Os versos de Severino

Severino tinha um séc'lo de vida,

Mas nunca havia feito verso nenhum,

Colecionava muita poesia lida,

Lia à noite, e quando acordava em jejum.

Vivia num sítio (era rural, pacato).

Sozinho, estava há décadas viúvo.

Nada escrevia, e o que lhe vinha ao tato

Não eram mais do que vislumbres turvos...

Um dia, enquanto o seu último suspiro,

Tomou sob as mãos um sujo papiro,

Pressionando entre os dedos a caneta

Escreveu esses versos mais supremos:

"O sofrer é essa fruta que colhemos,

E a vida: cruenta horta irriquieta".