,
Em ato vil que a vida me desdoura,
Sem descontinuar-me de amar-te
Segui-me a tua imagem a ti dar parte,
Privando-me do alivio de esquecer-te,
Pois te privando de mim, me fiz perder-te,
Afogado na dor de não chorar-te.
Do lugar que em minh’alma ocupastes,
Ninguém jamais te tirou, e por querer-te,
Habituei-me a em tudo sempre ver-te,
No remorso das magoas que chorastes,
Na tristeza contínua de não ter-te,
No imenso vazio que deixaste.
II
Eras criança; e eu criança ainda,
Quando me fez o destino encontrar-te,
E na trama que urdiu pra ver-me amar-te,
Fez os meus olhos te verem ali mais linda.
Era eu imberbe, e tu inda menina,
Impúbere, infantil e até carente,
Dos saberes da vida, e inocente,
Viste enlaçar-se a minha a tua sina
A incontrolável força que domina,
A vida dos mortais, e as entrelaça,
Forjou no nosso amor a tua desgraça.
Pois eis que aleatória predomina;
A relação indensa ou torna garça,
E tal qual nos exalta, nos fulmina.
III
Foram segundos que viraram dias,
Compostos de minutos e horas vãs,
Semanas, meses, anos, décadas; e cãs,
Adornaram-me as frontes onde vias,
Sinais de inteligência, e onde fazias,
Caricias aos meus cabelos, vastos então,
Fazendo-me embalar no sonho vão
Da exatidão dos sonhos que sentias.
Jamais imaginastes que serias
Deserdada da sorte que sonhastes
E na magoa dos prantos que chorastes
Em noites longas, plenas de agonias,
Foram os momentos bons que recordastes
Causa - mor das desgraças que sofrias.
IV
Aguardaste seis anos, os olhos postos,
Na estrada da vida onde sumiram,
Os sonhos teus, que se indo te feriram,
Com prantos, dores, mágoas e desgostos,
Prantos saudosos, dores ao ver os rostos,
Dos filhos; que a ti, de mim lembravam,
Mágoas de mim; ao ver que te causavam,
Minhas ingratidões tantos desgostos.
Os sofrimentos que te foram impostos,
Pela vida, jamais te degradaram,
Só te fortaleceram e em ti moldaram,
Tão fortes sentimentos, pois expostos,
Os jovens e fracos, antigos, se tornaram,
Fortes escudos, aos males antepostos.
V
Vendo-te hoje, vencendo a meia-idade,
Cercada por teus netos que te adoram,
Vejo; teus negros olhos, já não choram,
Por males já passados, ou por saudade,
És rocha sólida, e hoje na verdade,
A jovem que abandonei, em ti não vejo,
Reside em meu passado, e meu desejo,
É conservar por ti pura amizade.
Jamais te esqueci, esta é a verdade,
Confesso-te, cometi dura maldade,
Pois sei, também de mim jamais esqueces.
Por isto com, com fervor e humildade.
A Deus, diariamente em minhas preces,
Peço sempre por ti, sei que mereces.