MAGIA I/XII
MAGIA I (27 MAI 11)
Contra o escuro do cosmos espelha-se a magia:
verdes nuvens de gás matéria negra espantam;
espiam algumas estrelas sob o fulgor e cantam,
afastando a tensão que o peito me oprimia.
Há vinte anos apenas, sequer alguém sabia
haver tais maravilhas que meu olhar imantam;
os toques do silêncio que o peito me acalantam,
somente uma centelha que a fulgurar jazia...
E se não fosse o Hubble, somente julgaria (*)
uma luzinha a mais, piscando no infinito.
E sem a outra magia da atual computação,
tampouco em suas mil cores à mente fulgiria,
deixando a inquietação no coração aflito
inerme a maquinar não mais que sua ilusão.
(*) O grande telescópio na estratosfera.
MAGIA II
Essa explosão de luz quiçá não exista mais,
perdida nos milênios da senda luminosa.
Além dos seus limites, a estranha e verde rosa
palpita a sufocar minha ânsia do jamais...
É quase inconcebível que os vácuos siderais
transpostos tenham sido por essa majestosa
imagem de esplendor, galáxia portentosa
e inda assim imperceptível às vistas naturais...
E como nos desperta o senso de humildade,
que pulse nos milênios, na imensidão do espaço
o verde anel de luz, feição da divindade...
O olho-de-gato oculto em seu profundo abraço
e totalmente oculto à visão da humanidade,
que só há uma geração contempla seu regaço!...
MAGIA III
E pensar se compara à Via Láctea nossa,
que é imensa nebulosa e que há universo além,
que através desse verde existem sóis também,
brilhantes o bastante que divisar se possa,
perdidos pelo cosmos em sua imensa fossa,
que brilhos estelares possam ocultar, porém,
ainda outras galáxias, que potência não se tem
por distinguir sequer, que a mente apenas roça!
E mesmo assim se orgulha a pobre humanidade,
a habitar somente o seu planeta obscuro,
em torno desse Sol, que pode ser brilhante,
e se acha, não obstante, em inferioridade
a tantos astros mais, a reluzir no escuro,
outra candeia apenas da entropia triunfante...
MAGIA IV – 25 SET 2023
E pode alguém pensar que algum deus,
que demiurgo seja de nosso astro pequeno,
ou mesmo imaginar assim que o Deus Supremo
criou o candelabro montado sobre os céus
apenas para o vermos? E quais ocultos véus
ainda nos separam do singular veneno
que todo orgulho humano reduz a seu extremo,
em ironia tão grande aos gritos dos ateus?
E lá está a galáxia, chamada Olho-de-Gato,
em gradação arcoírica, em supernal espectro,
a diluir-se sempre na aurora do infinito...
E o símbolo complexo desenha-se, de fato,
laranja e rubro-ouro, como a tocar o plectro,
numa canção plangente, em seu tanger bendito.
MAGIA V
Ali se encontra o símbolo sem dúvida escolhido,
desde as mais priscas eras, por mentes de hierofantes,
sem ao menos possuírem quaisquer lentes gigantes
que tal fulgor de luz lhes deixassem percebido.
No centro da explosão verdicler está contido
um íris azulado de gamas triunfantes,
concêntrico o pulsar em gradações radiantes,
desde um turquesa gris ao verde mais nutrido.
Ali o azul celeste de tom clarividente
e nele oscila um fuso anil mais do que o azul,
a circundar ainda o fulcro intergalático,
que em torno ao turmalina se mostra mais simpático,
como um estigma fulgente em vestes de curul,
mesmerizando o olhar em sua luz resplandecente,
MAGIA VI
E silva mais além, em tons de carne e ouros,
magnético plenamente se retorce em geração,
vermelho contra o verde em pura gestação,
raízes de Ygdrasil em curvas de Ouroboros.
E ali explodem novas a definir tesouros,
nessa gama calórica de plena exaltação,
essas nuances que brilham em tal mineração,
dourados esplendores na pauta dos desdouros.
E lá no fundo ainda há glória de outro mundo,
amarelado e rosa em magnético profundo,
girando eternamente além de nosso alcance!
Quantos milhões de estrelas combatem em tal globo?
