ASSOMBRO
Fico feliz quando das nuvens nascem
uma ordem outra de seres: modelos
míticos, forjados, nobre linhagem,
como uma escultura entalhada em gelo.
E a sina, precedente à Medusa,
não mais sinaliza este pesadelo,
de tanta imagem borrada, confusa;
é a substância insolúvel do sonho,
onde os olhos recaem, sem recusa,
no corpo mineral do dia. Ponho,
sem furtar-me do trigo da penúria,
nuvens dispersas na febre dos sonhos
— ante o mistério do alto e a sua fúria,
esqueço o rastear na lama espúria.