NOS CONFINS DA AMAZÔNIA
NOS CONFINS DA AMAZÔNIA
Inesquecível aventura amazônica
Os serviços fluviais para a saúde
Arando nos rios da selva icônica
Comissões de imensa magnitude
No atendimento médico e social
O navio de assistência ribeirinha
Afamado flutuante hospital geral
Orgulho referenciado da Marinha
Companheiros de avental e farda
Atuando com a força do coração
Nas linhas de frente e retaguarda
Socorrendo com amor e devoção
Longe da família e conforto do lar
Nosso sacrifício tinha um sentido
Levar a esperança, visível no olhar
Dos irmãos ribeirinhos desvalidos
Marco Antônio Abreu Florentino
Homenagem aos companheiros de farda e jaleco tripulantes do NAsH (Navio de Assistência Hospitalar) Oswaldo Cruz - U18.
Projetado e construído no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ) para operar na região amazônica, é o primeiro de sua classe. Incorporado à Armada da Marinha do Brasil em 1984
Suas comissões iniciais com a primeira tripulação foram nos anos de 1985, 86 e 87. As principais características da embarcação eram:
Tripulação: 27 homens,sendo 6 oficiais e 22 praças
Equipe médica: 4 oficiais médicos, 2 oficiais dentistas e 15 praças enfermeiros/farmacêuticos.
Facilidades médicas: 2 ambulatórios, 2 gabinetes odontológicos, 2 gabinetes médico/farmácia,1 laboratório, 1 farmácia, 1 sala de raio X, 2 enfermarias, 1 sala de cirurgia, sistema de computadores para cadastramento dos ribeirinhos e sala para instrução e palestras.
Nesses anos foram realizadas diversas comissões de atendimento pelos rios da Amazônia: Solimões, Tocantins, Purus, Juruá. Tapajós e Javari entre outros.
Durante meu período embarcado, tive a sorte de navegar com excelentes companheiros profissionais de saúde e militares, liderados por um comandante de altíssima qualidade humana e profissional, à época Capitão de Fragata Ronaldo Megdalani Carvalho.
Guardo agradável e grata lembrança dos companheiros a saber, com suas patentes à época:
Oficiais:
Capitão de Corveta Fausto = Imediato
Capitão-Tenente Santos = Chemaq (Chefe de máquinas)
Capitão-Tenente Figueiredo = Oficial Administrativo
Capitão-Tenente Dias= Médico Cirurgião, chefe da equipe de saúde..
Capitão-Tenente Túlio = Odontólogo
Primeiro Tenente Bosco = Odontólogo
Primeiro Tenente Castro = Médico Clínico e Auxiliar Cirúrgico
Primeiro Tenente Vasconcelos = Médico Ginecologista Obstetra
Primeiro Tenente Abreu (eu) = Médico Pediatra
Primeiro Tenente Melo = Farmacêutico
Segundo Tenente Rubião = Oficial da Armada
Praças que recordo:
Primeiro Sargento Martins = Enfermeiro
Cabo Machado = Enfermeiro
Cabo Negrão = Cozinheiro (inesquecível rsrs)
Desses citados, atualmente só tenho notícias do Comandante Megdaslani (Capitão de Mar e Guerra da reserva), Dr. Dias (Vice Almirante da reserva), Dr. Castro (Capitão de Mar e Guerra da reserva) e um grande amigo irmão que permaneceu em contato até os dias de hoje - Dr. Tulio (Capitão de Mar e Guerra da reserva).
Aqui vai minha homenagem, agradecimento e grande abraço a todos, particularmente a esse meu amigo de todas as horas Tulio Cesar Ferreira de Oliveira, com as desculpas para os que esqueci os nomes.
Reedito, a seguir, o texto escrito após minha saída da Marinha do Brasil, tentando descrever um pouco do sentimento que vivíamos:
EPOPÉIA AMAZÔNICA - A BORDO DE UM NAsH
Chamo de ¨autêntica aventura¨ a participação em missões a bordo dos Navios de Assistência Hospitalar (NAsH) da Marinha do Brasil na região amazônica.
Como oficial médico, embarquei em 1986 no NAsH Oswaldo Cruz na condição de seu segundo pediatra, visto que sua incorporação à Marinha ocorreu em 1984 e sua primeira comissão de assistência aos povos ribeirinhos dos rios da Amazônia aconteceu em 1985.
Lembro, como se fosse hoje, nosso Comandante, verdadeiro líder nato, inteligente e muito espirituoso, dizer que o navio tinha um diferencial importante em relação a outros navios da Marinha: nossos armamentos e canhões eram seringas, agulhas, bisturis, estetoscópios e brocas odontológicas.
Nossa primeira comissão naquele ano foi no Rio Tocantins, sua foz e a ilha de Marajó. Visitamos, nesta grande ilha do Pará, uma cidadezinha chamada Genipapo , toda construida sobre palafitas. Não conseguíamos aterrissar o helicóptero (Esquilo), em função do aglomerado que a população local formava devido o ineditismo da situação. Quando finalmente conseguimos, nos sentimos como ¨deuses astronautas¨ para aquele povo, tão estarrecidos com a visão de nossas presenças paramentados com fardas apropriadas a missões aéreas, que até pareciam estar em transe.
Várias situações, de toda ordem, médicas ou não, foram vivenciadas, mas as que mais marcaram foram as ocorridas durante a Comissão do Rio Juruá, quando também enfrentamos a febre negra do Amazonas, a alta incidência de hanseníase, muita desnutrição, raquitismo, verminoses e até mesmo formas raras de uma doença dermatológica chamada pênfigo, como no caso do ¨menino peixe¨, de onze anos de idade, cuja pele estava totalmente coberta por escamas oleosas e fétidas, obrigando-nos a embarcá-lo, juntamente com a mãe e um irmão, para inicio de tratamento no navio e continuação em centro especializado de Manaus. A grande maioria das pessoas dessa região nunca tinha sido atendida por um médico ou dentista.
No entardecer deslumbrante da Amazônia, navegando mansamente nos confins da selva, no alto Juruá, longe de tudo e do mundo, em silêncio absoluto, vivíamos a estranha sensação contraditória de nos sentirmos parte daquela natureza encantadora e misteriosa, ouvindo o mais delicado som das águas, plantas e animais e a saudade de casa, da nossa condição urbana caótica, porém incrustada na nossa origem e forma de viver.
Poucos brasileiros tem o privilégio de conhecer profundamente essa região mágica e a essência da sua população. Não me refiro às grandes cidades e aglomerados urbanos: Belém, Manaus, Macapá, Rio Branco e outras capitais e sim a alma da Amazônia, com seus rios, floresta, flora e fauna, mormente através de ações que levem a esperança de uma vida melhor ao seu patrimônio humano, com a minimização dos seus sofrimentos.
Marco Antônio Abreu Florentino
Médico Pediatra