Um engano cego d'Amor

Com ilustre Amor ilustrando o peito,

Um bom tempo vivi no engano cego,

E tal estava o Amor posto em sossego

Que a mim pareceu estado tão perfeito.

Mas vendo agora o que Amor me tem feito,

Sabendo enfim os danos a que me entrego,

É por via que não posso ter sossego

Neste cego engano meu tão afeito!

Não vos iludais nenhum humano,

Que Amor em seus tão altos favores

Não vos possa causar algum dano,

Porque, primeiro Amor vos contentais,

Mas depois em tão desatinadas dores

Vereis como de Amor não mais queirais!