SONETO I
Eu só me acho em mim quando me desfaço
do que me esvazia. É quando transbordo
salgando a água, a língua e assim me acordo
- maré que empurra o rio num contra-arrasto.
Ao longe um barco ao mar - ninguém a bordo -
foge do porto. O porto é seu cansaço.
Busca no mar, do mar o último abraço
descalço e nu – no porto seus despojos.
O mar é rede. O porto é tempestade,
quiçá a mão de todos os naufrágios.
Onde se bebe a dor da eternidade
e onde se urde todos os presságios.
E o barco e o mar se fundem num enlace
ao som de um horizonte azul-adágio.