SONETO I

Eu só me acho em mim quando me desfaço

do que me esvazia. É quando transbordo

salgando a água, a língua e assim me acordo

- maré que empurra o rio num contra-arrasto.

Ao longe um barco ao mar - ninguém a bordo -

foge do porto. O porto é seu cansaço.

Busca no mar, do mar o último abraço

descalço e nu – no porto seus despojos.

O mar é rede. O porto é tempestade,

quiçá a mão de todos os naufrágios.

Onde se bebe a dor da eternidade

e onde se urde todos os presságios.

E o barco e o mar se fundem num enlace

ao som de um horizonte azul-adágio.

MARCELO VALOIS
Enviado por MARCELO VALOIS em 09/09/2024
Reeditado em 26/09/2024
Código do texto: T8147745
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