TRILHA DE SONETOS CIII - DIÁLOGO COM CARTOLA

🎵🎶*O MUNDO É UM MOINHO*🎵🎶

(Cartola)

Ainda é cedo, amor

Mal começaste a conhecer a vida

Já anuncias a hora de partida

Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

Presta atenção, querida

Embora eu saiba que estás resolvida

Em cada esquina cai um pouco tua vida

Em pouco tempo não serás mais o que és

Ouça-me bem, amor

Preste atenção, o mundo é um moinho

Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho

Vai reduzir as ilusões a pó

Preste atenção, querida

De cada amor, tu herdarás só o cinismo

Quando notares, estás à beira do abismo

Abismo que cavaste com teus pés.

(... bis)

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*IMPULSO*

Prevejo, amor, a tua inquietude

em pôr o pé na estrada e dar partida

dando um sentido novo à tua vida...

Porém é tão instável a atitude

gerida no frescor da juventude,

sem planos, por impulso resolvida!

É cedo, amor, escuta-me querida,

na bruma da paixão, o sonho ilude,

a insânia se revela e o desalinho

tritura o coração igual moinho,

mói e remói, sangrando, e causa dó...

A frustração da vida nos ensina

que o mundo nos assalta a cada esquina

e os sonhos, sequestrados, viram pó.

Aila Brito

*PLANOS E PLANTIOS*

Os planos que fazemos para a vida,

às vezes, sob o "impulso adolescente",

compara-se ao plantio da semente,

lançada, sem a precaução devida,

no solo empobrecido e tão carente!...

Sonhar, além do esboço, faz da lida

a luta mais vibrante e preferida,

que exige a entrega plena, consciente...

Quando partimos, no ímpeto, sem plano,

rumamos, na cegueira, ao desengano

e a meta tão sonhada não deslancha.

O sonho prematuro não decola,

faz um alerta a escrita de Cartola:

"o impulso ilude e o sonho se desmancha"!

Aila Brito

*O ABISMO*

O anúncio da partida inesperada,

sem rumo, sem caminho, sem destino,

demonstra para mim um desatino

de quem em si cravou cortante espada.

Sofrido o coração que, peregrino,

viaja sem saber por qual estrada,

do seu antigo amor não leva nada,

mãos livres para um novo libertino.

O mundo ao derredor se faz moinho

que despedaça os sonhos e as paixões

e que reduz a pó as ilusões.

Pegadas fundas ficam no caminho,

cavando um perigoso e grande abismo,

vazio, mas repleto de egoísmo!

Luciano Dídimo

*SÚBITA INTENÇÃO*

Pressinto, amor, que estás impaciente...

Convém, porém, manteres teu fadário;

Não desviares teu itinerário

Antecipando os fatos do presente.

Por que deixar o abrigo terno e quente

Por um caminho estranho e temerário?

O mundo te reserva mais calvário

Que a sedentária vida à tua frente.

O nomadismo tem os seus perigos,

Longe de casa sofrerás castigos

Em consequência desta decisão...

Lamentarás a imprevidente escolha,

Dando-te ao vento feito seca folha

Que, após um breve voo, cai no chão.

José Rodrigues Filho

*MOINHO*

Por que sonhar, se a vida é bom moinho

Que, em si, desfaz os sonhos, as quimeras?

Triturará, mordaz, o que veneras

De modo tão fugaz e comezinho.

Adiante encontrarás o descaminho,

Abismos do penar, vulcões, crateras,

O pesadelo, o pó do que mineras

Nos veios da ilusão...E irás sozinho.

Por que sonhar, seguir sonhando adiante

Se o anseio se desfaz a cada instante?

Até diamante traz, no seio, a jaça.

O tempo pulveriza a rocha bruta,

Nada pondera, nada enxerga, escuta,

E tu nem vês porque depressa passa.

Edir Pina de Barros

*CORAÇÃO MARUJO*

Marujo coração, aonde vais,

assim com tanta pressa e tão andejo?

Em que águas lançarás o teu desejo

e em que amanhã esperas ver um cais?

Perdes o leme e o barco benfazejo,

se fores só, em longos temporais;

ao debater-te em ondas, tu decais,

e a profundeza leva todo ensejo.

A vida (um fundo mar) sepulta os sonhos,

mas deixa seus fragmentos pelas praias,

tornando os horizontes mais tristonhos.

Vê, coração, que um dia de saudades

mói o prazer da escolha. Não te abstraias!

A nau da solidão fará que nades!

Geisa Alves

*MOINHOS...*

Que se acautele, amor… a vida austera

é campo vil, minado de granada,

e, a cada passo em falso, feito fera,

o mundo mostra a face endiabrada…

Que se acautele, amor… a mão megera

sem dó, esmaga a ação que, esmigalhada,

nos faz banir ternuras de quimera,

e sem as ilusões não somos nada!

Escute o que nos diz o bom Cartola…

o sonho estilhaçado nos atola

na lama deste mundo que é moinho…

Que possa ver a vida qual Quixote…

Moinho, se de vento, traz o mote

que lhe fará Menino-passarinho!

Elvira Drummond

*INGENUIDADE*

Pensa que pode ter a liberdade?

Sair assim... sem rumo pela vida?

Há muitas armadilhas na cidade,

logo se sentirá desprotegida.

Insiste e quer partir com pouca idade?

Não teme a noite fria e corrompida?

Instante em que a violência da maldade

costuma bloquear qualquer saída!

Acorda, não se entregue à fantasia,

não seja tão ingênua, meu amor...

agindo, assim, está buscando a dor.

Acorda, agora o inverno se anuncia,

porque nem sempre a claridade impera,

o breu, às vezes, cobre a primavera!

Janete Sales Dany

*A FÊNIX*

Recordo tristemente os dias idos,

As noites tão ardentes que tivemos,

O fogo da paixão, sumiu, perdemos!

Os risos espontâneos são sofridos.

Erramos, sim, e os erros cometidos

Minaram nosso amor e, bem sabemos,

Que, simplesmente, nós sobrevivemos

Na chama dos que vivem iludidos.

Fizeste as malas, queres ir embora,

Porém meu coração, soluça e, chora,

Gritando firmemente que te quer.

E nessa, agoniante, despedida,

Percebo teu amor por mim querida...

Das cinzas renasceste, enfim, mulher.

Douglas Alfonso

*ANDORINHA ABANDONADA*

No conto de "Cartola", a doce dama

Entrega-se à emoção, precipitada,

No impulso da paixão de frágil chama,

Fazendo-se andorinha abandonada...

Um coração, que o desespero inflama,

Pressente a dispersão de sua amada,

E o cavalheiro, olhando-a sobre a cama,

Tenta dissuadi-la, à madrugada...

Os versos do imagético retrato

Resumem casos, desse mesmo fato,

De inúmeros romances pelo mundo...

As relações que oscilam no domínio

Dos sentimentos sem o raciocínio,

Padecem voos por um caos profundo!

Ricardo Camacho

*O DESAFIO*

A mesma intrepidez que nos instiga

na direção dos braços da aventura,

ao desprezar as queixas da censura,

também se torna pérfida inimiga.

Um dia, quando escravo da fadiga

causada pela espada que o perfura,

o coração se despe da loucura

e alguma sensatez, enfim, abriga.

A inconsequência tem o seu efeito

e, assim, reclama zelo o grão eleito

no precioso instante do plantio.

A vida, enorme campo, tudo assente,

portanto, a qualidade da semente

é nosso imorredouro desafio.

Jerson Brito