*TRILHA ABSC 10 - CENAS DO COTIDIANO*

*DIA DE BRANCO*

No recomeço, à madrugada escura,

Em cumprimento do dever, sozinho,

Embalo os passos, surdos, no caminho,

Principiando a laboral ventura.

Em meio à suburbana arquitetura,

Adentro a multidão, em desalinho,

Que marcha resmungando bem baixinho

Como se encaminhando à sepultura...

As faces, fundos sulcos de canseira,

Evidenciam a segunda-feira

E o velho realismo suburbano...

Neste relato, a cena costumeira

Traduz a romaria rotineira

Dos proletários no cotidiano.

Ricardo Camacho

*POLUIÇÃO SONORA*

Buzinas e sirenes… britadeira!

Quisera por o mundo “na surdina”

(recurso que o piano discrimina

a matizar os sons, sobremaneira…)

No meio da avenida, a betoneira

castiga meus ouvidos, me alucina…

(a rua dos meus tempos de menina

foi palco de avezinha cantadeira).

Se agora adoto o tom de nostalgia,

é fuga da audição que se arrelia

com o cruel triunfo do ruído…

A música que a mídia, por capricho,

impõe ao cidadão é puro lixo…

Quisera, Deus, ter pálpebras o ouvido!

Elvira Drummond

*LABOR SEM FIM*

Manhã de sol… cidade em movimento,

calçadas cheias, trânsito lotado

e em muitas mentes flui um pensamento:

“chegar no emprego e o ponto, registrado.”

Trabalho e casa… nesta, pouco alento;

o banho do casal, não prolongado.

Cuidar dos filhos, roupas, alimento…

Novela e futebol?… No feriado!

Criança, o aposentado e o preguiçoso

(um outro grupo, às vezes, ocioso),

desfrutam dos aromas de um jardim.

Na madrugada a pressa se esvazia…

Vem nova aurora, instiga à correria

e tal labor parece ser sem fim.

Lucília A. T. Decarli

*OS SONS DA MADRUGADA*

Um som parece vir da casa ao lado,

uma TV, um rádio, uma vitrola,

demonstrando que alguém está acordado,

sofrendo a mesma insônia que me assola.

Ao longe um galo doido cantarola,

num ritmo repetido e alucinado.

Mais longe ainda, o som de uma viola

dá voz a um coração apaixonado.

Enquanto os gatos miam namorando,

eu sigo em minha cama reparando

um bando de cachorros a latir.

Nasce o dia... os ruídos da alvorada

vão abafando os sons da madrugada

de quem passou a noite sem dormir.

Arlindo Tadeu Hagen

*RETALHOS METROPOLITANOS*

Na praça, em frente à grande catedral,

Trajando o seu duríssimo destino,

Alguns idosos, ante o som do sino,

Despertam sobre as folhas de jornal;

Enquanto os carros param no sinal,

Descalço, pede esmolas um menino

Numa avenida, sob o sol a pino...

Retalhos da tragédia social!

São traços da abissal desigualdade,

E há muitas dessas cenas na cidade...

De tão banais, já são cotidianas.

Empunho um verso e indago-me: até quando

Prosseguiremos nos acostumando

A certas coisas tão brutais e insanas?

Gilliard Santos

*OS PORTAIS*

O refletor celeste, ao fim da lida,

deitado sobre densos matagais,

expande o louro abraço e dá sinais

de sua majestosa despedida.

As águas, de beleza desmedida,

à espera das pinturas noturnais,

transformam as correntes em portais

por onde passa a luz enfraquecida.

Um barco, a deslizar no espelho, adorna

a tarde morrediça, ainda morna,

repleta de magia, graça e encanto.

O rio encanta todas as retinas

que enlaçam as imagens vespertinas,

justificando os versos deste canto...

Jerson Brito

*A FEIRA*

É puro encantamento e poesia

a feira de domingo na cidade!

Envolve intensamente a sociedade,

num vai-e-vem, repleto de alegria!

Ali, circula gente, nesse dia,

de toda classe e de qualquer idade!

Produtos há de grande variedade,

para atender à imensa freguesia.

Os importados têm presença certa!

Salgados, doces, caldos com pimenta!

Sempre bem-vindos, quando a fome aperta!

Roupa usada, sapato, ferramenta

e um burburinho, que a atenção desperta:

É a fila do pastel que só aumenta!

Fernando Antônio Belino