ARREBATAMENTO
ARREBATAMENTO I – 25 MAI 2022
Amor é gota do espaço sideral
que nos pinga na medula e nos envolve,
depois ao espaço o coração devolve,
sem precisar sequer de ser sensual;
porém amor é essa pena universal,
esse mistério que nunca se resolve,
que se julga ter ido e que nos volve
e de algum modo nos domina a cada qual.
Quando nos chega, se faz nosso senhor
e sem querer nos leva ao riso e ao pranto,
cristal de cor que tudo transcendia;
pois talho fundo nos deixa o Grande Amor,
que todos sentem em si e no entretanto,
nenhum de nós compreendeu o que sentia!
ARREBATAMENTO II
Contudo, quando vem, nos arrebata,
rosas pisamos sem causar-lhes mal,
as nuvens descem de forma natural,
nelas flutuamos como em branca nata;
farfalham sinas e alegrias nessa mata,
que vão e vem em troca só conceptual,
dores de amor que não nos ferem, afinal,
mil alegrias em que a alma se desata...
Mas se pensarmos, por que seria controlada,
essa tortura usufruída em penitência,
gaiola feita de ardor e complacência,
essa vaga sensação de tudo e nada,
que até o cóccix nos desceu pela medula
e o total do livre-arbítrio nos anula?
ARREBATAMENTO III
E como é vago quando o amor se vai,
maior que fosse sua satisfação,
menor que fosse qualquer desilusão
e o sangue dalma nos retira quando sai!
Mas não se olvide que o coração contrai
quando a recusa nos morde em ocasião
e o ser amado transita outra paixão,
em descaso da emoção que em nós recai!
E enfim sabemos só os sintomas da ilusão,
que a garganta nos sufoca como um véu,
num entrecortado quase de esternutação,
esse trauma que nos veio desde o céu,
sideral desde o princípio a contusão,
que então se perde por mil mundos ao léu!...