Não é um olho-de-gato, é um olhar de lobo,
fulgindo em zombaria, sem que jamais se canse!
MAGIA VII – 26 set 23
É nesse que retém-se a auriverde flama?
Cósmicos raios em chispas, percepção magnética,
pétalas crípticas a farfalhar-se em estética,
um círculo mostarda no anel de toda a chama.
E até mesmo um cometa essa coroa reclama,
ah, luzes de entropia, quão pródiga essa ética!
Dispêndio de energia, que emulação patética
nesse olhar hipnótico que para si nos clama!
Mesmérico esplendor que nunca vimos antes!
Por que se encontra lá, indago aos hierofantes,
que a seu tempo imaginaram o signo do infinito!
Enquanto queimo os dedos em tanta exclamação,
mendigo de palavras que admirem a descrição,
com que possa descrever um tão potente agito!
MAGIA VIII
Naturalmente eu julgo, em meu entendimento,
que os deuses só criaram essa imagem para mim,
pois era sua intenção que a descrevesse assim,
em meu arrebatado fervor de sentimento.
E embora minha razão conteste o julgamento,
na singela autocrítica de meu pensar, enfim,
as minhas emoções e complacência, alfim,
se põem a cintilar em seu contentamento.
Que eu seja o porta-voz por eles escolhido,
que a imagem me foi dada pois só eu poderia
descrever desta forma o ideal em sua elegia...
Bem sei a pretensão em que encontro-me envolvido!
Destarte a sobriedade retorna-me em estiagem
e troço de mim mesmo, à luz desta miragem!
MAGIA IX
Mas o estranho do fato é que a nuvem de esplendor,
essa coroa fúlgida de ágata a envolver,
indissoluvelmente só poderia pertencer
a microcosmo qualquer de bem menor pendor.
Poderia ser um vírus, intento em seu horror
e toda a humanidade matar em seu prazer
ou comedidamente tão só fazer sofrer,
mas a um micro-organismo posso sentir rancor?
Alguns a fotografaram e tem grande beleza,
em simetria radial que até é mais perfeita
que a esfera sideral de bordas esgarçadas,
que os vírus, afinal, sem sombra de incerteza,
sobreviver só querem na hospedeira aceita,
enquanto essas galáxias são em chispas esgotadas.
MAGIA X – 27 setembro 2023
Ou poderiam esporos ser de vegetação.
como as plumas de dentes-de-leão;
quando minha mãe me tomava pela mão,
em dias de outono ou mesmo no verão
e me nutria em fantasias fantasmais
e então me mentia: “estas flores tuas são,
com tantas pétalas ouro-laranja em seu botão,
as quais te dei para que não me esqueças mais...”
A multidão de esporos percebo por aí,
de simetria radial, que estrelas são também,
que voam levemente, pairando pelo ar
e cada estrela-pluma que em telescópio percebi
a mim igual pertence por mais estando além,
para desfazerem-se fácil a cada meu piscar.
MAGIA XI
Também estrelas há nas células humanas,
no núcleo sideral de cada citoplasma,
estruturas semelhantes a essa que me pasma
(creio por igual que em imaginar te inflamas).
Hemácias nos emulam galáxias soberanas,
fractais avermelhados do estelar miasma,
que dos paúis internos adejam quais fantasma,
como fiapos de cor que assombrações proclamas.
E vejo assim que são iguais os nossos gens,
por longos filamentos de sua magia movidos,
recamados de rosa para explodir em novas vidas
todos nós acorrentados na saga dos tambéns,
qual da natureza os atos sagazes são cumpridos
em milhares de estruturas mansamente repetidas.
MAGIA XII
Então ponho-me a pensar que também as emoções
sejam tais luzes envoltas em filamentos,
nesse irradiar de multicores pensamentos,
olhos-de-gato iguais iridiados por paixões
e que a Via-Láctea inteira seja só de sentimentos
de divindades em suas mil meditações,
da mente expulsas no fulgir de expirações
e assim me inspirem os próprios julgamentos.
Que seja assim então o estuário em maravilha,
a galáxia celular, a luz que me acompanha,
mil polvilhares de solitária trilha,
fios dessa inspiração que a mente tanto assanha
e que nestes mil versos no final se estilha,
na imensa glória que minha vida inteira banha!