DESENCARNE
Foi no horror dessa noite tão funérea
Que eu descobri, maior talvez que Vinci,
Com a força visualística do lince,
A falta de unidade na matéria!
Augusto dos Anjos
Na noite tenebrosa e mais que fria,
Meu peito na profunda escuridão,
A dor que pelo músculo atrofia,
Vestindo vai a temível podridão.
A vida se recolhe, já não pulsa
Na rígida matéria em combustão
E pende na alma tão tensa, convulsa...
Intervalo de tempo, um sim ou um não.
Com horror diante da urna funerária
Vertendo no caos por onde resvala,
Na angústia se comprime a coronária
Buscando em vão tirar o pé da vala.
E ao som da derradeira e fúnebre ária,
Se deixa vazar no vazio e se cala.