Os retirantes - 1944 - Cândido Portinari
OS RETIRANTES
Raquíticos humanos arquejantes
cansados da aspereza nordestina
Resolvem contornar a triste sina
Deixando para trás os maus instantes...
As condições precárias e inconstantes
Açoitam suas carnes e a retina
enxerga o agouro da ave de rapina
com olhos assustados e hesitantes!
Crianças indefesas, tão sofridas
fantasmagóricas, retêm feridas,
Marcadas pelas dores do tormento.
Nos traços expressivos desses rostos
(dos nove retirantes) só desgostos
e a sede de purgar o sofrimento!
INTERAÇÕES:
Exímio poeta Douglas Alfonso. Grata!
OS RETIRANTES
Em traços multicores verdadeiros
na tela percebemos os horrores
vivenciados pelos moradores,
que sentem seus destinos agoureiros.
É triste ver os filhos brasileiros
Migrarem tão somente por pavores...
Pois não conseguem ser os provedores;
Percorrem o calvário sem madeiros.
Nas trouxas levam só os seus farrapos,
Nos corpos, esqueléticos, os trapos,
Assim prosseguem firmes, na mudança.
Abutres carniceiros lhes perseguem...
Porém viral verdades nunca neguem!
É que eles são a cara da esperança.
Exímia poetisa CRISTINA GASPAR. Grata!
OS RETIRANTES
Retirados das boas condições de vida
Sobras de massa humana tão sovada
Rostos esqueléticos sem uma guarida
Subsistência sem espaço na pátria amada
Mãos e pés que labutam na árdua rotina
Invisíveis sobre as fartas mesas
Existentes na cegueira da retina
Lutas diárias sem quaisquer sutilezas
Só mesmo a fé os faz seguir
Cada novo amanhecer é um desafio
A ferrenha esperança norteia o porvir
Difícil olhar nos olhos de faces endurecidas
As reflexões de quem é capaz de sentir
São como chicotes em alheias feridas.
Exímio poeta SOLANO BRUM. Grata!
INDIGNAÇÃO
Feridas que sangram nunca cicatrizam...
E para curar o cancro e essa eterna dor,
Onde miséria e falta d'água desatinam,
Não há quem se apresente como doutor!
Só o coitado Nordestino passa fome;
Tem ventre estufado e nada a mastigar!
Sente pavor do abutre que a tudo come,
Caso, o tísico corpo na terra vir a tombar!
Ainda hoje a vergonha é grito que ecoa
Pois, Pedro Segundo, chegou a comentar
O sacrifício às pedras preciosas da coroa
Para que o Nordeste, não ficasse isolado!
Tudo Permanece no “ora a veja” e no falar,
E os altos custos do Projeto, fora abafado!
Exímio poeta JOTA GARCIA. Grata!
DEBANDADA
Pobres nordestinos em debandada.
Nunca foi boa a vida de antes,
Pior agora, que são retirantes,
E só lhes resta a poeira da estrada.
Deixam o que tinham, ou seja, nada.
Ossos à mostra, pontas perfurantes,
Encaram o destino, cambaleantes.
Como apoio, o cabo da enxada,
A cujo toque a mão se acostumou.
De tão juntos, a ele se amoldou,
Como fossem uma coisa só.
E do alto, lhes vem mais um castigo:
Sobre o seu corpo sem nenhum abrigo,
O Sol inclemente queima sem dó.