NO TEOREMA DO LAÇO / NO TEOREMA DA ESPECULAÇÃO / NO TEOREMA DA GALINHA

NO TEOREMA DO LAÇO I – 1º OUT 2022

Quando do amor a corda se desata

e inteiro o encanto perdeu o seu sentido,

perdido aquilo que te havia prendido,

perdido o elo que o coração contata;

quando do amor a corda se arrebata,

sem que outro nó o coração tenha suprido,

são pontas soltas, pode um fio ser obtido,

mas o outro é palha, não mais liga de prata;

alguma vez tal cordame só se esgarça,

sempre é possível, com algum carinho,

evitar o seu completo rompimento,

mas fio de amor é coisa muito esparsa,

pode extender-se demais pelo caminho,

sequer o sol a lhe dar qualquer alento.

NO TEOREMA DO LAÇO II

Quando do amor a corda se reata,

talvez surpresa de um encontro inesperado,

a duas mãos deverá ser costurado,

talvez não sendo mais um fio de prata,

quiçá um fio de cobre se contata,

por algum beijo a ser então soldado

ou mesmo algum cipó no mato achado,

perde a raiz que o nutre e então se abata,

que na verdade, o fio do amor não será o mesmo,

as más lembranças jamais são esquecidas

que o romperam antigamente em seu desdouro,

mas quem sabe se este nó atado a esmo

talvez perdure até o fim das vidas,

em vez de prata, tornado em fio de ouro!

NO TEOREMA DO LAÇO III

Será então o canto do amor que se desata,

os atropelos a abafar intermediários,

cada fio a atrair os seus contrários,

como um dueto operático em cascata

pois canto de amor teu coração engata,

nota após nota, em pentagramas solidários,

com cuidado interpretado nesses páreos,

que nenhum protagonista o então combata,

que amor é coisa frágil, mas tão forte!

Vontade havendo, será sempre resiliente,

a rebrotar assim desde a raiz,

quais duas gavinhas enroscadas nesse porte,

que coisa estranha que retorne assim potente

o fio de prata desse arcano chafariz!

NO TEOREMA DA ESPECULAÇÃO I – 2 OUT 22

Só especulei os meandros de minha mente,

jamais cheguei a ingressar numa caverna,

minha permanência urbana ainda é hodierna,

em cidades até em sonhos sou presente,

porém há muito mais que se pressente

nos escaninhos, mais lento ou mais urgente,

cada mistério da mente mais premente

que alguma cova de permanência eterna,

por mais que seja temporária a eternidade,

foram geradas por grandes cataclismas,

meu invólucro mental a ser mais transitório

e a espeleologia deixo a outrem, sem maldade,

que explore estalactites e seus prismas

ou os vestígios coprolíticos da história!...

NO TEOREMA DA ESPECULAÇÃO II

Minha própria mente ninguém mais vai explorar,

cheia está de maelstroms e biriquetes;

por mais que queiras, somente te intrometes

até o ponto em que te deixe especular;

nenhum psicotrabalhador pode encontrar,

por mais que a claridade ali projetes,

além desses portais com que te inquietes,

que não os venhas realmente ultrapassar;

há muitos anos que minhas redes neurais,

venho transpondo, real meu interesse,

independente de qualquer curiosidade:

até que ponto os vestígios animais

inatingíveis são ali por qualquer prece

ou até que ponto ali governa a humanidade?

NO TEOREMA DA ESPECULAÇÃO III

A autoanálise busquei sempre exercer

e até um certo ponto sou sincero,

ao ver meus monstros nem sequer me altero,

só os cumprimento e sigo ao bel-prazer,

mas se ao consciente pretendem pertencer,

não os desprezo, mas com desejo vero,

dou-lhes tarefas, sem duvidar, espero,

que as consigam com esforço obedecer

e no momento em que minhas culpas observo

ou minhas ausências do correto proceder,

sempre as integro no rol do conhecer;

estando às claras, delas não sou servo,

mas as consigo facilmente perfilhar,

porque são minhas, como as posso condenar?

NO TEOREMA DA GALINHA I – 3 OUT 2022

Se há alguma coisa com que não me conforme

é retornarem a uma questão tão comezinha:

“Surge primeiro o ovo ou a galinha?”

Como apresentam tal pergunta desconforme?

Qualquer pessoa que boa cultura forme

sabe que de ovo sempre nasce a pobrezinha,

que antes pôs outra selvagem avezinha,

cuja aparência em capoeira se transforme.

E cada ave que nasceu de um ovo

de outra descende nas mais priscas eras,

que dinossauros de ovos já surgiam

e que o total do reptiliano povo

brotou dos ovos de batráquias feras,

que de seres mais antigos descendiam.

NO TEOREMA DA GALINHA II

Milagre mesmo foi o surgimento

da casca dura, garantindo a proteção

de um ovo mole para mais longa duração,

ovas de peixes sem dispor desse elemento,

aos milhões expelidas no relento

de qualquer curso de água à sua feição,

quantas servindo tão só de refeição

a oportunistas em busca de alimento?

Já outro milagre foi o sangue quente,

que permitiu aos pássaros chocar,

sem depender da incerta luz solar...

que não me fira ignorância tão plangente,

ovos surgiram de vigorosa linha,

sem que existisse sequer uma galinha!

NO TEOREMA DA GALINHA III

Nenhum conhecimento é necessário,

nem é preciso se dar uma resposta,

é capciosa a questão aqui proposta

para alguma criança, por humor nefário;

pode ser feita por motivo atrabiliário:

talvez por boa razão lhe seja posta,

alguém que a ame seu raciocínio gosta

de tentar desenvolver; ou ao contrário,

alguém que apenas queira dela fazer troça;

será que algum de fato nisso insista,

como se dúvida possível ainda exista?

Ou a farinha que a omelete engrossa

surgiu primeiro ou veio antes o moinho?

Surgiu o voo ou foi o passarinho?